Cobra

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A manhã veio gélida, respirei fundo, pensei duas vezes se realmente eu queria sair da cama e encarar um dia de trabalho.

Levantei, tomei um copo de suco logo após um banho rápido. Algo estava errado, eu não tinha vontade de sair, ou de fazer qualquer coisa. Sentei no sofá e pensei no que poderia me ajudar.

No celular havia uma mensagem da Liz "já estou em casa, cheguei bem, demorei a dormir pensando na nossa noite, espero que a distancia não nos atrapalhe, bom dia Caio".

Gostei da mensagem, me mostrava que ela realmente se importava. Busquei uma música no meu celular, não sei o motivo, mas coloquei "Don't stop believin" do Journey, era estranho, mas algo em mim queria realmente não deixar de acreditar.

Com um pouco mais de coragem, busquei uma outra música e fiquei mais tranquilo ouvindo "The last pale light in the west" do Ben Nichols.

Sai porta a fora para encarar o vento frio que trazia algumas gotas de chuva. Abri a livraria, organizei tudo, como de costume e atendi os poucos clientes que ousaram encarar o tempo frio. O estranho foi perceber que o Seu Chico não havia chegado, já era quase meio dia.

Tentei entrar em contato, mas não tive sucesso. No meu horário de almoço, procurei um local onde pude ficar sozinho, tentei ligar para a minha querida Liz, mas ela não pôde atender. "quando puder falar me avisa, estou com saudades" digitei, mas não enviei. Encarei a mensagem, editei e enviei "quando puder falar me avisa, quero saber como você está, até mais".

Tentei falar com o Marcos,  mas ele rejeitou todas as minhas ligações, me mandou uma mensagem dizendo que queria me contar uma novidade, respondi dizendo que já sabia e perguntando sobre a Sofia, tudo o que ele me disse foi que ela entendeu que não daria certo e não ficou chateada por ele ter terminado por celular.

Me senti cansado, mesmo não tendo feito nada demais o dia todo, busquei uma outra música, desta vez, "Can't fight this feeling" do Reo Speedwagon, por favor, não me leve a mal, eu só realmente gosto dos clássicos, talvez eu só não tenha um gosto musical dos jovens de hoje em dia.

Cochilei durante essa minha pausa, tive um sonho curto, sonhei que uma cobra me observava, eu tentava hipnotiza-lá, mas ela me atacava, no momento do ataque eu acordei, sabia que não era algo legal. Não sou desses que acredita que os sonhos tem significados, acredito que são apenas pensamentos e desejos, coisas do dia a dia que ficam na mente e em algum momento durante um descanso, esses pensamentos se unem com a imaginação e forma o sonho, algo tão natural como um bater de asas de uma borboleta, mas eu não podia negar, sonhar com cobra era sempre um mal presságio. Minha mãe acreditava nessas coisas, eu sempre pensei que era besteira, mas sempre que ela sonhava com água, coisas ruins aconteciam, então, acabei ligando os pontos e descobrir que quando eu sonhava com cobra, algo ruim acontecia, mesmo eu não acreditando nisso.

A tarde passou lentamente, não chovia, mas o céu estava cinzento e aquela sensação de que algo estava errado.

Já próximo ao fim da tarde meu telefone toca, eu sabia, era algo ruim.

Era uma enfermeira, que a pedido do Seu Chico estava ligando para avisar o ocorrido.

Ao que pude entender, Seu Chico sentiu dores forte no peito durante a madrugada, acabou pegando no sono, mas acordou desesperado passando mal e passou o dia inteiro fazendo exames e por fim, ficou internado para ficar sob cuidados médicos.

Levei um tempo para captar tudo aquilo, perguntei quando poderia ir visita-lo, mas ela me informou que, até segunda ordem, ninguém pode interromper o seu descanso.

Finalmente eu soube, eu já esperava. Avisei para todos os funcionários. Todos em choque. Todos em silêncio. Alguns choraram. Eu apenas me calei.

Aos poucos cada um de nós seguimos porta a fora. Todos sentidos, sem dúvidas, ele é mais que um patrão.

Fui o último a sair, demorei para perceber que chovia forte, eu já estava totalmente molhado, os pensamentos eram muitos, aquele velho campo minado.

Ao chegar em casa, fui direto ao banheiro, um longo banho, dessa vez o silêncio era a única canção do local. Meu celular tocava, não queria atender, mas atendi.

— Oi — a voz meiga da Eliza cortava o silêncio inicial da ligação — meu dia foi bem corrido, como você está?

— Eu... — pensei duas vezes — tudo normal...

— Sua voz está estranha... Você está chateado comigo?

— Não... Meu amigo... Meu patrão está no hospital... Eu acho que... — as lágrimas caíram tão dementes quanto um raio — eu acho que...

— Calma Caio — eu sentia que ela queria me ajudar, sua voz mudou — vai ficar tudo bem, me diz o que aconteceu.

— Ele... Sentiu dores no peito.

— Ah, meu bem, não fica assim, não adianta se preocupar antes da hora, ele fez exames?

— Sim, não me deixaram ir até lá, falaram que ele tem que descansar... Isso é ruim.

— Às vezes é só precaução, Caio.

— Falaram isso antes... — exitei — antes da minha irmã morrer...

O silêncio se instalou novamente, ela juntava as peças enquanto se recuperava da informação.

— Foi isso... A data ruim... Caio, eu sinto muito, eu quero te ajudar, mas precisa me contar, nossa... Eu queria estar ai.

— Eu sei o que vai acontecer.

— Não tem como saber, Caio.

— Preciso desligar...

— Não quero te deixar sozinho.

— Eu preciso...

— Promete que me liga se algo.. Se precisar, promete?

— Não precisa...

— Se gosta de mim — ele interrompe — você vai me ligar, certo?

— Tudo bem...

— Se cuida, Caio.

— Até mais, Liz.

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⏰ Última atualização: Dec 14, 2017 ⏰

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