Amigo, por favor retire suas mãos da
Frente de seus olhos para mim
Eu sei que você quer ir embora, mas
Amigo, por favor não tire a sua vida de mim (Friend, Please - Twenty One Pilots)Hoje eu ia saindo do banho quando ouvi o síndico entrando (ele é o pai do Niall); mais que depressa eu corri pro meu quarto e fechei a porta. Não era pra ele não me ver nu; era porque, pra ser franco, eu não curto aquele síndico. Uma vez ele disse que pintor que pinta homem é porque não sabe pintar mulher.
Tipo do cara que não sabe nada de arte, não é?
Outra vez, eu estava lá encima jogando videogame e tocaram a campainha. Quando eu abri a porta, dois caras disseram que eram da polícia e me mandaram ir embora: queriam ficar sozinhos com o Zayn para interrogar ele. Depois eu fiquei sabendo que o síndico tinha ido na polícia dizer que o meu amigo estava morando aqui, como se ele fosse um criminoso.
Tipo do cara que não sabe que cada um fica na sua, não é?
E ainda por cima, sempre que esse síndico aparece aqui em casa, ou é pra fazer fofoca de alguém do edifício, ou é pra arrastar meu pai e minha mãe para a reunião de condomínio (que eles detestam).
Então eu achei melhor ficar bem quieto aqui no meu quarto.
Mas algumas muitas vezes eu ouvi o nome do Zayn e começei a prestar atenção na conversa da sala. Tive que abrir a porta para escutar meu pai: ele estava falando sobre suicídio, e cada vez que ele e a minha mãe falam nisso eles baixam a voz. O síndico não: ele tem uma voz grossa e grave que, pelo anjo! Até o sussurro dele é alto demais que dá pra ouvir da esquina. E então ele foi sussurrando que o meu amigo tinha ficado marcado por causas das idéias políticas dele (eu não entendi nada do que isso queria dizer) e, quem sabe, ele tinha se suicidado por causa disso?
— Será que ele achava que ia ser preso de novo? – Minha mãe perguntou.
E então começou: política pra cá, política pra lá. Não aguentei mais ficar quieto: fui na sala e falei:
— O Harry disse que o meu amigo morre como todo mundo um dia morre. Não foi de propósito, não!
— Ele tinha que dizer isso, não tinha? – O síndico falou.
Respondi olhando para o meu pai:
— Ele conhecia ele melhor que ninguém, e ela me garantiu que não foi de propósito.
— Ele tinha que dizer isso – O síndico falou de novo – pra ninguém ficar pensando que foi por causa dele que o teu amigo se matou.
Eu não parava de olhar para o meu pai; e o meu pai não parava de olhar para mim.
— Mas por que ele ia fazer isso? – Eu perguntei.
— Porque ele estava doente, Liam.
— Doente? Nós jogamos videogame na véspera. Três partidas. Uma atrás da outra. E ele não tinha nada!
— Doente aqui – me pai bateu na cabeça–; só uma pessoa que está muito doente aqui faz o que ele fez.
— Mas você quer, por favor, me explicar direito tudo que aconteceu?
Minha mãe interrompeu e disse que eles já estavam atrasados para a reunião de condomínio. Eu fiquei nervoso:
— Mas ele era meu amigo!
O síndico levantou:
— Vamos indo?
— Amigo pra valer! Ele mesmo disse que idade não contava pra ser amigo sincero. E eu vou ficar sem saber se foi mesmo de propósito que ele morreu?
A minha mãe me abraçou:
— Você não tem mais que ficar pensando nisso, Liam. Na sua idade, você tem que pensar na vida e não na morte.
— Eu já tenho 17 anos, qual é a idade certa para saber porque meu amigo morreu?
— Você tem outros amigos...
— Que eu não gosto como gostava dele!
