Antes de começar: Parte I

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Não parecia ser, mas era sim um aniversário. O melancólico, por mais que os pais tenham decorado com cores gritantes, aniversário de George, alvo de todos os tios e primos sempre quando acontecia uma reunião familiar. Naquele dia iria ser comemorado 20 anos de pura frustração, o aniversariante sabia disso. Estava sentado segurando um copo de refrigerante de cola, olhava para todos os cantos da sala. "Onde diabos estará o primo Greg?!", George se perguntava em pensamento.

─ Não se preocupe, Gregório virá. Acha mesmo que iria perder o aniversário do primo favorito? ─ tio Gustavo falou sorrindo, dando um fraco tapinha nas costas do sobrinho.

─ Eu sei, tio. ─ George nem se moveu.

Os únicos sãos naquela família eram eles, assim diziam um para o outro. "Essa onda de internet com o tal 4G não é nada comparado com nós, os 3G!", Greg brincava sempre que os três estavam juntos. George, tio Gustavo e o primo Gregório gargalhavam sempre quando reunidos. O resto dos primos e tios olhavam torto para eles. Os pais de George eram obcecados por reputação e ter o filho depressivo de 20 anos era uma verdadeira vergonha para os dois.

Aos poucos, todos iam chegando. Tia Carla estava mais roliça do que nunca, o aniversariante sentiu isso no abraço sufocante e obrigatório que sua tia deu, sem deixar brecha para uma escapatória, em forma de parabéns.

─ É simples, mas de coração, meu querido - ela disse, lhe entregando uma pequena caixa pesadíssima.

Em todos os aniversários ela trazia algo pesado. Sempre algo de ouro. Fazia questão de fingir humildade antes de entregar o presente que, segundo ela, era "simples, mas de coração".

Depois de tia Carla, chegaram os primos Daniel e Jonas. Dois engravatados sempre acompanhados por mulheres bonitas, geralmente modificadas cirurgicamente. Os irmãos se consideravam os donos da razão acerca de qualquer assunto que fosse. Assim que entraram, eles limparam os ombros com as mãos como se estivessem tirando poeira invisível. Logo, se aproximaram de George e Daniel começou com o roteiro anual da conversa entre eles:

─ Olá, primo.

─ Oi, Daniel ─ George pôs os cabelos para trás, fazia isso para irritar os primos que odiavam cortes de cabelos não sociais.

─ Ainda com esse cabelão?! ─ Jonas falou, sorrindo.

─ Pra você ver.

─ Meu primo querido ─ Daniel falou mais alto, recuperando a atenção ─, nós não trouxemos um presente qualquer.

─ Não é algo material ─ acrescentou o irmão.

─ Não mesmo! ─ confirmou o outro. ─ Trouxemos conselhos.

─ Uau! Assim como todos os anos. ─ George levou o copo de refrigerante até a boca e bebeu um gole.

─ Sim, exatamente! ─ Jonas sorriu, sem entender o sarcasmo de seu primo. ─ Olhe para o primo Lucas. ─ Apontou para um rapaz com bolsas enormes nos olhos e careca que simulava um sorriso forçado. ─ Ele era como você, lembra?

─ Sim, ele falava comigo às vezes.

─ Sim! Sabe o motivo de estar careca?

— Nem imagino, mas aí está um bom motivo para se processar um cabelereiro.

─ Meu primo querido ─ Daniel tomou a palavra outra vez ─, nós aconselhamos os pais dele e hoje ele participou de um trote de faculdade, no qual lhe deram um banho de ovos e lhe cortaram o cabelo.

─ Coitado ─ George sussurrou.

─ Ele agora vai estudar para ser um bom e rico advogado.

─ E para isso só precisou de nós. ─ Jonas sorriu ao falar, cheio de si.

A Pior das ViagensOnde histórias criam vida. Descubra agora