I Recomeço

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Mariana


Acordei ansiosa para um novo capítulo na minha vida. Depois de dez anos em um emprego que me consumia, hoje era o dia de começar uma nova relação de trabalho, eu seria minha chefe!

Com a minha indenização e o dinheiro que juntei, realizei um sonho antigo de ter meu negócio. Abri um café, saí completamente da minha zona de conforto. Eu era executiva de uma multinacional, uma advogada dedicada, comprometida e sem vida pessoal. Com minha liberdade (ops) demissão, consegui juntar uma boa grana e resolvi seguir meu coração. Não podia realmente dizer que não foi vantajoso, trabalhei lá desde estagiária e em meus últimos anos ganhei casos importantes que me renderam bônus generosos. Mas eu não queria mais sentir aquela sensação de vazio que a "guerra" de tribunais me deixava após a adrenalina do debate.

Aliás, meu coração estava leve, com meu emprego sugador de vida, mandei embora também meu namorado sem emoção. Ainda me pergunto por que na vida fiquei quatro anos nesse relacionamento sem sal, sem gosto, sem excitação. Tá bom, no início não era assim, mas tão logo virou aquele conforto, que não é exatamente o que você quer, só que é fácil e está ali... então você vai deixando. Mas eu deixei tempo demais!

Não vou cuspir no prato que comi, mas depois de um tempo as comidas e lambidas foram ficando cada vez mais espaçadas e sem graça. O sexo virou obrigação e deixou de ser prazeroso, no meu processo de mudança resolvi que junto com emprego, o relacionamento morno iria junto. O Beto não ficou muito feliz, mas ele vai perceber com o tempo que nos fiz um favor em tomar a iniciativa de terminar. Então era isso, essa era eu: Mariana, solteira, empreendedora, 31 anos e novas páginas para escrever.

Antes de abrir o café, fiz uma pesquisa de mercado e localidades, e consegui achar uma rua residencial, fora do centro da cidade que abrigava duas grandes empresas, diversas escolas e uma universidade. Era minha chance de trabalhar no comércio e ainda assim manter uma rotina de segunda a sexta, chega de trabalhar final de semana!

Na rua não tinha nada do gênero, nem uma padaria, então eu apostei que eu teria público. Teríamos pães e bolos, café, sucos, e no almoço massas e caldos. Consegui contato com ótimos fornecedores e eu também iria me arriscar nos bolos, porque eu, modéstia parte, era uma boleira de mão cheia. Porque eu fiz Direito mesmo?

Uma grande amiga que havia voltado ao Brasil recentemente após uma jornada de conhecimento pelo mundo foi recrutada para entrar de cabeça comigo nessa empreitada. Ela era metódica, organizada e amava mexer com dinheiro! Fizemos nossa sociedade dividindo os custos do café, mas o local eu comprei. Era uma casa duplex que após uma pequena reforma virou um lindo café no primeiro andar e minha linda e aconchegante casa no segundo.

Então era isso, estava acordando as cinco da matina para preparar tudo e abrir às 6h. Contratamos uns jovens nas semanas anteriores que fizeram panfletagem na porta das empresas informando da inauguração. A Tati chegou logo depois para me ajudar, combinamos de irmos tocando e conforme percebêssemos nosso público veríamos a possibilidade de contratar alguma ajuda.

A entrada era de grades e com um pequeno jardim onde conseguimos colocar algumas mesas e cadeiras com guarda-sóis, dentro também teríamos algumas mesas e cadeiras em frente ao balcão. Os primeiros dias foram corridos e pra dizer a verdade, caóticos, havíamos combinamos de fechar mais tarde nas sextas-feiras para tentar fazer um happy hour sem bebidas alcoólicas para aquele grupo que quer conversar, mas não necessariamente quer beber. Porque eu realmente não tinha saúde e nem paciência para tratar com pessoas alcoolizadas.

Na sexta-feira da nossa primeira semana já considerávamos procurar uma ajuda, a resposta foi muito boa e as pessoas estavam nos dando um feedback bem legal. E já estávamos reconhecendo clientes recorrentes. Um pouco antes de fecharmos entrou no café um grupo de engravatados que se sentou do lado de fora.

Olhos de MelOnde histórias criam vida. Descubra agora