Espelho

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    Fez força para libertar-se das mãos geladas. A voz dizendo que deveria "deixar acontecer" só fez com que ela tentasse mais ainda resistir. A voz não se alterou:

- Lutar é inútil. Ninguém vai te ouvir.

Andrea sentiu não apenas o rosto, mas o corpo inteiro gelado e imobilizado. Não conseguia falar, mexer, quase não respirava. De repente, conseguiu liberar uma das mãos e tentou bater em sabe-se-lá o que a estivesse segurando. Porém, a mão não atingiu o vulto. Sentiu algo duro, como se uma parede estivesse à sua frente. Percebeu que estava deitada de bruços.

- O canal foi aberto, porém ela está consciente.

- Isto não deveria acontecer.

- O que faremos?

De onde vinham estas vozes?

Abriu os olhos. Via seu reflexo. Mas não caíra de bruços? Esperava ainda ser um sonho, um pesadelo horrível. Talvez estivesse com febre e esse pesadelo fizesse parte do delírio. Já acontecera outras vezes de sonhar, tendo consciência de que era um sonho. Queria acordar, porém não sabia como.

Tateou o chão que não era chão. Seu reflexo acompanhava. A respiração estava difícil, mas de repente percebeu que não estava mais se sentindo tão amarrada. Tentou levantar, mas estava ainda pesada. Se pudesse ao menos virar o rosto para por um instante parar de ver seu reflexo! De repente, percebeu. Aquilo era um espelho. Estava deitada em um? Ou levantara e estava de frente ao espelho de seu quarto? Que porcaria de pesadelo era aquele?

Conseguiu, com esforço, virar a cabeça e olhar para trás. Aos poucos divisou algumas formas, contornos. Era ainda o seu quarto. Mas algo estava... Errado. Os móveis pareciam diferentes, como que invertidos. Andrea teve um sobressalto. Estava dentro de seu próprio espelho! E seu reflexo estava no quarto "certo". Se é que havia certo ou errado dentro daquela alucinação doida. Seu reflexo deu um sorriso torto. O mesmo sorriso que Andrea dava quando estava tentando entender algo. Mas ela não estava sorrindo. Mexeu uma das mãos. O reflexo não acompanhou. Respirou fundo e virou as costas, decidida a explorar aquele quarto "errado". O ambiente clareou um pouco, o suficiente para ver que as cores da "mobília" também estavam alteradas. Alterações sutis, como quando tirava fotos com o celular e as cores apareciam um pouco diferentes do que eram realmente. O ar parecia diferente também. Olhou para trás discretamente, viu seu reflexo no quarto "certo" também explorando o ambiente.

- Temos que parar por hora. É arriscado com ela consciente.

Porcaria, pensou Andrea, de onde vinham afinal estas vozes? Prendeu a respiração, com receio de encontrar sabe se lá que ser que estivesse falando. Era evidente que estava sendo observada. Mas por quem, ou pelo que?

Uma luz forte a cegou e sentiu seu corpo rodopiar.

DoppelgängerOnde histórias criam vida. Descubra agora