VIGÉSIMO QUINTO

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Vinte minutos depois eu estou na enfermaria implorando para não chamarem os meus pais. Aparentemente a inspetora não está comprando muito a ideia, mas depois de provar que eu estou bem, pego um Uber - provando que estarei indo diretamente para casa e ela me faz compartilhar minha rota.

Quando chego em casa respiro aliviada finalmente.

Desde que entrei na sala, tudo começou a girar. A ideia de rever o Bernardo, de ter que me explicar e me desculpar, sendo que nem eu mesmo entendia porque eu agi daquele jeito. O medo do que a Bea diria, como ela me acharia uma covarde e sem noção... Eu sei que ela jamais diria isso, com exatamente essas palavras. Mas se tem uma coisa que todos esses anos de amizade com a Beatrice me ensinaram é que ela não precisa de palavras para se expressar, seu rosto diz tudo. E tudo que eu precisava naquele momento era ter que lidar com seus olhares.

Mas eu já tinha estragado tanto as coisas naquele dia. Eu sabia que se evitasse almoçar com o Bernardo as coisas ficariam ainda mais estranhas. E se ele começasse a desconfiar que algo de errado estava acontecendo? Ele poderia estar pensando tantas coisas, eu estava mandando tantos sinais confusos.

E foi exatamente nesse momento em que despertei dos meus pensamentos com a professora me olhando em choque, embora sua voz fosse suave. A primeira coisa que percebi foi que meu caderno estava molhando, fazendo as palavras que antes estava escrita ali se transformassem em uma aquarela. Mais água pingava, sem parar, como uma torneira mal fechada. Quando dei por mim, eu estava chorando e minha respiração era tão irregular que o barulho me assustava.

Cheguei em casa ainda como se estivesse em um torpor, sem entender direito de onde todas aquelas emoções haviam saído. Sentei no sofá, jogando minha mochila nos pés e encarando a TV com sua tela preta. Prestei atenção em minha respiração, agora tão normal que nem parecia que minutos antes eu me sentia como a Sandy quando não estava com seu capacete de ar.

Será que meus pais realmente tinham razão?

Será que eu realmente precisava de ajuda?

Que tipo de adolescente dramática e tinha me tornado? Eu sempre fui tão normal, tão típica e de repente tudo parecia virar uma bola de neve que se tornava maior a cada momento e era tão, mas tão cansativo sair correndo em sua frente. Cada minuto tudo parecia mais perto de me engolir, minhas pernas pareciam mais fracas. Eu sei que sair do caminho dessa bola de neve era uma opção. Mas eu não sei porque não fazia isso. Eu não sei como escolher isso.

Cada dia que passava eu começava a odiar ainda mais a minha mente e tudo que saia dela.

-

Depois de um banho frio, um almoço requentado no microondas e uma lista de exercícios feita com sucesso, eu já me senti pronta para encarar o mundo novamente.

Quase pronta, se não fosse pelo um pequeno incômodo que insistia em permanecer ali, bem no fundo da mente. Mas hoje eu não queria mais lhe dar ouvidos. Então, cada vez que ele aparecia eu bloqueei seu sinal e fingi que ele não existia - não dizem que se você mentir muito para si mesmo uma hora acabava acreditando, em algum momento? Pois bem.

Não pensei muito antes de vestir meu maiô, pegar minha mochila da natação e descer até o térreo, colocando um podcast sobre as notícias do dia para me manter atualizada. Não pensei muito quando passei pela catraca do ônibus e meu coração começou a saltar mais forte quando um pensamento intruso atravessou minha mente e me fez questionar o que eu faria quando visse o Bernardo daqui a pouco. Não pensei muito quando cheguei na academia, segui para o vestiário e tranquei minha mochila dentro do armário, junto com o short que vestia.

Mas foi somente quando eu vi o Bernardo que eu não pensei em nada.

Ele me encarou com a mesma expressão de mais cedo, as sobrancelhas unidas em uma única linha, a boca tão contraída que mal dava para enxergar seus lábios. Ele andou pela beirada da piscina, pelo lado oposto em que eu estava e no momento em que pisei o pé na escada de metal, ele entrou pela porta que dava entrada na academia.

Como conquistar seu coraçãoOnde histórias criam vida. Descubra agora