II

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Estava tudo escuro, mas no subconsciente ela ouvia:

-Ei, menina, garota! Ei, acorde! - a mesma freira da madrugada a acordou.

Depois de poucas palavras ditas a menininha acorda com a inchada. A mesma esfrega o olho e olha em volta com tudo esboçado.

-Ótimo, já que acordou, vá vestir suas vestes, está atrasada para a aula!

Alessa compreendeu e se dirigiu ao criado-mudo ao lado da cama. Se trocou sem mais ninguém no quarto, cheio de camas e criados mudos enfileirados pela grande sala, que no final tinha uma enorme janela com as cortinas amarradas por uma corda.

-Venha rápido. Á...não está esquecendo de nada? Você não está na sua casa, arrume essa cama rápido e venha logo. - a freira mais encorpada a chamou atenção enquanto vinha na direção da porta. Era nova também, uns 34 anos, baixa, bochechas em excesso e pele clara, não dava para ver o cabelo, estava escondido.

-Ótimo, agora venha, a Madre esta à sua espera. Já se deu o trabalho de aceitar uma mendiga, agora tende a se irritar com o atraso da própria.

As mulher gorda foi-se empurrando a garota pelas costas até uma sala no outro corredor de madeira à direita.

-Entre aí, a Madre está a sua espera. - a freira a direcionou e se afastou.

O ranger da porta assustava até a freira ansiosa por fora. Ao se abrir por completo, a sala mostrava uma velha desnutrida atrás de uma mesa retangular cheia de livros, crucifixos e papéis.

-Entre filhote, e feche a porta, há muitos bisbilhoteiros nesta casa. Não é Maria? Pode se retirar. - a velha aparentemente rabugenta chamou atenção da mulher gorda na porta.

-Claro senhora Madre Maior. - a mulher fez uma reverência e saiu pela direita.

-Muito bem Alessa. Pode me dizer seu nome completo? Ou só tem esse nome? - a velha ranzinza questionou a menina com o ar seco na voz e sua pele rugosa tornava ela mais assustadora.

-Fargelas Juller...Alessa. Meu nome é esse. - a menina cabisbaixa sentada a uma cadeira de madeira que rangia a cada pequeno balance que menina fazia.

-Tudo bem então. Olhe, aqui no orfanato temos regras, e nada de bruxaria aqui dentro. Ouviu filhote de bruxa?! - a velha se levantou e deu um tapa em perfeita sintonia com as duas mãos.

-Sim, senhora...Mas eu não tenho magia nenhuma. - a menina mentiu para que a velha achasse que ela fosse uma mortal humana qualquer.

-Então é inútil para realizar feitiços? - a menina se remexia de ranço dentro de si, mas não podia revelar. -Ótimo, um aborto mágico dentro do meu
órfanato, ou é melhor dizer que é uma renegada na bruxaria?...Então comecemos. Vá para sala de aula, a próxima porta azul seguindo a esquerda direto.

A menina caminhava seguida a olhares de ódio da Madre, mal chegou a porta e a velha lançou a frase:

-E mais uma coisa, mais ninguém desse orfanato sabe que você é uma filhote de bruxa, se perguntarem dira que é uma perdida da floresta. Vá, vá!
A garota seguia as instruções da velha, como ela disse, seguir o corredor a esquerda e ir para porta azul.

Ela bateu na porta, ninguém apareceu, bateu novamente, uma mulher nova apareceu na porta com um giz a mão. Sua pele era mais branca que qualquer tom de branco, parecia não conhecer o sol. Seus olhos eram verdes claros, bem claros, não dava para ver qual a cor de seus cabelos, pois um tipo de chapéu de cor preta e branca cobria eles.

-Olá menina, bem-vinda ao órfanato, lembra de mim? Fui eu quem te recebeu no portão essa manhã, bem manhã mesmo. Que modos os meu, entre. - a mulher viu a garotinha entrar e fechou a porta. -Por favor silêncio turma... - a turma se calou -Obrigada. Essa é a Alessa, nova colega de vocês todos. Quantos anos você tem Alessa? - a mulher se abaixou e perguntou no ouvido dela.

-12. - ela sussurrou no ouvido da mulher abaixada.

-Ótimo. Pode se sentar nessa primeira carteira aqui.

A menina foi...Se sentou, e só observou o resto da aula. Até que um acontecimento inesperado resultou em uma longa saida dela da sala de aula e...No resto do dia.

-Como consegue explicar esse cabelo azul senhorita Juller? E ainda tem a pouca vergonha de dizer que não tem magia no sangue. É uma hipócrita nata, igual a mãe.

-Desculpe, mas a senhora conheceu minha mãe? - a menina sem informações o bastante a perguntou.

A velha ficou em silêncio um pouco olhando para um quadro vazio em branco na parede.

-Pode ir para seu dormitório filhote de bruxa. E não ouse omitir mais nada! N-a-d-a. Mais nada, já estourou sua cota de mentiras neste orfanato. E não ouse fazer mais nenhuma gracinha, está entendido Alessa Juller? Não saia da lá, entendido?
-Sim senhora Madre...Maior?

-Ora, não faça esse tom de incerteza, afirme e não pergunte. Menina estúpida.

-Desculpe senhora, obrigado senhora, Madre Maior.

A menina saiu daquela sala com mais confiança e menos da insegurança que a acompanhou na chegada. Alessa seguiu o mesmo caminho que tinha seguido antes quando seguiu a freira gorda. Ficou encolhida na cama, com a pernas encostadas no queixo, lembrando da mãe, o grito dela caindo do penhasco, ela só sabia que era doloroso relembrar, tudo aquilo, acontecendo tão rápido e devagar ao mesmo tempo, ela encarava o por do sol como se fosse a coisa mais linda que viu nos últimos anos de vida. De repente chega a freira da madrugada, a que havia recebido a garota no orfanato.

-Oi...Tudo bem com você? Está bem mesmo? - ela viu a menina fazer gesto positivo com a cabeça. -Ufa...Que ótimo... Que lindo seu cabelo, mas...Assim se não quiser me responder tudo bem, mas é que assim...Eu fiquei curiosa na questão do cabelo ficar azul do nada, você pode me dizer como fez aquilo? - a freira acanhada com a pergunta vê que não foi prudente.

-Não sei também, senti um sentimento bom e ele ficou assim. Não sei exatamente o por quê.

-Á...Entendo. Podemos ser amigas?

-Bom...Assim tão rápido? Eu não pensei que fosse assim.

-Nossa...Besta eu, desculpa, pode ser no seu tempo. Irei esperar, mas até quando exatamente? Não, espera, você determina seu tempo, eu não preciso saber, tudo bem?

-Hahaha... - ela riu exageradamente -Você é engraçada. Podemos sim. Tudo bem sim amiga.

As duas deram um sorriso um para a outra. A freira se foi pela porta, sem olhar para trás e deixou a menina sozinha ao meio das camas vazias e olhando o vazio e as estrelas que o sol deixou.

Filha Da VingançaOnde histórias criam vida. Descubra agora