'Angélica, viram César numa festa e ele ficou com uma garota.'
Chorei quando Fabiana me contou.
'Ingrato! Idiota! '-Xinguei com raiva.
Mamãe me consolou e entendi que César era jovem, vinte anos, estudava, era bonito, estava sendo difícil para ele ter de ficar em casa, ter uma namorada doente. E quando ele foi me visitar, terminei o namoro.
"César, estive pensando, não é certo você se prender a mim.Acho que não quero namorar você e ..."
'É aquele médico, não é? Você gosta dele! '
Não tinha nada com o médico, um jovem recém-formado que ia sempre me visitar quando estava no hospital. Não desmenti, seria mais fácil. Resolvemos ser amigos e César foi embora, fiquei chorando, não só por ele, por tudo, estava cansada de remédios, médicos e hospitais.
Uma amiga da escola foi me visitar, falou dos preparativos da festa de formatura.Eu não ia mais à escola, parara de estudar.Não tinha mais ânimo para nada, às vezes nem conseguia ler um livro, algo de que sempre gostei. Fiquei pensando, se não fosse essa doença, também estaria contente, pensando na festa de formatura. Passei uns dias muito triste,mas compreendi que meus pais e avós sofriam comigo e me esforcei para melhorar, para não ficar triste.Entendi que pior que a doença é ter dó de si mesma.Esforcei-me para expulsar a autopiedade.
Foi muito ruim estar doente.Como aprendi a dar valor à saude do corpo! Muitas vezes queria chorar e não conseguia fazê-lo.No hospital havia outros doentes que choravam juntos ou os incomodava porque queria dormir, ler ou conversar, não era certo piorar o ambiente com minhas lástimas.Como desejei chorar no colo de mamãe, como fazia quando era criança! Mas ao vê-la sofrida, até emagrecera, tentando me animar, esforçando-se para sorrir, não queria entristecê-la mais ainda.Papai dava uma de forte, mas muitas vezes, ao sair do quarto, o fazia chorando. Como entristecê-lo ainda mais? Em casa não me deixavam sozinha, repartia o quarto com Fabiana.Uma vez ela saiu, fora a uma festa, ia dormir na casa de uma amiga.Chorei até adormecer, me fez bem, as lágrimas me lavar, me limpar. Um dia, achando que a minha irmã estava dormindo, chorei baixinho.
'Está chorando Angélica? '-Indagou Fabiana.
'Não, claro que não! '-Respondi
'Por que esconde seu choro? O que há de mau em chorar quando se está com vontade? Você tem motivos pra isso.'
'Motivos? Acha que tenho motivos?'
'Claro! Está doente, tem dores, passa por este tratamento que lhe dá incómodos. Quer que eu lhe abrace? Quer chorar junto a mim? '
'Quero! '
Desde aquele dia, não chorei mais escondido, refugiava-me nos braços de vovó, papai, mamãe e de Fabiana. Só que choro repartido é mais confortante, chorava menos recebendo o carinho dd afetos.Deixei consolar e fui consolada.
Via no hospital muitos doentes.Fiz amizade com Eunice, uma mulher doente que tinha três filhos pequenos.
'Ainda bem que não tenho filhos, seria bem pior morrer e deixar órfãos'-falei alto e estranhei a minha voz ressoar pelo quarto.
Voltei aos meus pensamentos, as minhas lembranças.Eunice era muito boa, otimista, tinha dores, não reclamava, só chorava quando os filhos iam embora nas rápidas visitas. O esposo era jovem, parecia cansado, trabalhava muito, cuidava dos filhos e estava endividado. Eunice foi piorando, ficou muito feia, magra e mesmo assim continuava sorrindo e animando a todos.
'Ânimo Angélica, seu câncer não é do mesmo tipo do meu.Será impossível eu sarar, mas vc sim, irá se curar!'
'Eunice, que religião você segue?'-Indaguei curiosa.
'Sou espírita! Sabe, Angélica, o espiritismo nos dá muita compreensão da vida, faz entender e aceitar os acontecimentos ruim, levando a compreender a bondade e a justiça de Deus.Não é religião de sofrimento, mas nos leva a entendê-lo.Aproveito essa lição, sim, encaro minha doença como uma grande lição, me tornei mais humana, compreensiva, tenho meditado e sinto Deus em mim.'
'E seus filhos? '- Perguntei.
'Precisam de mim, sei disso.Quem não necessita de mãe? Mas meu marido é muito bom e eles tem duas avós maravilhosas, estarão protegidos.'
Fiquei com tanta dó de Eunice e de seus filhos que orei muito pedindo a Deus que ela sarasse, se quisesse que me levasse em vez dela, não me importaria morrer no seu lugar.Ela com os filhos seria mais útil do que eu.
VOCÊ ESTÁ LENDO
A Casa do Penhasco
SpiritualeRomance espirita de Antonio Carlos Psicografado pela médium Vera Lúcia Marinzeck de Carvalho Roberto , Dinéia e seus filhos, os novos moradores da casa do penhasco, nem sequer imaginavam o perigo que aguardava naquele lugar lindo, ensolarado. .. Re...