— Mariah não podia ter feito isso! Jo Calloway entrou na cozinha como um furacão, com os olhos verdes soltando faíscas e o tom de voz tão inflamado quanto o brilho de seus cabelos ruivos. As duas mulheres que lá estavam voltaram-se para ela. Tess Calloway afastou-se da janela, onde ficara obser-vando a tarde fria de dezembro, e Éden Calloway interrom¬peu por um instante o trabalho quase mecânico de preparar sanduíches. — É bem próprio de Mariah faltar ao enterro de papai! — Jo prosseguiu. A lembrança das quase duas horas de espera antes da decisão de continuar a cerimônia mesmo sem a presença de uma das filhas ainda a deixava furiosa. — Parece que só há aviões para chegar a Monte Cario, não para sair de lá.
— Riviera — Tess a corrigiu. — Mariah estava na Riviera.
— Monte Cario, Riviera, St. Moritz, que diferença faz? Nós a avisamos há dois dias. E capaz de já estar aprontando maluquices em algum outro lugar. Mariah tinha dinheiro para a passagem, não tinha?
— Eu me ofereci para pagar, mas ela disse que não precisava — comentou Éden. A mais velha das irmãs Calloway ergueu os olhos dos sanduíches, preocupada.
— Será que aconteceu alguma coisa? Deve estar brincando!— Jo exclamou, sarcástica. — Aconteceu alguma coisa a ela quando resolveu saltar de pára-quedas? E quando escalou uma montanha ou desceu o rio Snake num caiaque? Por acaso se machucou fazendo caça sub¬marina, dirigindo motocicleta em alta velocidade ou partici¬pando de corridas de automóvel? Ei, Éden, por que usa pão branco? Os aditivos vão acabar matando você. Isso se esse presunto cheio de colesterol não a levar primeiro. Os sanduí¬ches ficam muito mais gostosos e nutritivos com pão integral, cenoura, brotos de feijão...
— Sei que ela nunca se machucou, mas sempre pode haver uma primeira vez
— Éden respondeu. — E não estou muito disposta a defender à causa dos naturalistas.
— Ela ainda vai chegar — Tess contemporizou, em seu tom tipicamente tranqüilo. — Se Mariah prometeu vir para casa, tenho certeza de que é isso o que fará.
A casa da família localizava-se em Calloway Corners, um vilarejo com meia dúzia de ruas de terra no nordeste do Estado da Louisiana que ficava a cerca de quatro quilô¬metros da pequena cidade de Haughton e não constava de nenhum mapa. Além da residência dos Calloway, construída com uma estrutura simples de vigas de madeira brancas e uma varanda à frente, os outros prédios importantes eram uma madeireira, também da família, e o mercadinho de Dan Morgan, que vendia de tudo, de leite e pão a pregos e pa-rafusos. Alguns dos moradores mais antigos lembravam-se de quando Ben Calloway comprara as terras, uns cinqüenta anos antes. Era um rapaz de vinte e cinco anos, com muitos sonhos e pouco dinheiro. Com o suor de seu rosto, construíra a madei¬reira, que prosperara e tornara o nome Calloway respeitado na região. Vivera sozinho em suas terras até os quarenta anos de idade. Nessa época, porém, o solteirão Ben Calloway co¬nheceu a jovem e alegre Grace Whitaker, que viera naquela primavera de St. Louis para visitar uma prima em Haughton. Em duas semanas estavam casados. Ben recebeu a esposa em sua casa e lá os dois viveram e se amaram durante os dez anos seguintes, até que Grace morreu ao dar à luz sua quarta filha. Muitos dos antigos moradores afirmavam que Ben Calloway, na verdade, também deixara de viver naquele dia, em¬bora seu corpo abatido continuasse a se mover pelas ruas poei¬rentas do vilarejo.
