AMERICAN BABYLON

BOM DIA, AMÉRICA!

Na sede da organização estudantil Kappa-Mu-Sigma da Universidade de Maryland, o dia sempre começava bem cedo. Cedo demais para o gosto de James James — que, de fato, tinha esse nome, mas a história por trás disso era longa e ele não gostava de contar.

Naquela manhã, James acordou com o som atroador do liquidificador defeituoso na cozinha, que fazia mais barulho que uma corrida de tratores.

Deitado em sua cama, no escuro, ele grunhiu e se obstinou a permanecer lá por mais algum tempo. Ainda lhe restava alguns minutos antes da hora de acordar e a melhor forma de aproveitá-los era, evidentemente, dormindo. Eram cinco minutos cruciais para o seu dia.

No entanto, quando ele estava prestes a adormecer e ganhar outra passagem para a terra dos sonhos, um grito estridente vindo de algum lugar na escuridão do dormitório o fez se assustar.

— Leon?! LEON! — Depois do grito, ouviu-se som de passos pesados martelando o soalho e uma respiração bufante, o que indicava que James não devia ser o único incomodado com aquele som. — Toda manhã é assim... — A pessoa abriu a porta do quarto, permitindo que a luz do corredor penetrasse a escuridão.

James olhou na direção da porta. Pelas curvas do corpo, a baixa estatura e os cabelos castanhos desgrenhados que a luminosidade delineava, ele descobriu que a responsável pelo distúrbio era sua colega de quarto, Lia Becker, uma garota agradável, mas também muito temperamental e um tanto perigosa quando se zangava além da conta.

E agora ela parecia bastante zangada, o que queria dizer que a quietude daquela manhã estava a um passo de ir pelos ares.

— Ah, não... — Em outras circunstâncias algo assim seria inaceitável, mas James lidou com isso com a maior naturalidade. Algum escândalo logo pela manhã por um motivo banal? Isso não era novidade para ninguém na sede da Kappa-Mu-Sigma, apenas mais um dia normal. Ali, novidade mesmo seria alguém conseguir dormir direito.

A Kappa-Mu-Sigma era uma das muitas organizações estudantis da Universidade de Maryland, mas a única que não seguia as regras que determinavam a aceitação de apenas homens ou mulheres, e aceitava membros de ambos os sexos. Isso, claro, fazia da Kappa-Mu-Sigma uma espécie de pária entre as outras sociedades, e ninguém a via como uma sociedade estudantil séria.

A Kappa-Mu-Sigma fora fundada há uma década pelos membros de uma fraternidade e uma irmandade, que estavam cansados do caráter exageradamente seletivo das fraternidades e irmandades, e queriam construir um lugar onde qualquer pudesse pertencer.

No início, a Kappa-Mu-Sigma sofreu uma grande opressão pelo conselho estudantil e pelas outras sociedades e irmandades que não admitiam sua existência; pelo esforço e a luta incansável de seus fundadores pelo reconhecimento, no entanto, mais tarde a Kappa-Mu-Sigma enfim ganhara o status de uma sociedade estudantil, e, ainda que pequena e desprezada — sendo excluída de maior parte dos assuntos acadêmicos da instituição, sem um lugar no conselho das sociedades estudantis e mal sobrevivendo com o financiamento que tinha — ganhara certa notoriedade não apenas dentro dos limites do campus onde surgira, mas em todos os lugares onde a história de seus fundadores fora levada.

O ideal a partir de que fora criada estava em seu motto: "quisque potest participare"; literalmente "qualquer um pode participar", e era sua regra máxima. Em seus dez anos de história, a Kappa-Mu-Sigma jamais recusara qualquer um que desejasse se integrar. Não era necessário ser genial, especialmente popular, talentoso ou rico; apenas querer entrar. Devido a isso, grande parte dos alunos que compunham as fileiras da Kappa-Mu-Sigma eram pessoas que não foram aceitas em outras sociedades por motivos diversos: pessoas de todos os gêneros, raças, posições sociais e personalidades, que não se encaixavam em nenhum outro lugar senão ali, onde todos tinham um lugar — até mesmo os desajustados.