Gamcheon-Dong.
Rosé já esteve nessa área, muitos anos antes. Numa festa de ano-novo. Ela mal se lembra do nome da moça que deu a festa. Seo alguma coisa. Seohyeon, talvez. Alice a conhecia e foi quem dirigiu naquela noite. As estradas estavam lamacentas de neve. Montes cinzentos de neve suja emolduravam as ruas. As pessoas usavam o gelo dos telhados para fazer drinques. Alguém ficou seminu e escreveu 2009 na neve. Agora está no auge do verão, e é Rosé quem dirige. Com medo, sozinha e de luto.
A viagem até a casa é angustiante. Dirigindo a menos de trinta quilômetros por hora, Rosé procura freneticamente placas e outros carros. Fecha os olhos e depois os abre de novo, sem parar de dirigir.
As ruas estão vazias. Toda casa pela qual passa tem cobertores ou tábuas de madeira tapando as janelas. Vitrines estão vazias. Estacionamentos de shoppings, desertos. Ela mantém os olhos no asfalto imediatamente à sua frente e dirige, seguindo o caminho marcado no mapa a seu lado. Suas mãos parecem fracas ao volante. Seus olhos doem de tanto chorar. Ela sente um fluxo interminável de culpa por ter deixado a irmã, morta, no chão do banheiro de casa.
Rosé não a enterrou. Apenas foi embora.
Nos hospitais, não atenderam ao telefone. Nem nas funerárias. Rosé cobriu parte do corpo da irmã com um cachecol azul e amarelo que Alice adorava.
O rádio entra e sai de sintonia. Um homem fala sobre a possibilidade de uma guerra. Se a humanidade se unir, diz ele, mas a estática se sobrepõe à sua voz. Ela passa por um carro abandonado no acostamento. As portas estão abertas. Uma jaqueta pende do banco do carona e toca no chão. Rosé olha para a frente de novo, depressa. Depois fecha os olhos. Em seguida, os abre.
O rádio está funcionando. O homem continua falando sobre guerra. Algo se move para a direita e ela vê de relance. Não olha. Fecha o olho direito. Mais à frente, no meio da estrada, um pássaro pousa e voa outra vez. Quando chega até ali, Rosé percebe que a ave estava interessada num cão morto. Ela passa por cima do animal. O carro sacode. Ela bate a cabeça no teto, a mala balançando no banco de trás. Está tremendo. O cachorro não parecia apenas morto, mas também retorcido. Ela fecha os olhos. Depois os abre.
Um pássaro, talvez o mesmo, grasna no céu. Rosé passa pela rua Seomyeon. Rua Jeonmang-ro. Dalmaji-gil. Sabe que está perto. Algo dispara à esquerda. Ela fecha o olho esquerdo.
Passa por um caminhão dos correios vazio. As cartas estão espalhadas pelo concreto. Um pássaro voa baixo demais e quase bate no para-brisa. Ela grita, fecha os olhos e os abre. E, nesse momento, vê a placa que está procurando.
Hyehwa-ro.
Rosé vira à direita, freando enquanto faz a curva para entrar na rua Hyehwa-ro. Não precisa conferir o mapa para saber que o número é 273. Ele esteve em sua mente durante toda a viagem.
Além de alguns carros estacionados em frente a uma casa à direita, a rua está vazia. A vizinhança parece comum, típica de um bairro residencial. A maioria das casas é igual. A grama está alta em todos os jardins. Todas as janelas estão cobertas. Ansiosa, Rosé olha para a casa onde os carros estão estacionados e sabe que é a que está procurando.
Ela fecha os olhos e pisa no freio.
Está parada e ofegante. A imagem desbotada da casa permanece em sua mente.
A garagem fica à direita. O portão, bege, está fechado. Um telhado amarronzado se apoia sobre tábuas e tijolos brancos. A porta da frente é de um marrom mais escuro. As janelas estão tapadas. Há um sótão.
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Caixa de Pássaros ∞ chae+lisa
Horror[descontinuada.] Basta uma olhadela para desencadear um impulso violento e incontrolável que acabará em suicídio. Ninguém é imune e ninguém sabe o que provoca essa reação nas pessoas. Cinco anos depois do surto ter começado, restaram poucos sobreviv...