Marta

180 6 3
                                    

autora: Ivana Lopes 



A menina morava com a mãe e o pai numa casa simples, mas espaçosa na periferia da cidade. Havia dois quartos na casa, um deles era só dela que era filha única. Havia também um grande quintal com árvores frutíferas onde a criança brincava com seus brinquedos e com o cachorro da casa. Ela era uma menina quieta e tímida que sempre brincava sozinha. Era triste ser tão só assim. Até que um dia enquanto ela brincava em seu quarto com suas bonecas viu, que na cadeira, que ficava no canto, encostada na parede havia uma pessoa. Uma pessoa de cabelos bem compridos e uma roupa estranha, era longa, até os pés, e as mangas eram compridas também. A menina, que se chamava Clara nunca tinha visto aquela mulher, mas ela era tão pequena ainda que não ficou assustada e começou a conversar com aquela estranha figura. Contou que tinha muitas bonecas e um cachorro mas que não tinha ninguém para brincar com ela. Convidou a pessoa para brincar. Ficaram assim a tarde toda, até que a mãe de Clara ouvindo a conversa veio ver o que se passava com a filha. Não viu ninguém com a menina e perguntou com quem ela falava . Clara respondeu que era com Marta, sua amiga. A mãe achou estranho, mas pensou que era normal crianças pequenas terem amigos imaginários e voltou para suas ocupações, deixando Clara brincando.

Naquela noite Clara teve um terrível pesadelo, sonhou que seu pai caia do telhado e que lá em cima, olhando seu pai caído no chão, estava Marta, a amiga imaginária que brincara com ela a tarde toda. Clara acordou aos gritos, acordando toda a casa. Os pais assustados vieram correndo. A menina contou do sonho, apavorada. Os pais ficaram com ela até que ela se acalmasse e voltasse a dormir.

Na manhã seguinte Clara brincava no quintal quando viu vir se aproximando Marta, não sabia por onde ela entrara só que ela já estava do seu lado. Lembrando do sonho da noite anterior Clara estremeceu de medo, chamou pela mãe que veio correndo. Quando ela chegou Marta tinha desaparecido. A mãe conversou com a menina e a tranquilizou dizendo que tudo isso era por causa do pesadelo e que não havia ninguém ali. Nunca tinha havido ninguém. Propôs que as duas fizessem um bolo bem gostoso e foram para dentro da casa. Ao descerem a escada que levava para dentro, não viram que encostada ao muro ficara aquela criatura estranha, muito alta, com um riso sinistro, as roupas compridas balançando ao vento .

Naquela semana a TV começou a ficar sem imagem, com muitos chuviscos. O pai de Clara subiu no telhado para arrumar a antena, Clara e a mãe iam sair para visitar a avó. De repente ouviram um barulho enorme e escutaram um corpo batendo no chão com força. Saíram correndo e viram o pai de Clara no chão, inconsciente. As duas gritaram assustadas e Clara olhou para o telhado, de onde o pai caíra, lá estava Marta olhando pra ela com sorriso feliz no rosto. Clara sentiu muito medo e raiva. O pai dela foi socorrido, ele quebrou o braço e algumas costelas, mas ia ficar bom.

Algumas semanas se passaram sem que Marta aparecesse novamente. Mas numa noite depois do jantar, Clara já estava deitada quando viu a sombra de Marta passar pela porta de seu quarto que estava na penumbra. Clara sentiu um arrepio e tentou gritar, mas Marta se sentou em sua cama e fez sinal para que ela ficasse em silêncio. Disse que era sua amiga, que ficaria com ela para sempre, mas que não gostava dos pais dela e que se ela não fosse sua amiga algo terrível aconteceria a eles. Clara sentiu muito medo e não conseguiu chamar a mãe, ficou calada olhando aquela figura sair de seu quarto e desaparecer no corredor.

No dia seguinte Clara contou chorando para a mãe o que tinha acontecido. Sua mãe agora estava muito preocupada com Clara. No mesmo dia foi até a paróquia que ficava próxima de sua casa para conversar com o padre. Precisava da opinião de um religioso para aquela situação tão estranha. O padre ouviu tudo em silêncio, depois disse para trazerem a menina que ele queria falar com ela. Mãe e filha voltaram à igreja, o padre conversou com a menina calmamente e foi pedindo detalhes sobre a pessoa que ela vira, sobre tudo que ela contava. Finalmente parecendo espantado disse para a menina que fosse brincar na frente da igreja enquanto ele iria conversar com a mãe dela. O padre disse à mãe que as coisas que Clara contara, a descrição da mulher conferiam com uma história que ele ouvira a muito tempo atrás quando chegou na cidade para trabalhar naquela igreja. Uma mulher como essa que Clara vira aparecia para uma criança, e coisas estranhas aconteceram enquanto ela era vista . Aconteceram acidentes com as pessoas da família e animais da casa apareceram mortos de maneira inexplicável. O padre propôs então que a casa fosse benzida, a mãe aceitou imediatamente. Naquela tarde mesmo, o padre foi até a casa de Clara, mas no caminho, enquanto ele caminhava distraído não viu um carro que surgiu em alta velocidade, ele foi atropelado e morreu no local, não houve tempo para o socorro. Enquanto as pessoas corriam para tentar ajudar o padre, um vulto observava tudo de longe. Um sorriso frio em seu rosto, era Marta.

A família de Clara agora estava com medo, mas quando comentaram com os vizinhos sobre tudo que tinha acontecido, eles não acreditaram que pudesse ser verdade. O padre tinha sido descuidado só isso e crianças inventam histórias mesmo.

Após um mês da morte do padre. Quando Clara chegava em casa com a mãe voltando da casa da avó, viu seu cãozinho deitado na porta da casa, chamou por ele mas ele não veio, então correu pra perto dele, ele estava morto. Clara chorou muito e a mãe consolando a filha se lembrava das palavras do padre sobre os animais que apareciam mortos sem explicação na casa da outra menina que vira aquela mulher.

Com medo a família se mudou daquela casa. Muitos anos se passaram, Clara cresceu. Não viu mais Marta. Uma noite Clara teve um pesadelo, ela já estava com 21 anos, não se lembrava mais de Marta, nem das histórias de menina. Mas no sonho ela encontrou Marta. Elas estavam num pântano, e Marta andava ao lado de Clara com o braço sobre seu ombro, Marta era muito alta e Clara mal podia ver o rosto dela. A estranha mulher disse a Clara que sua mãe ia morrer em breve, mas que ela não tivesse medo, ou ficasse triste e disse: - Eu sempre protegerei você. Clara acordou assustada mas não contou nada a mãe. Três meses depois dessa noite a mãe de Clara estava caminhando no quintal e caiu morta, os médicos disseram que tinha sido o coração. Clara lembrou do sonho, mas não contou para ninguém, de que adiantava, a mãe já tinha morrido e ninguém acreditaria nela. Depois desse dia ela nunca mais viu ou sonhou com Marta.


A amigaOnde histórias criam vida. Descubra agora