As filhas de Ben e Grace Calloway eram tão diferentes quanto as quatro estações do ano. Éden, aos trinta e três anos, era a mais velha e, por natureza e circunstâncias, assumira um papel maternal e fora a única das irmãs a permanecer em Cal¬loway Corners. Ainda morava no velho lar da família, ajudando na madeireira e cuidando das crianças da vizinhança para ganhar um dinheiro extra. Com trinta anos, a explosiva Jo morava em Baton Rouge. Trabalhava num comitê político e vivia se engajando em lutas por qualquer causa que achasse justa. Tess, ao contrário da extrovertida Jo, era uma profes-sora primária sensível e doce de vinte e nove anos que mo¬rava em Dallas e aguardava o final de seu processo de di¬vórcio do marido Vance Langford. E havia Mariah, a mais nova, vinte e cinco anos, a viajante aventureira, a filha pró¬diga. Mariah, a moça rebelde e imprevisível que faltara ao enterro do pai. — Vai ser estranho não ver papai no jardim nesta primavera
— Tess comentou, fitando uma vez mais o pátio arborizado nos fundos da casa.
A esquerda havia um caramanchão de madeira branca, com seus espaços hexagonais despidos de plantas por causa do in¬verno. O banco onde Ben Calloway costumava sentar-se pa¬recia mais vazio do que nunca. Até mesmo o riacho próximo, com a pequena ponte vermelha sobre as águas límpidas, es-coava com uma reverente quietude. — É verdade — Jo concordou. — Ele adorava sentar ali para admirar as flores.
— Lembro que ele e mamãe sentavam-se naquele banco todo fim de tarde, quando o tempo estava bom — Éden re¬cordou com tristeza.
— Vou sentir falta dele. — Para Tess, a morte do pai fora duplamente dolorosa, por ter vindo logo em seguida ao fracasso de seu casamento.
— Eu também — admitiu a corajosa Jo.
— A casa vai ficar muita vazia sem ele. — Éden não se preocupou em evitar as lágrimas, enquanto continuava prepa¬rando sanduíches.
De repente, a porta da cozinha se abriu, deixando passar o som abafado de vozes conversando. Mas quem entrou foi o reverendo Ford Dunning.
— Tudo bem por aqui?O fato de aquele psicólogo convertido em pastor protestante não ter aparência muito convencional para um religioso já era bem aceito na pequena comunidade. O resto do mundo, porém, costumava ter problemas para associar aquele homem que ofi¬ciava um enterro vestindo jeans e casaco esporte com a função por ele exercida. Ou, para ser mais preciso, como ele podia ser um mensageiro de Deus com aqueles cabelos escuros como o pecado, os olhos da cor de uísque e um corpo atlético que até Satã teria cobiçado?
— Sim — as três mulheres responderam, entre soluços e fungadelas.
— Você podia tirar Éden daqui? — Jo pediu. — Ela está fazendo sanduíches para alimentar um exército. Ford Dunning colocou a mão no braço de Éden.
— As pessoas estão na sala para expressar solidariedade e não para comer.
— Mas... — Nada de mas — Ford insistiu, empurrando-a para a porta.
Não conseguiu evitar, porém, que ela pegasse a bandeja de sanduíches na passagem.
— Não venha com palavras doces para cima de mim, Ford Dunning.
— Não se preocupe, Éden querida. Já a conheço bem. Al¬guma notícia de Mariah?
— Não.
— Ela vai chegar — afirmou a otimista Tess.
— Espero que nada tenha lhe acontecido — Éden mur¬murou.
— Nada aconteceu. Mariah é à prova de acidentes. — A voz de Jo era firme como sempre, mas abaixo da superfície havia também um leve traço de preocupação. Ela, evidente¬mente, jamais admitiria isso.
O táxi seguia pelas alamedas rústicas do cemitério. O mo¬torista, um homem com idade suficiente para já ter visto de tudo no mundo, não se surpreendia mais com sua passageira e parará de perguntar-lhe sobre seu destino. Apenas deixava o taxímetro rodar, marcando o que sem dúvida se tornaria uma das corridas mais caras que já fizera na vida. A estranha odisséia começara no Aeroporto Regional Shreveport, prosseguira através da cidade de Shreveport e, depois, Bossier City, às margens do rio Vermelho. Dali, continuaram até Haughton, onde a moça insistira para que ele rodasse pelas poucas ruas, como se estas lhe trouxessem preciosas recordações. Ela também lhe pedira para parar numa floricultura que já estava fechando. O proprietário abri¬ra as portas de novo para vender-lhe uma única rosa ver¬melha. Agora, circulavam ínterminavelmente pelo Cemitério Hill Crest, procurando sabia-se lá o quê.
