Décimo sétimo

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Bea está digitando...

Bea está digitando...

Bea está digitando...

Jogo meu celular novamente na cama, com cuidado para que ele não quicasse e caísse mais uma vez debaixo da cama. Mas a verdade é que nesse momento eu sequer estou me importando muito com a tela dele ou qualquer outra coisa que não envolva a minha conversa com a Bea.

Desde que ela foi para casa de manhã não havíamos conversado sobre o que aconteceu ontem e porque eu estava como estava quando ela chegou aqui em casa. Mas o fato é que eu tomei a minha escolha e agora eu não poderia mais voltar atrás. Se for para acontecer, terá que acontecer desse jeito.

Mariana: "Bea, eu sei que você se esforçou muito para elaborar o plano de conquistar o Bê e coisa e tal. Mas a verdade é que eu não quero mais isso. Sei que não vai dar certo mudar coisas em mim para agradá-lo e se ele quiser me notar, terá que me notar pelo que eu sou."

Ela visualizou a mensagem no mesmo instante em que recebeu, porém já fazem mais de cinco minutos que ela está digitando algo, mas nada é enviado. O que só aumenta todo o meu nervosismo. Ou ela está escrevendo e apagando freneticamente, ou está escrevendo o novo livro do George R. R. Martin.

Quando estou relendo a minha mensagem pela décima vez analisando cada pequena palavra e a forma como escrevi, o celular finalmente vibra para uma resposta de apenas seis palavras! Cinco minutos para seis palavras?

Bea: "Preciso que você venha aqui agora."

Mari: "Bea, não é para tanto, sério. Eu estou bem com isso. Não é nada demais. Não vou morrer se simplesmente o Bernardo não se apaixonar por mim ou qualquer coisa do tipo."

Ela visualiza a mensagem e começa a digitar, levo meu dedo mindinho à boca novamente e tiro mais um pedaço de pele com o dente, sentindo logo em seguida o gosto de sangue. Qual o problema das pessoas quando precisamos que elas respondam rapidamente as mensagens?

Bea: "Eu preciso de você aqui para mim. Por favor."

Sinto meu coração acelerar no mesmo momento e então bloqueio a tela do celular, colocando-o dentro do bolso do meu jeans e pegando a chave. Raras são as vezes em que a Bea pede minha ajuda para alguma coisa – ao contrário de mim. Por isso que eu sei que sempre que ela fala "preciso de você aqui para mim" é porque a coisa é bem mais séria do que eu imaginava.

Pego o primeiro ônibus que passa e fico atenta a cada um dos quatro pontos que fazem parte do trajeto entre a minha casa e a dela. Geralmente eu vou a pé da minha casa até a sua, porém seria impossível conseguir gastar tanto tempo assim sem saber o que está acontecendo. Penso em lhe mandar uma mensagem pedindo para que adiante o assunto ou me dê alguma pista do que pode ter acontecido, porém eu sei que isso vai ser apenas pior. Ela precisa que eu esteja lá, não por mensagem, mas com a minha presença.

Assim que a Bea abre a porta os seus olhos estão vermelhos e inchados, metade da frente do seu cabelo está preso em um coque no topo da cabeça enquanto o resto está solto e bagunçado. Ela segura um lenço de papel, mas parece que parou de chorar há um bom tempo, já que seu rosto está seco.

Ela me olha com atenção e sinto meu coração se apertar no peito. Não faz muito tempo que a vi em um estado semelhante, mas dessa vez há muito mais dor em seu olhar. Ela se levanta e vai até o quarto em silêncio, permaneço ali na sala, abaixada ao lado do sofá até que ela volta dois minutos depois com o celular na mão.

Ela desbloqueia a tela e o coloca em minha mão, está aberto no WhatsApp, mais especificamente na conversa com o Tiago.

- Você ainda conversa com esse idiota? – Pergunto exasperada, sentindo a raiva tomar conta de mim.

Obviamente, não raiva da minha amiga. Mas sim por saber que esse ser humano ainda se atreveu de mandar-lhe mensagem e agora ela está assim.

A Bea apenas balança a cabeça em negativa e a inclina, indicando para que eu leia a conversa do começo. Meus olhos correm rapidamente pelas palavras e conforme eu vou lendo mais nervosa vou ficando.

