VIII - A Coroa de Espinhos do Papa

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Como são misteriosas e cheias de significado as palavras que acabo de ler no Evangelho, e nas quais Nosso Senhor Jesus Cristo traçou o caminho ao primeiro papa! "Em verdade, em verdade, digo-te – diz Nosso Senhor a São Pedro, – quando eras mais moço, tu mesmo te cingias e ias aonde querias; mas quando ficares velho, estenderás as mãos, e outro te cingirá e te levará aonde não queres" (Jo 21, 18).

Que curiosas e misteriosas palavras! Tê-las-ia São Pedro compreendido? Provavelmente não, naquele momento. Ele não via ainda diante de si, a cruz que, a 29 de Junho de 67, seria erguida na colina do Vaticano e à qual o primeiro papa seria pregado, de cabeça para baixo, para selar com a vida, a sua fidelidade a Cristo.

Ora, era nisso que Jesus pensava. No martírio do primeiro papa, e no dos outros papas. O evangelista São João faz esta observação: "Ele dizia isso indicando por que morte devia glorificar a Deus" (Jo 21, 19). Nosso Senhor Jesus Cristo bem via que seus inimigos atacariam no curso dos séculos, essa instituição com o ódio mais encarniçado, e que o destino da Igreja dependeria da conservação do papado. Bem sabia que a tríplice coroa, a tiara que deviam usar os papas, não seria uma coroa de soberano, mas um tríplice coroa de espinhos que havia de ferir até ao sangue a fronte dos pontífices. Já que presentemente estudamos, numa série de instruções, a importância do papado, vale a pena determo-nos sobre esta verdade, de que a tríplice coroa do papa, propriamente falando, é uma tríplice coroa de espinhos.

1. "A solicitude de todas as Igrejas" (2Cor 11, 28)
A primeira coroa de espinhos do papa é a soma de trabalhos e deveres, a que ele deve fazer face no interesse das coisas de Cristo, e que São Paulo exprime por estas palavras: "a solicitude de todas as igrejas" (2Cor 11, 28).

A) Ouve-se aqui e acolá a pueril e ingênua reflexão, de que o papa tem uma existência principesca: há centenas de quartos no Vaticano, ele passeia, come, bebe do melhor, as pessoas inclinam-se na sua frente, e, em suma "vive como grande senhor". É assim que argumentam os que nunca viram o papa.

Pelo contrário, quem conhece as obrigações e os trabalhos sobre-humanos quotidianos do papa; quem sabe que ele é ocupado sem trégua desde cedo, de manhã até bem tarde, de noite; quem sabe que, de 1º de janeiro a 31 de dezembro, ele recebe e expede cerca de três mil cartas, todos os dias; quem sabe que, no decurso do ano do jubileu, ele pronunciou mais de mil discursos; quem sabe que, dia após dia, ele dá uma multidão de audiências, nas quais recebe os visitantes mais simples como os mais distintos, vindos de todos os pontos do mundo; quem sabe em quantas negociações e deliberações ele tomar parte, e que ele dirige não somente a vida espiritual de 360 milhões de católicos, mas ainda indica os meios de converter os infiéis; – quem sabe tudo isso, digo, não inveja ingenuamente "a vida de grande senhor" do papa, mas considera-o com respeito, e profunda admiração, como "o primeiro obreiro da obra de Cristo". "O servo dos servos de Deus", a quem convém perfeitamente aquelas palavras de São Paulo, dizendo que pensa sobre ele "a solicitude de todas as igrejas".

B) E, coisa maravilhosa: os encargos e as tarefas do papa crescem cada vez mais, nos nossos dias. De fato, o seu prestigio cresce cada vez mais, no mundo inteiro. Cheios de gratidão à Divina Providência, verificamos que, enquanto nas subversões que seguiram a grande guerra, nações têm desaparecido, tronos têm desmoronado e a fé dos homens nas grandes palavras e nas ideias filosóficas tem sido, por assim dizer, abalada, o som das trombetas de prata da basílica de São Pedro torna-se cada vez mais forte, e cada vez mais, os indivíduos, os povos e os Estados volvem-se com atenção, esperança e respeito para o Vaticano, de onde ecoa pelo mundo: "Tu es Petrus"... "Tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha Igreja" (Mt 16, 18).

Vemos com alegria e orgulho que, mormente depois da guerra, o prestigio do papa tem crescido incessantemente no mundo. Milhões de homens volvem-se para Roma e escutam as palavras do papa. Mas então tenhamos consciência do trabalho imenso que representa essa tarefa de dirigir o mundo!

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