— Aqui — falou a moça de repente, tão baixinho que o motorista não teve certeza se era a voz dela ou o murmúrio do vento. — Pare aqui. O motorista brecou o carro. A mulher, vestida com calça preta de couro, um suéter vermelho de gola alta, botas pretas de salto alto e um comprido casaco de pele negra por cima, pegou a rosa, abriu a porta e saiu. Seus olhos verdes, escondidos atrás de óculos escuros apesar da tarde que se aproximava do fim, voltaram-se imediatamente para o monte de terra recém-revolvido à sua esquerda. O vento frio agitava-lhe os cabelos loiríssimos que desciam até pouco abaixo dos ombros em ondas volumosas e estavam presos por um lenço vermelho, da mesma cor do batom que lhe coloria os lábios carnudos. Um par de longos brincos balançava ao lado de outros dois pequenos de diamante e ouro, perfazendo um total de três brincos em cada orelha. A mulher estremeceu à visão do túmulo que acabara de ser coberto.
— Espere por mim — pediu ao motorista, antes de avançar sobre a grama ressecada pelo inverno.
— Claro, moça. E o seu dinheiro. — O homem sacudiu a cabeça, incrédulo, ao notar que sua passageira, com uma con¬fiança quase infantil, deixara a bolsa no banco de trás. Confiança, porém, era algo que nem passava pela cabeça daquela mulher naquele momento. Cada passo, suas mãos tre¬miam mais e a respiração ficava mais curta. Apertou a rosa para não deixá-la cair, ignorando a dor de um espinho.
Confrontar a morte era sempre assim para Mariah Calloway. Era como vivenciar o pesadelo mais horroroso, como fitar as presas da mais terrível das feras, como enfrentar o mais gélido dos ventos. De repente, um pensamento lhe veio à cabeça. Teria perdido de propósito a conexão no aeroporto de Atlanta, para não estar presente ao funeral?Enterros eram rituais tão deprimentes! Tão cheios de dor pela perda do ente querido, mas ao mesmo tempo permeados de um silencioso alívio por não ter sido ainda a nossa vez de jazer sob a lápide fria. Mariah sempre tivera pavor da morte. E, desde criança, ja¬mais conseguira afastar o pressentimento de que também mor¬reria jovem, como sua mãe. Parou diante do túmulo. Sobre a terra inchada, havia uma linda coroa de flores silvestres. Mariah inclinou-se e leu o cartão: "A família". A família... Éden, Jo, Tess e Mariah. Essa era toda a família, e todas estiveram ali naquela tarde, para ver Ben Calloway iniciar sua viagem à eternidade. Todas ex¬ceto ela... Que percorria o mundo como o vento... que deliberadamente perdera o avião... Que não tivera coragem de en¬frentar um enterro. Nem mesmo do próprio pai. De repente, sentiu uma vontade desesperada de chorar, mas fez um esforço para conter as lágrimas. Passara a vida chorando em silêncio por seu pai e não adiantaria nada acrescentar mais alguns soluços a todos os demais. Para que lembrar que ele sempre a abraçara menos do que a suas irmãs? Para que re-cordar as vezes em que o pegara olhando para ela como se estivesse vendo uma outra pessoa?Mariah dirigiu o olhar para o túmulo vizinho, onde repou¬sava sua mãe, e a dor logo se transformou em culpa. Era uma emoção que sempre a acompanhava. Se não fosse por causa dela, sua mãe não teria morrido. Ben Calloway também pen¬sava assim, e não fizera a menor questão de disfarçar. — Oi, mamãe — murmurou, para a mulher que nunca havia conhecido, apesar de ter-lhe herdado o nome. Sem dúvida, a decisão de batizá-la como Mariah Grace fora uma tentativa desesperada de seu pai para preservar o mais que pudesse da mulher que amava tanto. Mas ela não conseguira ser sua amada Grace, por mais que se esforçasse. Assim como, por mais que tentasse, Ben Calloway parecia não ter sido capaz de* amar a filha mais nova.
