O reencontro

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Aquela era uma bela cidade. Ótima para se viver- pensava Clara, enquanto caminhava pelas ruazinhas estreitas do centro . Era bonita, com seus casarões tombados pelo patrimônio histórico, com muitos lugares interessantes para passear. Apesar de não ser uma  cidade grande, vivia cheia de turistas e por isso sua vida noturna era intensa. Ideal para uma garota de vinte e poucos anos como Clara, que se mudara pra lá para trabalhar como guia de um dos melhores hotéis da cidade. Acabada a faculdade de turismo, ela decidiu mudar de cidade para seguir a carreira que tanto amava. Só uma coisa incomodava Clara, seu pai. Após a morte súbita e precoce da mãe, o pai se apegara mais a ela e doía ter de deixá-lo, mas a cidade onde estava agora não era tão longe da sua, e todos os finais de semana ela prometera que iria ver o pai. 

O trabalho no hotel era tudo com que ela sonhara, levar os turistas a todos os pontos históricos da cidade, conhecer gente interessante, a agitação, os belos lugares, tudo era um aprendizado diário. Tudo corria de maneira extraordinária para um primeiro emprego, até que um dia algo inesperado aconteceu. Naquela manhã Clara levava um grupo de estrangeiros, moças e rapazes franceses, para conhecer um local que ficava à beira de uma montanha, era um lugar lindo, cheio de árvores e de mata nativa, tinha também um pequeno lago, a cidade tinha surgido naquele lugar, quando os bandeirantes desbravavam os sertões à procura de ouro.

Enquanto Clara explicava aos turistas  sobre a origem do lugar ela sentiu um arrepio na nuca, como se algo frio tivesse sido encostado ao seu pescoço. Imediatamente uma sensação de insegurança e medo percorreu todo o seu corpo. Ela parou o que estava dizendo, olhou ao redor, mas nada havia de estranho, só os jovens que olhavam pra ela, interessados em ouvir mais sobre o lugar. Ela disfarçou, e rapidamente procurou retomar o que dizia, tentando caprichar mais no francês enquanto falava. Até aquele momento o dia estava claro, quase sem nuvens, mas rajadas de vento começaram do nada, e uma chuva violenta caiu sem que ninguém esperasse. Clara e os turistas voltaram correndo para o ônibus, que levou  todos de volta ao hotel, o passeio  teria que continuar no outro dia.

De volta ao hotel, naquela noite Clara teve sonhos estranhos, pesadelos. Um mulher alta e desconhecida se aproximava dela tentando esganá-la. Ela acordou várias vezes durante a noite tendo sempre o mesmo pesadelo. 

Na manhã seguinte durante o café da manhã Clara pensou ter visto uma mulher sentada numa mesa, nos fundos do restaurante, olhando para ela. Mas quando ela olhou novamente a pessoa tinha sumido sem ter saído pela porta que ficava ao lado da mesa dela. Ela ainda pensou ter visto essa mesma mulher durante todos os passeios que fez com os turistas naquele dia. Parecia alguém que Clara conhecia, mas ela não se lembrava de onde. 

Naquela noite enquanto Clara caminhava pelo corredor indo para seu quarto sentiu uma mão sobre seu ombro, ela se assustou, deu um grito. Ao se virar para ver quem era, não havia ninguém. Ela rapidamente entrou em seu quarto e trancou a porta. Custou a dormir . 

No dia seguinte entre os passeios programados estava uma ida à parte mais velha da cidade onde havia uma capela muito antiga, com santos barrocos, uma linda construção do século XVIII. Os turistas ficaram encantados com o lugar. Atrás da capela havia um cemitério, com túmulos muito antigos e alguns mais recentes.  Caminhando por entre eles, Clara ficou estarrecida ao ver a foto que havia sobre uma das lápides. Era a mulher que Clara vira no restaurante. Do lado da foto estava escrito: Aqui jaz Marta Philomena Phidelis, na mesma placa apareciam duas datas: *12/12/1822 e + 05/10/1874. Imediatamente um filme passou pela mente de Clara, ela reviu sua infância, e lembrou de onde conhecia aquela mulher . Era Marta, a sua amiga imaginária, a mesma mulher com quem brincara quando pequena e que só ela conseguia ver. A mesma mulher, que um dia em sonho lhe avisou sobre a morte de sua mãe. Em pânico ela retornou ao hotel, explicando ao gerente do hotel que não se sentia bem. Naquela tarde ela não trabalhou. Chegou a ter febre, um médico foi chamado mas disse que devia ser apenas cansaço, ou saudades de casa, sua febre parecia ser de cunho emocional, mas nada grave.

Enquanto Clara descansava em seu quarto no hotel. Um vulto lá embaixo encostado ao muro, do outro lado da rua, olhava atentamente para a janela do 3º andar, o quarto de Clara. Uma mulher muito alta de cabelos muito longos, vestindo trajes de uma época muito distante, era ela. Marta, aguardando, talvez um reencontro com Clara.

A amigaOnde histórias criam vida. Descubra agora