Clóvis
Estou sentando confortavelmente em minha cadeira na sala do meu escritório, bem no centro de Londres olhando fixamente a foto de minha Carol, em um dos vários portas retratos que ficavam em minha mesa. Segurava fortemente entre minhas mãos a minha foto preferida dela. A de quando ela tinha oito anos. Tirei essa foto quando a ensinei a andar de bicicleta. Sorri. Lembrava-me muito claramente deste dia.
Ela fazia uma pose engraça segurando as tranças com as mãos enquanto mostra para a câmera a janelinha com a língua, pois acabara de cair mais um dentinho de leite.
Como sentia falta desses momentos! Enquanto divagava entre sentimentos de saudade, culpa e conformismo. Pensava no que havia feito. Bem. Tecnicamente nada! Não era responsável pelo encontro dos dois naquele chalé. Não tinha culpa se o destino se encarregou de fazê-los se reencontrarem. Ou tinha? Não! lógico que não! Como iria adivinhar que minha filha rebelde iria fugir. E logo para o chalé?
Não vou ser hipócrita e dizer que não gostei desse encontro. Foi providencial! Ri pensando. Até que enfim esses dois tinham se reencontrado mesmo sem saber que já se conheciam. Mas como nada é perfeito pude perceber que tinha algo muito errado acontecendo naquele chalé. Cheguei à conclusão que meu segundo nome não é August e sim preocupação. Pois qual foi a minha surpresa? A minha filha rebelde não tinha se identificado como minha filha e sim como uma amiga da mesma. Isso existe? Não! Quer dizer existe. Carol tinha o poder de realizar cada proeza que me dava até medo.
Mais não foi só ela que fez essa criancice o Thomas também não se identificou. O porquê até imagino. Ele queria sossego e com o nome que tem jamais encontraria. A não ser omitindo o mesmo. Que confusão dos Diabos! As paredes do meu pobre chalé não iriam resistir a tanta tensão. Um pensamento foi surgindo em minha mente.
Eu poderia usar esse fato ao meu favor hora! Seria mais fácil para os dois se acertarem sem saber quem são de verdade. Livres de qualquer preconceito preestabelecido eles perceberiam que foram feitos um para o outro. Porém, ao receber o telefonema daquela rebelde! Imagine só! A danadinha queria dar uma lição num dos homens mais frios e calculista que eu já conheci!
Isso não iria prestar, pois sei muito bem a filha que tenho. Quando colocava uma coisa naquela cabeçinha dura era difícil voltar atrás. Orgulhosa era aquela menina! E determinada como poucas de sua idade. Só não queria que se machucasse. Ela já tinha sofrido demais. Só queria o bem de minha filhinha. Queria vê-la feliz.
Desde que minha Renata foi morta de forma violenta, sequestrada e assassinada. Deixando-me viúvo e totalmente perdido com uma menininha de seis anos de idade. Nunca mais vi um sorriso seu chegar aos olhos.Tentei de tudo. Sempre fiz todos os seus gostos! Minha govermanta vivi dizendo que eu iria estragá-la.
Porém era o mínimo que eu poderia fazer pela luz de minha vida. Mas sempre faltava algo. Pensei em me casar outra vez para dar a Carol uma “mãe substituta”, porém nunca mais me interessei por mulher alguma. Minha Renata foi à única mulher que me despertou o amor. E Carol não merecia presenciar um casamento de conveniências. Não seria saudável para minha pequena.
Então a vi crescer tão rápido que até me assustei. Um dia a ensinei a andar de bicicleta a vendo correr pela casa de tranças e outro a levei a seu baile de graduação em artes. Como o tempo passava; Pensei balançando a cabeça. Quando ela me comunicou que iria fazer faculdade de artes sinceramente vi meu mundo ruir. Não que eu não entendesse que era o que ela queria. Faço tudo para que minha menina seja feliz. Porém foi um balde de água fria isso eu não pude evitar pensar.
Quem iria tomar conta de tudo isto aqui. Pensei olhando ao redor. Só tinha uma solução! Carol teria que se casar! Ela se casando o futuro das Simpson London Metal Exchange estaria garantido. Tinha orgulho de dizer que éramos a maior bolsa de metais não-ferrosos do mundo. Por tanto! Não poderia ser qualquer um! Claramente que não. Tinha que ser alguém de pulso forte com espírito de liderança e visão de negócios. E eu bem sabia a onde encontraria.
Fui por muitos anos, amigo intimo de Richard Coleman. Conhecemos-nos e estudamos na mesma universidade a City University fazíamos o mesmo curso. Administração de fundos. Nossas esposas eram amigas de infância foi natural a nossa aproximação se estreitar mais ainda quando soubemos do fato. Freqüentávamos muito a casa um do outro. Renata e Heloise eram unha e carne. Porém, depois da morte de Renata nos distanciamos. Na verdade eu me afastei.
