O Último Dia

68 4 3
                                    

   Eu não aguento mais, não sou o mesmo Harry de um ano atrás. Pensei que não aguentaria passar dessa noite vivo, ela foi barulhenta, oscilava entre meus gritos de dor pelos cortes ou pela dor que invadia meu peito, sufocando e fazendo meus pulmões arderem, a cada inspiração eu desejava não estar vivo, cada expiração vinha junto de soluços e choro, afinal, fazia um ano desde que não via o amor da minha vida, um ano desde que não ouço aquela voz doce, um ano desde que não me conforto naqueles braços repletos se tatuagens que combinavam perfeitamente com as minhas, quando nossas mãos se entrelaçavam, elas se completavam, nos fazendo um só, um só corpo, um só ser, um só coração. Agora eu sou metade. Nunca me contentei com partes.
   São 19:30, Louis ainda não voltou, em um ano ele não voltou, ele não me quis de volta mesmo depois de praticamente ter me humilhado por meio das cartas. Tudo bem. Logo já não sentirei mais nenhuma dor. Sempre tive o hábito de tomar banho às 20:00 horas, quando estou triste, ainda tenho mania de encher a banheira e ficar lá por um longo tempo, até esquecer porque estava triste. Como é de imaginar, hoje vou encher a banheira. Mas não será para tomar banho.
   Prometi para o Louis que a morte não será dolorosa, vi que afogamento é somente desesperador, mas que não dói tanto assim, além de ser relativamente rápido. Vou fazer isso.
   19:40, encho a banheira com água morna, não irei adicionar nenhum sal de banho pois Louis dizia que a água pura era a única que limpava e que os sais de banho só serviam para melar a pele e dar espinhas posteriormente. Sorri com esse pensamento porque parecia que ele estava aqui.
   A água já batia na metade da banheira, calculei que meu corpo emergido iria fazer com que a água subisse mais uns dois palmos, então resolvo deixar ela encher só mais um pouco até que termine de arrumar tudo.
   Vou até a caixa que irei deixar a carta para Louis. Dou um último cheiro em sua camiseta que dormi agarrado durante um ano e ainda tinha o cheiro dele, fraco, porém estava lá. Dou um beijo na carta, coloco os dois itens dentro da caixa, escrevo "Com amor, Harry" e deixo escapar pelos meus lábios um sussurro "I love you to the moon and back, eu te amo, Louis". Uma lágrima cai dos meus olhos acompanhada por um sorriso fraco em meus lábios. Isso era o mais perto de ele sentir meu amor pela última vez. Coloco a caixa embaixo da cama e me dirijo para o banheiro. Pego meu celular em meu bolso e desligo a torneira que derramava água morna na banheira, dou uma última olhada na tela do celular para ver se ainda há alguma esperança de ficar. Nada.
   19:52, não posso prolongar esse momento para sempre.
   Retiro minha roupa lentamente em frente ao espelho, quando estou completamente nu resolvo me despedir de mim mesmo, dou uma olhada de cima a baixo, vejo minhas costelas marcando minha pele, o cabelo longo caindo aos olhos, os cortes em meus braços, a barba por fazes há meses, os olhos fundos e cansados e a última coisa que tinha que fazer, iria ser feita. Minhas tatuagens.
   Toco em minha rosa e digo "Louis, você era minha adaga"
   Toco em minha âncora e digo "Você era minha corda, que me colocava pra cima quando só caminhava para baixo"
   Toco em meu barco e digo "Você era minha bússola, quem me trazia para casa todo dia quando havia esquecido para onde ir"
   Toco na minha mariposa e digo "Você era o meu 'isso é o que é' "
   Toco a metade do coração que pertencia a mim e digo "Você era a metade que completava perfeitamente a minha"
   Meus olhos estavam marejados, os fecho e sinto duas lágrimas caindo. Chega de chorar.
   Me dirijo até a banheira, sento no fundo e digo "Adeus Lou, me desculpa mamãe, eu amo todos vocês" como se eles fossem escutar.
   Ouço meu celular tocar e simplesmente não ligo, eu não podia atender, me afundo até cobrir meu queixo e ouço batidas na porta. Tenho certeza que é minha mente pegando peças de novo, não sei como ainda não ouvi a voz do Louis.
   "Harry" escuto um grito encoando a casa toda, arrepiado os pelos de meus braços e pernas mesmo estando inertes.
   Grito de volta com lágrimas nos olhos.
   - Eu não vou parar, eu não vou desistir, ele não voltou. Pare de ser fraco, Harry.
   - Eu tenho as chaves ainda, vou entrar.
   Minha mente nunca havia me respondido, meus olhos estalam, ouço o barulho da porta se abrindo e me afundo por completo, eu não podia deixar ser tão enganado por mim mesmo.
   Primeiramente mantenho os olhos abertos, quando senti meu pulmão doer os fecho, eu não podia desistir e nem ia. Depois de alguns segundos que pareceram ser uma eternidade, minhas mãos que estavam cravadas em minha barriga se soltam e não tenho mais forças em meus membros. Eu estava sem oxigênio.
   "Adeus" foi a última coisa que consigo pensar.
   Tudo se apaga.

After you leave meOnde histórias criam vida. Descubra agora