Tiago: "Beatrice, eu nem deveria estar lhe mandando essa mensagem"

Tiago: "Beatrice, eu nem deveria estar lhe mandando essa mensagem depois do papelão que você me fez passar na última vez que nos vemos. Saiba que aquilo é algo que não se faz com ninguém!"

- Bea, o que você viu nesse imbecil? – Pergunto instintivamente e ela dá de ombros, é como se estivesse economizando gastar palavras. E eu nunca a vi falar tão pouco em todo o tempo de existência de nossa amizade.

Beatrice: "Me poupe, Tiago. O que você quer comigo?"

- Isso aí, garota – digo enquanto passo a mão na cabeça dela que apenas revira os olhos.

- Você vai narrar todas as mensagens? – Ela pergunta impaciente e é a primeira vez que ouço a sua voz. – Eu preciso de uma ajuda aqui!

Passo os dedos na boca como se estivesse fechando um zíper e volto a ler a conversa.

Tiago: "Está vendo? Por isso que não deveria estar lhe mandando mensagem. Estou te fazendo um favor! E você ainda vem com suas grosserias? Deveria deixar você na ignorância para você aprender."

- Mas que mer... – começo a falar, mas a Bea expira profundamente e me calo antes de completar minha frase, voltando minha atenção a ler o restante.

Beatrice: "Do que você está falando Tiago?"

Tiago: "Estou falando que ontem fui ao médico e descobri que estou com uma doença. Aparentemente todas as pessoas com quem estive vai precisar se consultar no médico para tomar um remédio, mesmo que esteja sem sintoma. E isso inclui você."

Beatrice: "O que? Que doença é essa, Tiago? Que diabos você passou para mim?"

Tiago: "Não fique histérica, é algo fácil de tratar. É apenas Clamídia, o médico disse que é super comum."

- Bea... – falo sem emoção. Ela olha para mim e balança a cabeça em afirmativa, confirmando o que eu acabei de ler.

- Não tive coragem de responder mais nada a ele – ela fala e percebo que nos seus olhos começam a se formar lágrimas novamente. – Não existem palavras o suficiente para o que eu quero chamá-lo.

- O que você vai fazer? Já falou com sua mãe? – Pergunto assim que ela afasta as pernas do sofá e eu me sento.

- Não faço ideia de como fazer isso, Mari – ela diz com a voz ficando mais aguda, de repente parece ter se tornado uma garotinha de cinco anos. – Ela vai me matar. Ela nunca quis que eu tivesse esse namoro. Ela vai me matar!

A Bea se levanta e começa a andar de um lado para o outro na sala enquanto segura a sua cabeça com as duas mãos, vejo pelas juntas brancas do dedo o quanto está apertando os cabelos.

- Calma! – Digo me levantando e a parando de dar outra volta na frente do sofá. – Hoje é sábado, não há muita coisa que você pode fazer. Você está com... os sintomas? – Pergunto cautelosamente e ela apenas balança a cabeça negando.

- Essa porcaria que esse idiota me passou deve estar em mim há semanas e eu não fazia ideia disso, Mariana! Eu tenho uma DST – ela diz a última parte sussurrando, mesmo eu sabendo que estamos sozinhas em sua casa. – E eu não fazia ideia.

- Eu sinto muito, Bea – digo com calma e a puxo para um abraço. Quando ela passa os braços pelo meu pescoço percebo o quanto está tremendo. – Fica tranquila, vai ficar tudo bem. Segunda você vai ao médico, posso marcar para você e vai ficar tudo bem.

- Eu sou uma estúpida! – Ela diz se desvencilhando do meu abraço e dando um tapa no meio da testa. Quando está prestes a levantar a sua mão pela segunda vez, seguro seu braço com força e então vejo seus olhos cheios de lágrimas, que agora já começam a transbordar pelo rosto.

Seguro seu braço até que ela o abaixa sozinho e então a abraço novamente, sinto meu ombro ficando molhado a cada minuto que passa e sua respiração cada vez mais irregular até começar a ser interrompida por soluços.

- Vai ficar tudo bem – falo baixinho enquanto passo a mão em seu cabelo. – Eu estou aqui. Vai ficar tudo bem. 

Como conquistar seu coraçãoOnde histórias criam vida. Descubra agora