Companheiros de viagem

40 6 12
                                    

O Comodoro 86 voava como um anjo negro naquela estrada empoeirada. Nulo sangrava, como de costume. Ao seu lado estava sua missão. Uma adolescente de 16 ou talvez 17 anos sentava no banco do carona. O condutor desacelerou um pouco depois de ter saído da cidade. Normalmente se pisa fundo quando se mete no caminho daquela gangue, A Gangue dos Homens Mortos. Nulo estava ciente de que não deixariam barato. Afinal de contas ele matou dois dos caras e deixou um desacordado com uma pancada que lhe deve ter quebrado o queixo. Um condutor, numa situação assim, sente uma amálgama de felicidade e preocupação. Se fosse uma pessoa normal tudo o que sentiria seria medo.

A testa de nulo estava cortada e seu peito ainda doía. A adolescente apenas olhava para o lado de fora, com a mão encostada no vidro.

— Então... — começou o condutor. — Qual o nome da moça?

— Não é tão ruim — ela disse, nem se movendo.

— Como é que é?

— Essa situação não é tão ruim.

— Eu não sei como que funciona lá no Alto Ápice, menina, mas é que por estas bandas a gente costuma falar coisa com coisa.

— Nada é tão ruim como costuma parecer ou é tão bom quanto realmente deveria ser. — A adolescente o ignorava.

— Ótimo! Uma otimista. Tudo o que eu mais precisava. Você não faz ideia, não é? O velho disse que eu nunca deveria me preocupar com nada, no entanto, também falou que jamais, em hipótese nenhuma, eu deveria me meter com uma galera. Sabe que galera é essa?

— Como assim? — finalmente deu-lhe atenção, saindo de sua posição, parecendo ainda mais tranquila, o que irritou o motorista.

— Os Homens Mortos! — Nulo gritou. — Eu nunca deveria me meter com os malditos Homens Mortos.

— Apenas me leve para onde devo ir. — Ela deu de ombros, calma.

— Não sabe onde estamos metidos. Coitadinha.

— Você não deveria ser mais velho? — A adolescente não parecia dar a mínima.

— Essa viagem foi assinada com o cara antes de mim.

— O Velho?

— Isso mesmo! O Velho. Então! Vai dizer o nome?

— Não tenho nome.

— É o quê?! — Olhou para a adolescente semicerrando os olhos, estranhando.

— Os monges nunca me deram um. — Eles se encararam pelo retrovisor.

— Que desgraçados.

— Eu não ligo muito.

— Olha! Que saber de uma coisa? Eu vou te dar um nome. O Velho me deu um. Não que antes de ser chamado de Nulo eu não tivesse um nome, mas eu prefiro o que ele me deu. Sacou?

— Não acha que isso é desnecessário?

— Não, eu não acho não! Pessoas têm nomes e você é uma pessoa.

Ela, ainda olhando para o retrovisor, sorriu e levantou as sobrancelhas. Nulo questionou, movendo a cabeça, mostrando que não tinha entendido.

— Isso é fofo da sua parte — ela respondeu.

— Opa! Opa! Nada de fofo! Você que espera que eu vou te dar um nome legal, quando na verdade posso muito bem te chamar de algo bem ruim.

— Não acho que faria isso.

— Ah! Mas eu faria sim. Poderia te chamar de Estranha Esquisita que nem ligaria para o que você pensa.

— Estranho e esquisito não dá no mesmo?

A Pior das ViagensOnde histórias criam vida. Descubra agora