Cap 63. Lounge act

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Ainda passei mais dois dias em Nova York. Liguei o celular apenas pra pedir a Vero que cuidasse do Paçoca. Não sai do quarto em nenhum momento, não fazia diferença em que lugar do mundo eu estava. Chorei algumas horas e em outras bebi. Senti raiva de Camila, do mundo e de mim mesma. Me arrependi de ter mentido, de ter ido a Nova York, de ter deixado o apartamento de Camila, de ter implorado e de não ter feito isso com mais persistência.

Camila tinha razão em descrever aquilo como um erro. Não que tudo entre nós tivesse sido um erro, mas os últimos dias definitivamente foram. Eu pensava em pedir desculpas, em mandar flores ou fazer serenata, mas acabava desistindo quando lembrava o quão decidida ela parecia estar.

Talvez um tempo fizesse tudo ficar bem, embora eu não conseguisse imaginar como. Eu não podia fugir pela vida inteira, ficar trancada num quarto sem falar com ninguém. Teria que arrumar a bagunça em que eu me encontrava e começaria pela parte aparentemente mais fácil.

Voltei pra casa e primeira coisa que fiz foi procurar Vero e avisar que assumiria a presidência da Construtora, mas que queria integrar a J+I ao grupo. A empresa maior ficaria com toda a parte de engenharia e o escritório se especializaria na arquitetura, podendo fazer projetos em conjunto, como sempre, ou independentes.

Debatemos por alguns dias a minha proposta, mas acabamos nos acertando. Não falamos de Camila em nenhum momento, deixei bem claro que o assunto estava vetado e a ela só restou aceitar minha imposição. Depois falei com o Matos, eu precisava de alguém que eu confiasse de verdade trabalhando comigo. Ele aceitou imediatamente meu convite.

Quando comuniquei minha decisão aos meus irmãos, senti que eles receberam a noticia com alívio. Mesmo que eles tivessem me deixado a vontade pra fazer o que eu quisesse, eu sabia que eles não queriam vender a empresa.

E por fim, me reuni com o Conselho e assumi o cargo que meu pai ocupou por toda a vida. Eu não estava preparada pra pressão que veio a seguir, mas dessa vez não poderia fugir da responsabilidade. De certa forma, foi bem vindo, pois me restava pouquíssimo tempo pra pensar no quanto eu me sentia mais triste e perdida a cada dia.

Eu proibi todos de falar comigo sobre Camila, pedi Maria que empacotasse as coisas dela e tudo, mas não cheguei a mandar pra lugar nenhum. Talvez no fundo eu tinha esperança que ela ligasse algum dia atrás do que tinha deixado e isso ajudasse com o nosso recomeço.

Eu não acreditava de verdade no nosso fim, mas os dias se passavam e a angustia me paralisava, ao invés de me impulsionar a ter alguma atitude. Não cheguei a ligar pra ela, por não saber o que falar. Mas tinha dias que eu só queria ouvir sua voz, me dizendo qualquer coisa que fosse.

As semanas iam passando sem que eu soubesse realmente diferenciar uma da outra. Era como se tudo fosse cinza e sem vibração.

Taylor recebeu a noticia de sua aprovação em medicina no fim de suas férias. Voltou a morar comigo e perguntou se podia participar das decisões a respeito a reforma da nossa casa. Eu queria dizer que não via mais sentido em dar continuidade a esse plano, mas não tive coragem. Ela parecia muito feliz com a possibilidade de voltar pra lá, então autorizei o começo da reforma.

Chris passou a vir com mais frequência e eu o deixava a par de tudo da construtora, o lugar que ele ocuparia na empresa quando se formasse já estava definido.

A bagunça começava a se organizar aparentemente. Mas essas coisas enganam,  na minha cabeça tudo continuava fora de ordem. Eu já não saia com minhas amigas, preferia beber sozinha e sossegada em algum canto. Eu tinha medo de me tornar emotiva demais perto delas, começar a desabafar ou a chorar. Eu sabia que quando eu chorasse, seria o choro mais triste do mundo.

A sensação de ter a felicidade escorrendo pelos meus dedos, não era inédita. Isso já tinha acontecido antes, da pior maneira possível. Mas junto a ela, dessa vez, estava a sensação horrível de ter consciência de que a culpa tinha sido minha.

A felicidade não tinha escorrido pelos meus dedos, na verdade eu tinha a atirado pela janela.

Alexa ficava sempre rondando, mas eu tentei manter alguma dignidade e não me aproveitei do que ela sentia por mim. Em algumas noites que eu saia sozinha, o álcool até me dava coragem pra ficar com outras pessoas, mas eu nunca conseguia lembrar de nomes ou rostos no outro dia. Isso me fazia sentir pior do que já estava, então não tentei mais nada com ninguém.

Sem notícias de Camila, eu só conseguia imaginar como ela estaria, esperava que tudo estivesse ido bem no mestrado e quanto ao resto eu preferia não pensar. Imaginar elas com outras pessoas me enchia de raiva, que aumentava quando me dava conta de que eu não tinha o direito de sentir, e que se tornava insuportável quando eu lembrava novamente da minha parcela de culpa nisso.

Eu mantinha a armadura, apesar de tudo. Indo ao trabalho, fazendo minhas obrigações, passeando com o Paçoca, jantando com Taylor e bebendo sozinha quando não estava fazendo nada disso. Achava que as outras pessoas não notavam e dava um jeito de garantir que não diriam nada caso notassem. Não abra nenhum espaço pra qualquer tipo de questionamento e isso era algo que sempre soube fazer bem a vida inteira.

Até o dia em que eu tentava voltar pra casa dirigindo apesar de ter bebido demais pra isso. Bati o carro em cheio num muro e fui salva pelo Air bag. Por algum motivo divino, minha velocidade não estava alta demais e eu apenas fraturei a clavícula.

Quando eu vi minha irmã mais nova chegando desesperada no hospital atrás de noticias, eu senti vergonha. Muita vergonha. Ela constatou que eu estava bem e viva, e com lágrimas nos olhos perguntou com uma pena na voz que me doeu mais que tudo.

- O que você está fazendo da sua vida, Lauren?

Eu não fazia a mínima ideia. 

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