— Adeus, papai. — Mariah colocou a rosa vermelha sobre o túmulo. — Sinto muito por não ter conseguido ser ela. O aroma pungente do solo recém-escavado ao mesmo tempo a repelia e atraía. Mariah abaixou-se e pegou um punhado de terra úmida, fria, pesada. Tinha cheiro de morte. Apesar do frio, sentia gotas de suor formarem-se na testa. Largou a terra e correu para o táxi, batendo a porta com um estrondo que ressoou no silencioso fim de tarde.
— Vamos embora. Eu lhe darei dez dólares a mais se sair daqui depressa.
— Claro. — O motorista pôs o carro em movimento. — Para onde?
— Para o Midnight Hour. — Mariah tirou os óculos escuros e enfiou a mão na enorme bolsa preta.
— Não sei onde...
— É um bar na rua principal. Pelo menos costumava ser. — Mariah abriu um estojo de pó compacto, examinou sua imagem no espelho e caçou o tubo de batom dentro da bolsa. Aplicou uma camada vermelha nos lábios e tornou a guardar seus apetrechos, enquanto, com a outra mão, ajeitava os ca¬belos. — Como é o seu nome?
— Harvey.
— Já sei o que vou fazer, Harvey. Vou lhe pagar um drinque por ter sido tão simpático. Isto é, se Duke Boyd não tiver fechado o bar. — Mariah borrifou um perfume adocicado nos pulsos e pescoço. — Você é daqui mesmo, Harvey?
— Não. Sou de Milwaukee.
— Ah, é? Já estive lá uma vez. Na verdade, já estive uma vez em todos os lugares, em alguns deles duas vezes. Cerveja, não é?
— Como?
— Cerveja. É o cheiro que se sente por todas as ruas de Milwaukee. A gente pode se embebedar só respirando. Acon¬tece a mesma coisa em algumas das cidadezinhas vinícolas no interior da França. E há uma aldeia na Alemanha que deixa a gente tonta! Costuma voltar lá com freqüência? O motorista teve que pensar antes de compreender que ela se referia a Milwaukee.
— Não, não tanto quanto... — É odioso quando mudam as coisas enquanto a gente está fora, não é? É muito ousadia das cidades natais. Será que elas não sabem que é sua obrigação permanecer do jeito como as deixamos? Faz dois anos que não venho para cá, e tudo está diferente. Tudo. — Por um breve momento, Ma¬riah sentiu vontade de chorar. Mas, como sempre fazia nessas situações, começou a rir. — Ei, mas a vida continua, não é, Harvey?— É o que dizem. — E se eles dizem, deve ser verdade. Sempre fiquei ima¬ginando quem seriam esses eles que dizem tanta coisa. Tenho uma teoria. Deve ser um comitê especial selecionado por Deus. Ou por Buda, Alá, HareKrishna, dependendo de suas prefe¬rências religiosas, claro. Esse comitê deve variar de um país para outro, mas o presidente aqui nos Estados Unidos é o Pato Donald. — Se você diz... — O motorista riu. — Não importa o que eu digo. O que conta é o que dizem. — De repente, Mariah perguntou-se o que diriam sobre uma menina que às vezes comportava-se mal de propósito para chamar a atenção do pai. Ou sobre uma jovem que ainda se sentia em muitos aspectos como aquela menininha. Foi com alívio pela interrupção que se inclinou para a frente e apontou com uma das longas unhas vermelhas. — É ali! Ora, vejam só: o velho Duke Boyd ainda está a todo o vapor. O néon diante do bar brilhava convidativo. O táxi parou e Mariah desceu em seguida. — Vamos, eu lhe pago um drinque. — Não posso, vou continuar trabalhando.
— Vamos, Harvey. Só uma cerveja.
— Outro dia — o homem respondeu, rindo.
— Vou cobrar, hein? — Mariah procurou na bolsa, como sempre com dificuldade para encontrar o que queria. Por fim, tirou uma carteira. — Quanto é?
