31 de Julho

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Vi num canto alguém quietinho; um menino com a pele tão branquinha, poucas sardas salpicadas pelo rosto, cabelos levemente cacheados e pretos, magro, não muito alto, e com jeito de quem era tímido demais pra fazer algo que chamasse atenção. O menino lembrava minha primeira paixão adolescente, dessas onde tudo é novo, rápido e confuso demais. Dessas que nos faz achar que sabemos algo sobre o amor e amar. Não sabemos. Então pensei que era daquele jeito que ele ainda pareceria se de alguma forma houvesse parado no tempo. E havia, era como eu lembrava.

Àquela altura do meu devaneio, o trem já tinha chegado à próxima estação. Pessoas entravam e outras saiam, e com elas historias e nomes que eu nunca conheceria. Rostos que, no tempo gasto de uma estação a outra, eu já teria esquecido. Eu costumava guardar algumas características, qualquer coisa que me parecesse singular, ou contasse algo por si só. Eu gostava de imaginar as historias e apelidos por trás de todas aquelas cicatrizes, marcas e pintinhas. Sentia vontade de atender minha curiosidade e ir logo perguntar a origem da coisa, mas a verdade é que eu tinha medo de descobrir uma versão menos mirabolante da que inventei.

Tudo ali permanecia quieto. Exceto pelo menino que olhava constantemente o relógio no pulso, um ambulante anunciando bananadas e passageiros que entravam e saiam de vez em quando. É só que aquele fluxo contínuo de pessoas, toda a incerteza do movimento, e minha expectativa de alguma mudança, parecia muito com o que costumava acontecer na minha vida. Eu nunca sabia ao certo quando tempo as pessoas permaneceriam comigo, apesar de todas as conversas animadas, das horas e horas de confidencias trocadas, ou das conexões e afetos que pareciam ter nascido. Poderia ser o tempo de um café, de uma viagem ou quem sabe de uma vida.


Diários de uma passageira qualquerOnde histórias criam vida. Descubra agora