Heloise ainda tentou por alguns meses se reaproximar, mas não permiti. Não tinha mais vontade de sair pra lugar algum. Além disto, tudo naquela casa remetia- me a lembranças. E de lembranças bastava a minha própria casa. Richard e Heloise Coleman tiveram um único filho. O pequeno Thomas. Que por sinal é afilhado meu e de Renata. Nós também escolhemos os Colemans para padrinhos de Carol. Irônico eles nem se lembravam deste fato, não? Como as nossas famílias se distanciaram as relações ficaram abaladas. Thomas era um moleque que não se importava com o significado desse laço.
Então pra ele não tinha peso algum. Carol não conviveu com Thomas muito tempo só até seu primeiro ano de vida. Depois de adultos ambos ocupados demais com suas vidas que não lembram mais desses encontros e muito menos desses laços. Eu nunca me importei também com esse laço. Não depois de tudo que aconteceu. Não vou colocar a culpa só no Coleman. Eu tinha uma parcela e grande, de culpa nesse “esquecimento” geral.
Desde tenra idade aquele garoto tinha presença de espírito. Todas as atividades da escola até as brincadeiras mais bobas ele queria ser o líder. Deslumbrei um futuro executivo brilhante naquele moleque. Lembrei-me do olhar fascinado que ele dirigiu a minha Carol recém nascida. Quando os seus pais o obrigaram a ir com eles visitarmos assim que minha esposa deu a luz a minha pequena Carol. Lembro do seu rosto fechado que se abriu logo que viu meu bebê. E escutei ele exclamar para mim:
–Tio Simpson. Sua garotinha é uma bonequinha de tão perfeita! Pena que sou tão mais velho. Será que ela me espera? Perguntou-me o garoto de 17 anos com olhos azuis brilhantes.
Respondi bagunçando seus cabelos rebeldes.
– Quem sabe meu jovem? A vida é cheia de surpresas não? Vai que ela tenha preferência por homens mais velhos?
O tempo realmente passou e hoje o garoto é um homem feito. E feito de gelo! Respeitado e temido por todos no mundo dos negócios. Era perfeito realmente para os meus planos. O conhecia e sabia da sua procedência. Fora que eu sabia que no fundo ele ainda nutria a paixonite de adolescente pela minha filhinha. Quantas vezes ele aparecia lá em casa pra visitar minha Carol do nada? Hoje ele não se recordava mais destes fatos e não se recordava de minha Carol. Ela muito menos, pois era só um bebê. Mas sabia que estava em seu subconsciente esperando para subir a tona.
Ele agora era o ICEMAN e não me chamava mais de tio e sim de Clóvis ou Simpson. Parecia outra pessoa. Os negócios o tornaram no que ele era hoje. Mesmo com esse fator negativo o Coleman era minha melhor e única opção. Até porque se ele a machucasse ele iria se ver comigo! O ICEMAN se encaixava em meus planos também, pois a Coleman Center International ferrous é a maior, e melhor, mundialmente em negociação de metais não-ferrosos.
Como dizia o ditado: Eu uniria o útil ao agradável! Ganharia um genro e um sucessor! Não queria ver o legado do meu avô, meu pai e conseqüentemente meu e de Carol, ser administrado por terceiros. Isso Nunca! Pensei furioso. E tudo o que mais queria ver eram esses dois juntos e felizes. Como eu tinha sido com minha Renata.
Era pedir demais? Querer garantir o futuro dos meus descendentes? Perguntei olhando para a foto de Renata. Que parecia que me olhava fixamente em compreensão ao meu diálogo interno. Queria que meus netos tivessem um pai forte e presente. Pode até parecer estranho mais eu sentia que debaixo daquela camada grossa de gelo o Thomas tinha um bom coração e seria um ótimo pai. Sorri. Só precisava que alguém mostrasse isso a ele.
E quem mais pra fazer isso que a minha Carol? Quem mais iria bater de frente com aquele arrogante. Ri. Lógico que só minha Carol! Ela era tão arrogante quanto ele! Eles se completam!
Só não sabiam disto. Ainda. Ambos orgulhosos e determinados! Seriam perfeitos juntos! E eu com certeza iria fazer algo pra unir aqueles dois arrogantes.
E eles me dariam lindos netinhos! Sorri ao imaginar os pestinhas correndo pela mansão. Sorri mais largamente me recostando no encosto da cadeira. Afinal havia luz no fim do túnel pensei beijando a foto de Renata.
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ICE- Capítulos de Degustação. Não completo.
RomancePostado como ICE 2014-2015 1ª Edição Copyright© Erika Alves.