SETE

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Esperaremos o amanhecer se erguer antes de nós. Com relutância, concordamos que seria burrice explorar a floresta na caída da noite. Sabe-se lá que tipos de seres chamam este lugar aqui de lar.

Eu até tentei dormir, porém não consegui. A dor que sinto, tanto física quanto emocional, negou-se a permitir que minha exaustão a vencesse. Assim então, estou há horas repousada sobre o solo compactado, fingindo residir o último estágio do sono quando na verdade não alcancei nem o primeiro. Cansada de insistir em algo que claramente não irá funcionar, entreabro os olhos, analisando com o menor dos movimentos tudo aquilo que me rodeia.

Acacia dorme calmamente com a cabeça acolchoada em sua mochila cor de rosa. Seu cabelo cai como uma cortina dourada sobre sua impecável pele de porcelana, misturando-se a terra. Seu corpo, entretanto, em contraste com a sua expressão despreocupada, está tenso, com os músculos contraídos.

Theron está sentado em uma rocha, de costas para nós duas. Há uma arma em suas mãos. Foi decidido que ele e Acacia revezariam os turnos de vigia. Eles acabaram me excluindo do rodízio graças aos meus ferimentos e, desconfio eu, a minha falta de habilidade. Não protestei.

Provavelmente sentindo o meu olhar, mais rápido do que sou capaz de reagir, o jovem vira a cabeça em minha direção. Como se eu estivesse cometendo algum crime, não tardo ao fechar as pálpebras. Ele ri baixo, rouco, e estala a língua em provocação.

— Admirando a paisagem? — pergunta cinicamente, sem dúvida alguma sorridente.

Faço uma careta, rendida, e dou-lhe as costas. Deixo o silêncio implantar-se entre nós, contudo percebo que seu olhar segue cravado em mim por mais algum tempo.

Distraidamente, brinco com a grama rasteira, soprando para longe uma formiga que subia no meu braço. Pelo canto dos olhos, por trás da fina névoa que abrange o ar, noto que a lua cheia afasta-se a passos de tartaruga de seu pico, indicando que já é mais de meia-noite.

— Não passou da hora de vocês trocarem de turno? — minha voz sai abafada.

— Aham — ele confirma num suspiro cansado.

— E por que você ainda não acordou ela? — vejo-me dizendo, rolando novamente até estar de frente com o rapaz.

— Não sei — responde Theron, redirecionando o olhar até a irmã adormecida, a quem encara com ternura.

A maneira com a qual ele observa Acacia é no mínimo bela. Mesmo em plena madrugada, é nítida a admiração que habita suas órbitas cor de mel. Ele admira a irmã, espelha-se nela. Apesar de pouco conhecê-los, pelo o que presenciei, acho que ela também. Eles se amam assim como eu e Ryne nos amamos. Um amor sincero, límpido, puro.

— E você não vai acordá-la, vai? — indago, certa de qual será a minha resposta.

— Não. Acho que não.

Olhos que se destacam em meio à escuridão queimam os meus com um tipo diferente de fogo. Atiçando cada nervo meu, fito-o com a mesma intensidade.

— Bonito da sua parte — elogio, engolindo em seco.

— Ela estava mais cansada do que eu — tenta justificar, contudo pouco acredito em suas palavras, fazendo-me dispensar a alegação com um único aceno.

— O que não torna sua atitude menos louvável — insisto. — Não há razão para tentar amenizá-la.

Vejo por meio de sua postura que ele pretende contra-argumentar, porém o impeço com outro gesto de mão. Seus ombros caem em derrota.

NevoadaOnde histórias criam vida. Descubra agora