Prefácio / Nu frontal

514 8 0
                                    

Quando me sugeriram pela primeira vez que eu escrevesse sobre o último ano, meu instinto
inicial foi dizer “não”.
Escrever sobre mim é como se eu tivesse acabado de decidir subir em uma mesa de um
restaurante muito chique, levantar o vestido e mostrar para todos que não estou usando calcinha.
Quer dizer, parece chocante.
Coloca em evidência as partes que costumo manter guardadas.
Partes íntimas.
Partes secretas.
Sabe, sou introvertida. Profundamente. Até os ossos. Minha medula é introvertida. Meu
catarro é introvertido. Cada célula em meu corpo grita incessantemente comigo a cada palavra
que digito, dizendo que escrever este livro é um ato antinatural.
Uma dama jamais expõe a alma fora de quatro paredes.
Mostrar a você um pouco de mim em nu frontal me deixa nervosa e inquieta, como se eu
sentisse uma coceira em um lugar desagradável. Isso me faz respirar com muita dificuldade, de
um modo esquisito, como um cachorro em pânico. É como se me fizesse rir de maneira
descabida em público sempre que penso nas pessoas que estão lendo.
Escrever este livro me deixa desconfortável.
E essa, caro leitor, é a questão. É a coisa toda. Por isso estou escrevendo mesmo assim. Apesar
da inquietude, das risadas e da respiração.
Estar confortável demais foi o que deu início a tudo isso, para começo de conversa.
Bem, estar confortável demais e ter escutado seis palavras estarrecedoras.
Além de “peru”.

O Ano em que Disse SimOnde histórias criam vida. Descubra agora