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Carol tinha tido pesadelos. Havia monstros em seus sonhos, e algum tipo de terror que a fez acordar com o coração palpitando. Mas, em seu sonho, ela não só corria e se escondia. Ela lutava. Dava tiros, machadadas... era confuso. Tinha sido vívido, mas ela já não se lembrava muito bem. O sonho ia se desvanecendo enquanto ela se acalmava, a respiração voltava a ser regular e ela ficava totalmente desperta. Olhou para o despertador na mesinha de cabeceira, faltavam apenas cinco minutos para às 7h --- horário em que ela geralmente acordava. Desativou o aparelho e se pôs de pé, dando uma checada rápida e habitual na cama ao lado. Sua irmãzinha, Sophia, dormia a sono solto. Talvez de modo inconsciente, ver Sophia dormindo bem e tranquila todos os dias ao se levantar era a motivação que Carol tinha para seguir com o dia. Ela se levantou e foi se aprontar para a escola.

Vestiu um jeans surrado e uma blusa bege, com um casaco cinza por cima. Suas roupas eram quase todas nesses tons, ornando com seus longos cabelos cinzentos. Originalmente loiros, como os de Sophia, ela os tinha pintado de cinza-grafite, mas agora já estava desbotado em vários pontos. Era o tributo silencioso de Carol à pessoa que ela mais admirava no mundo.

Pegou a mochila e, não sem antes dar uma olhadela para a cama de Sophia e conferir se ela estava mesmo dormindo, pegou rapidamente seu punhal debaixo do travesseiro, colocando-o por dentro da calça, no lado esquerdo do quadril. Ficava bem seguro ali, porque Carol tinha costurado uma fita de couro no cós de cada uma de suas calças, e agora já não se sentia completa saindo de casa sem aquilo. O punhal tinha um soco inglês no cabo, e Carol o escondia sob a blusa que estivesse usando.

Quando desceu para o café da manhã, surpreendeu-se com uma mulher de meia idade, magra, de cabelos totalmente grisalhos e olhos azuis e doces, na cozinha. Ela fazia panquecas ao fogão.

"Mãe? Pulou da cama", comentou Carol, procurando coisas no armário.

"É. Quer panquecas?", ela perguntou suavemente.

"Claro", disse Carol imediatamente. Tinha pensado em comer um ou dois cookies dos que ela própria tinha feito para vender para uma padaria do bairro. Sentou-se à mesa. "A que devo a honra de suas panquecas?", perguntou sorrindo. Já fazia um tempo que a mãe não cozinhava. Já fazia um tempo que ela não fazia mais uma porção de coisas, na verdade, sempre reclusa e silenciosa. Carol a observava de longe, sempre deixando que ela ficasse sozinha, se era o que ela queria.

"Eles vão querer todos os cookies", a mãe sorriu de volta. "É sério, assim que provarem..."

"Tomara", disse Carol, feliz por surpreender a mãe num dia feliz.

Quando ela terminou de fazê-las, as duas comeram as panquecas em silêncio.

*

Carol subiu no ônibus escolar já cheio, procurando com os olhos. A maioria das pessoas a ignorava.

Como de costume, a pessoa que ela procurava estava no fundo, com uma mochila no banco ao lado.

Quando a viu, a amiga tirou a mochila para que Carol pudesse sentar.

"Oi, Michonne."

"Oi, Carol", respondeu a garota negra de dreads e olhos muito brilhantes. Ao contrário de Carol, que quase se camuflava na paisagem, Michonne era vibrante e se destacava em todos os lugares. Também tinha uma personalidade mais reservada, entretanto, e as duas tinham poucos amigos.

Carol tirou um pacote pardo da mochila e ofereceu a Michonne com um gesto.

"Cookies? É claro que eu quero", disse a garota animada enquanto já enfiava um na boca.

"Pode comer tudo", disse Carol, sempre satisfeita que gostassem do que ela cozinhava. "Só não deixa o Glenn saber que eu não trouxe pra ele."

"Pode deixar."

Carol encostou a cabeça na janela, distraída, até se sobressaltar com algo. Estranhamente, seu coração pulou uma batida quando ouviu aquele barulho. Parecia familiar.

"O que foi?", perguntou Michonne, olhando para a janela de Carol.

O barulho --- o ronco esquisito de uma moto, que com certeza não era uma moto qualquer --- se aproximava. Carol ficou olhando enquanto ela passava, devagar ao lado do ônibus.

Um rapaz da mesma idade que ela a pilotava. Cabelos castanhos lisos na altura do queixo voavam ao redor do rosto de feições duras do garoto. Seus olhos apertados não miraram o ônibus escolar por um segundo sequer, e seus braços fortes, em uma camisa xadrez sem mangas (visivelmente as mangas tinham sido arrancadas), estavam esticados segurando o guidom projetado para a frente da moto antiga. Sua figura era alta e estranha. Sua pele clara era meio queimada de sol. Carol ficou olhando durante todo o tempo em que ele esteve em seu campo de visão, até sumir muitos metros à frente do ônibus.

"É o Dixon mais novo", alguém disse. Carol pensou ter percebido admiração ou desprezo na voz da pessoa.

Michonne percebera que a movimentação tinha atraído a atenção de Carol, então ela se viu disfarçando, mesmo sem saber o quê. Mexeu no cabelo. E de repente percebeu-se comentando:

"Esse cara é muito exibido."

"Pra mim ele parece mais tímido mesmo", Michonne deu de ombros. "Talvez uma mistura dos dois."

"É", Carol concordou, voltando a olhar para a estrada. É. Daryl Dixon estudava com ela há algum tempo, mas era uma completa incógnita. Na verdade, ele raramente ia à escola. E não é que Carol ficasse reparando nele ou coisa assim... é só que, vez ou outra, ele atraía sua atenção.

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