Nineth Chapter: ❝Creatures❞

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Criaturas, pensa Rosé. Que palavra boba.

As crianças estão quietas, e as margens, silenciosas. Ela consegue ouvir os remos cortando a água. O ritmo das remadas está em sintonia com as batidas de seu coração, mas depois se perde. Quando as cadências se opõem, ela sente que poderia morrer.

Criaturas.

Rosé nunca gostou dessa palavra. De alguma forma parece errada. Acha que as coisas que a assombram há mais de quatro anos não são criaturas. Uma lesma de jardim é uma criatura. Um porco-espinho também. Mas o que se esgueirava por trás das janelas cobertas e a manteve vendada não é do tipo que um exterminador de pestes poderia matar.

"Bárbaro" também não é bom. Um bárbaro é imprudente. Assim como um brutamontes.

A distância, um pássaro canta, bem alto no céu. Os remos cortam a água, balançando a cada remada.

"Gigante" não se pode provar. Elas podem ser tão pequenas quanto uma unha.

Apesar de a família estar no início da jornada pelo rio, os músculos de Rosé doem de tanto remar. Sua camisa está encharcada de suor. Seus pés estão frios. A venda continua a irritá-la.

"Demônio." "Diabo." "Vampira." Talvez tudo isso.

A irmã dela morreu porque viu uma dessas coisas. Os pais devem ter encontrado o mesmo destino.

"Capeta" é bondoso demais. "Selvagem", humano demais.

Rosé não está só com medo das coisas que podem entrar no rio. Elas também a fascinam.

Será que sabem o que fazem? Será que querem fazer o que fazem?

Naquele instante, ela sente que o mundo inteiro está morto. Sente como se aquele barco a remo fosse o único lugar onde há vida humana. O resto do mundo se espalha a partir da ponta do barco, um mundo vazio, florescendo desabitado a cada remada.

Se não sabem o que fazem, não podem ser "vilões".

As crianças estão quietas há muito tempo. Ouve-se outro canto de pássaro no céu. Um peixe pula. Rosé nunca viu este rio. Como será que ele é? Será que as árvores ocupam as margens? As casas margeiam a costa?

São monstros, pensa Rosé. Mas ela sabe que são mais do que isso. São o infinito.

— Mamãe! — grita o Garoto de repente.

Uma ave de rapina grasna. O eco atravessa o rio.

— O que foi, Garoto?

— Parece um motor.

— O quê?

Rosé para de remar imediatamente. Ela ouve com atenção.

Ao longe, além do curso do rio, surge o som de um motor.

Rosé o reconhece no mesmo instante. É o barulho de outro barco se aproximando.

Em vez de ficar animada com a possibilidade de encontrar outro ser humano no rio, Rosé sente medo.

— Abaixem-se, vocês dois — ordena.

Ela deixa os remos descansarem em seus joelhos. O barco flutua.

O Garoto ouviu, diz a si mesma. O Garoto ouviu porque você o criou bem e agora ele escuta melhor do que jamais vai conseguir enxergar.

Respirando fundo, Rosé espera. O barulho do motor fica mais alto. O barco está viajando rio acima.

— Ai! — reclama o Garoto.

Caixa de Pássaros ∞ chae+lisaOnde histórias criam vida. Descubra agora