CAPÍTULO SEIS: LEMBRANÇAS DE VERÃO (TJ)

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CAPÍTULO SEIS: LEMBRANÇAS DE VERÃO (TJ)

Lembro de como o sol estava quente na minha pele quando deci do carro. Era um dos dias mais quentes do ano, ouvi no noticiário aquela manhã enquanto minha mãe distraidamente derramava creme de leite fresco na minha tigela de ceral e falava ao telefone com meu pai para saber que horas ele passaria para nos buscar. Era fim do verão e minha mãe e eu tinhamos ido para casa dos meus avós — pais do meu pai, na capital, e na volta para casa, no carro, foi uma das últimas vezes em que vi meus pais no mesmo ambiente. Naquele outono, me foi apresentado o significado da palavra divórcio.

Meu pai chegou por volta das oito horas da manhã e menos de vinte minutos depois já estávamos no carro, voltando para casa. Eu estava super empolgado para contar para Mia como havia sido meu verão, que meus pais quase não brigaram e meu avô me ensinou a jogar futebol tradicional e eu havia gostado tanto daquele jogo!  Especialmente porque eu não era tão terrível quanto no futebol americano ou no lacrosse — o esporte predominante em nossa cidade. Claro que também estava super curioso para saber como havia sido o verão de Mia, ainda mais depois da última vez em que nos falamos pelo telefone e ela disse que eu teria uma grande surpresa quando voltasse.

A Mia McCounnaghey de oito anos era uma garotinha esperta, alguns centímetros mais baixa que eu e com longos cabelos castanhos com caracóis, sempre esvoaçando e caindo na frente de seus olhos verdes. Embora morassemos na mesma rua… bem, desde sempre, só havíamos nos tornado amigos cerca de um ano e meio antes. Estranhamente em um jogo de lacrosse. Eu havia ido com meu pai e Mia com o dela e sua irmãzinha mais nova, Devonne, a diferença entre nós era que Mia realmente se divertia naqueles jogos, já eu só estava lá pelo meu pai. Não entendia nada de lacrosse e jogos eram barulhentos demais para o meu gosto.
Naquela ocasião, Mia usava um boné rosa cheio de florzinhas amarelas e laranjas feitas, por ela mesma, me disse depois, com canetinhas e uma camiseta branca que mais parecia um vestido chegando na altura de seus joelhos, na frente a estampa de uma folha de bordo vermelha e nas costas, em letras enormes, estava "PADDY". Eu podia não entender muito de lacrosse e nem de rixas esportivas, mas aquela camisa não me pareceu uma boa escolha para se usar em um jogo na nossa cidade. Quando o assunto era lacrosse (ou qualquer outro esporte), a população se tornava um tanto patriota. Mas lá estava Mia, gritando incentivos para os jogadores, toda empolgada com sua camisa-vestido com estampa claramente canadense.

       "Quem é Paddy?" Perguntei a ela, na metade da partida. Eu não estava aguentando de curiosidade e também estava entediado, e, num raio de uns 50 metros, aquela garota era a pessoa de idade mais próxima a minha. Então por que não iniciar uma conversa?
"Patrick!" Respondeu ela, como se fosse óbvio. Mas o único Patrick que eu conhecia era o amigo do Bob e o meu tio Patrick, a quem meu pai chamava de Patty para implicar. Mia deve ter entendido minha confusão pois eu nem precisei perguntar, ela sentou-se na arquibancada ao meu lado e afastou as mechas encaracoladas do seu cabelo que caiam na testa, antes de explicar:
"Paddy é o apelido do Patrick Joseph Brennan. E antes que você pergunte 'quem é esse cara?'." Ela fez sinal de aspas com os dedos no ar, nunca a tinha visto tão de perto. Seus olhos pareciam tão brilhantes dali, como duas estrelas verdes e misteriosas, cheias de vida e curiosidade. "Ele foi um jogador de lacrosse..."
"Canadense?" Arrisquei, apontando para a folha de bordo na camisa dela.
"Sim! Do time de 1900... Não lembro. 1900 e alguma coisa. Mas eles venceram os jogos de Londres."
"Ah." Eu não sabia o que dizer. Parecia importante, era um cara que venceu um campeonato um século antes, mas eu não ligava. O que eu queria saber era porque ela ligava, que importância o tal de Paddy tinha para ela. Mas não perguntei. Nem tive a chance, mais rápido do que pude perceber, Mia levantou-se e voltou a gritar para Hayfield — capitão do time local, passar a bola e deixar de ser arrogante. Era engraçado de observar, ela gritava como se ele pudesse mesmo ouvi-la com todo aquele barulho ou se caso pudesse, daria a mínima para o que uma criança achava que ele deveria fazer.

BEM ALI NA RUA 13 [ HIATUS ] Onde histórias criam vida. Descubra agora