Décimo sexto

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Assim que eu acordo percebo que o céu está escuro. Bea está dormindo ainda, o que não é de se espantar levando em conta que, como se não fosse o bastante o fato de ela se recusar a acordar antes das dez da manhã qualquer dia que não tenha aula, quando ela foi dormir já eram quase duas da manhã fazendo alguma coisa no meu notebook.

Levanto com cuidado apoiando todo o meu corpo na ponta dos pés, evitando qualquer barulho que possa acorda-la e fazer com que um objeto qualquer – ou seja, o mais próximo de suas mãos - atinja minha cabeça em cheio.

Ando com cuidado até a porta logo após de pegar meu celular na escrivaninha e fecho minha mão em volta da maçaneta tentando não deixar com que a porta ranja ao abrir.

Para minha sorte tudo permanece no mais absoluto silêncio das cinco da manhã de um sábado como qualquer outro.

Sigo até a cozinha e coloco água na cafeteira. Conecto o wi-fi no celular e vejo as mensagens aparecerem freneticamente na tela, a grande maioria do grupo de estudos de vestibular, eu leio todas rapidamente e percebo que pelo menos 80% delas são mais de conversas aleatórias do que de tirar dúvidas realmente de conteúdos.

Leio então as mensagens do grupo de família e por fim vejo a pequena carinha do Bê no canto da tela, sinto meu coração bater mais acelerado e me repreendo por isso.

Maldita hora que fui me dar conta de que estava gostando dele, agora simplesmente toda nossa amizade estava arruinada já que é impossível voltar ao que éramos antes e é impossível seguir em frente com qualquer plano que eu quisesse colocar em prática, já que ele claramente partiu para outra.

Parabéns, Mariana! Você realmente sabe como estragar uma amizade de 10 anos.

Bloqueio a tela do celular com raiva e então o coloco em cima do balcão da cozinha, o que faz com que um barulho invada o ambiente.

Sinto uma leve onda de satisfação e logo uma vontade maluca de repetir tudo. Levanto o celular novamente, mas antes que ele possa atingir a superfície rígida do balcão, escuto a voz do meu pai, o que faz com que um arrepio percorra todo meu corpo.

- Nem pense em fazer isso... – Sinto meu coração acelerar ainda mais. – O que está acontecendo, Mariana?

Não tenho coragem de virar para vê-lo e rapidamente sinto vergonha da minha impulsividade. Que ideia mais estúpida é essa de simplesmente ficar batendo com o celular no balcão da cozinha? Do que isso adiantaria?

- Nada – digo, por fim, depois de inspirar profundamente e sentir os batimentos cardíacos voltando ao normal. – Nada, eu apenas fiquei nervosa com uma coisa...

Ele vem até meu lado e então vejo seu rosto, não está com raiva, como imaginei que ficaria a me ver tentando quebrar o celular por motivo nenhum, mas, pelo contrario, seu rosto expõe um sorriso irônico, que faz com que uma pequena covinha surja no canto direito da sua boca.

- O café já está pronto? – Ele pergunta logo saindo do meu lado e abrindo o armário.

- É, acho que sim – respondo e então tiro a jarra de dentro da cafeteira e a levo até o balcão da cozinha. – Você trabalha hoje?

- Não, mas também não consigo dormir até mais tarde mais, infelizmente – ele diz dando de ombros e logo em seguida coloca duas xícaras em cima do balcão, puxando duas cadeiras também.

Aproveito para pegar o açúcar e uns biscoitos no armário. Andamos pela cozinha em um silêncio cúmplice e agradeço a ele mentalmente por ser tão compreensível comigo.

- Como estão as coisas na escola? – Ele pergunta enquanto eu tomo meu primeiro gole de café, o que faz com que uma grande onda de felicidade me preencha instantaneamente. Que efeito mágico tem a cafeína.

Como conquistar seu coraçãoOnde histórias criam vida. Descubra agora