— Você tem tanta coisa pra estudar, pra descobrir, pra inventar, para de ficar pensando no que aconteceu com ele e coloca a vida pra frente, meu filho! – Fui saindo e eu fiquei. E fiquei no ar ainda por cima. Voltei para o quarto. Achei que meu pai estava com mais cara de verdade do que o tal Harry. Não é porque ele era meu pai, não; era pelo modo dele olhar no meu olho e o Harry olhar pro chão.
Mas certeza eu não tenho. E fico pensando: será que foi mesmo?
E se foi mesmo, foi por quê?
Ele gostava tanto de pintar, de jogar videogame, de comer, de pensar, ele gostava do relógio tocando e se via uma flor lá embaixo logo se abaixava na janela para me dizer, olhar que coisa bonita.
Eu gostava quando ele me ensinava sobre as coisas da vida dele, de pintar, de beijar, o jeito como ele tentava me fazer aprender sobre os problemas da adolescência, usava sua experiência para falar, embora não gostasse muito de conversar.
E ele vai e acaba com tudo isso que era tão bom?
Se não na hora de se abaixar para ver a flor ele caía da janela; se na hora de comer ele se engasgava e sufocava; ou se ele então tivesse ficado bem velho; mas, assim? Resolvendo ele mesmo? Eu vou me acabar agora?
Por que, por que, por quê?
O videogame estava ligado (hoje era dia da gente jogar); o álbum que ele me deu estava aberto numa página com uma flor roxa com a tela amarela escrito Intermission: Flower, claramente era a flor debaixo da janela; estava também aberto numa aquarela que mostrava um barco amarelo escrito GOLDEN, afundando num mar cor de... Que cor era aquela?
Não era bege.
Nem era marrom fraquinho.
Quase podia ser uma cor que Zayn gostava e chamava de Siena, mas também não era.
Não era cor de rosa nem laranja, o que era então?
Parecia a cor dos olhos do meu amigo, então eu chamei de cor-de-saudade e pronto.
Na página ao lado, pra mostrar como é que as cores mudam, Zayn desenhou outra aquarela: depois de afundar no mar cor-de-saudade o barco aparece de novo, mas então, com aquele banho, o amarelo dele ficou diferente, estranho, com um jeito que eu não gosto nada e que eu vou chamar até de amarelo-síndico.
Quando mais eu olhava para aquele barco, mais eu achava que o Harry tinha mentido pra mim. E quando mais eu achava, mais o amarelo também ia ficando com jeito de síndico, e mais eu ia me sentindo feito o barco: todo rodeado de cor-de-saudade.
Uma cor-de-saudade que ia até ficando vermelha de tanto que eu estava achando tudo difícil de entender.
Quer dizer então que o Harry tinha mentido pra mim (mas por quê?!).
Então tinha sido mesmo uma morte de propósito. Mas por quê??
E por que quando é assim todos fazem mistério? E falam baixo? E fica até parecendo que suicídio é uma palavra suja, como uma palavrão; por quê?!
Se um cara é preso porque matou, porque roubou, pessoas assim da minha idade ficam sempre por dentro; por que então, se dizem "ele é um preso político", pessoas da minha idade nunca entendem direito o que isso quer dizer, por quê?
E quanto mais por-que's iam aparecendo, mais estranho o meu amarelo ficava, e mais cor-de-saudade ia crescendo!
Também, com esse branco todo do relógio que não bate, e com esse videogame aqui parado, me lembrando que hoje era dia da gente jogar, é claro que a saudade vai aumentar. E se continuar crescendo assim, eu nem sei o que vai acontecer.
O que vcs acham desse drama?
Lola ♥
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MEU AMIGO PINTOR ✴ ZIAM MAYNE (concluida)
FanfictionLiam tem um amigo pintor, com quem aprendeu a deslumbradora revelação do mundo das cores, das formas, e até o primeiro sentido de amar. Zayn, o amigo pintor, a presença do jovem amigo cheio de ternura e entusiasmo, entra nessa aventura de descobert...