Ela assobiou ao ouvir a elevada soma apresentada pelo mo¬torista.
— Vai lhe causar algum problema? — Harvey indagou, parecendo mais um amigo do que um motorista de táxi que ela acabara de conhecer.
— Não. — Mariah entregou-lhe a quantia devida e mais os dez dólares que lhe havia prometido. — É apenas dinheiro. E ainda tenho... — Ela contou as moedas e notas que lhe restavam. — Tenho mais vinte e dois dólares e dezoito cen¬tavos.
O fato de estar com pouco dinheiro não incomodava Mariah. Não acreditava que essa fosse a origem dos problemas. A verdade era que nunca havia ficado num emprego por mais de alguns meses; nunca permanecera em alguma cidade por tempo suficiente. O dinheiro era simplesmente um meio de pular de um lugar excitante para outro. No início, quando o dinheiro faltava, trabalhava em qualquer coisa que aparecesse, mas logo descobriu que seria melhor ter alguma especialização. Começou um curso de datilografia, mas era tão atrapalhada que desistiu na primeira semana. Por fim, sentiu-se melhor adaptada a duas funções: atendente de bar e croupier. Parecia que, no mundo inteiro, sempre haveria alguém querendo beber e ou tentar a sorte no jogo.
— Comporte-se! — Harvey aconselhou, em despedida. Ela virou-se e sorriu.
— Não posso, Harvey. Não seria nem um pouco divertido. Mariah entrou no Midnight Hour. As luzes fracas apenas quebravam a escuridão, enquanto incessantes vozes e risos misturavam-se aos sons de máquinas de diversões eletrônicas e da música de fita. O ambiente alegre logo agasalhou seu espírito deprimido. Ajustou a vista à obscuridade e notou uma pequena árvore de Natal num canto, piscando suas lâmpadas coloridas. O homem atrás do balcão, com sua constituição robusta e o bigode loiro sobre a boca sorridente, parecia to¬talmente à vontade naquela confusão. Mariah sorriu e caminhou até ele, sem reparar que metade das mulheres e todos os homens a observavam desde que entrara no bar.
— E aí, colega — cumprimentou, com o quadril num ângulo sensual e a voz um pouco rouca. — Tem beijado muitas ga¬rotas?
— Ora, vejam: Mariah Calloway voltou! — E ele limpou as mãos no avental manchado, deu a volta no balcão e recebeu-a com um forte abraço. — Por onde tem andado, garota?— Por aí. Como era bom estar com alguém conhecido! Convivera com Duke Boyd desde o segundo ano da escola, quando a família dele mudara-se de Springhill para Haughton. Como de hábito em cidades muito pequenas, todo mundo sabia um da vida do outro e, portanto, era do conhecimento público que Duke Boyd tinha dado a Mariah Calloway seu primeiro beijo. Atrás da gangorra do colégio, quando ambos tinham oito anos. Duke agora reservava todos os beijos para a esposa Patti, que fora 'V a melhor amiga de Mariah no colégio.
— Mas você está ótima!— Você também.
— Mentirosa. Preciso perder uns dez quilos. Estou be¬bendo mais cerveja do que consigo eliminar. — Ele parou de sorrir de repente e a fitou com simpatia. — Sinto muito pelo seu pai.
— E, eu sei. — Como sempre, Mariah logo deu a volta por cima da tristeza. — Ouça, será que uma garota pode beber aqui?
— Claro. — Duke voltou para trás do balcão. Mariah tirou o casaco de pele e colocou-o no banco a seu lado. — O que vai querer?
— Vodca. — Desde quando você toma bebidas fortes? — Outro fato de conhecimento geral era que Mariah não punha na bocas bebidas de forte teor alcoólico. "Desde que perdi um pai que nem percebia minha existência. Desde que perdi um pai que teria preferido outra pessoa em meu lugar."
— E que... Hoje fiquei com vontade. Certo?
O proprietário do Midnight Hour observou por um instante o rosto subitamente triste e sério da amiga antes de servir-lhe o drinque.
— Vá com calma, certo?
— Esse é o problema com a vida. Conselhos conflitantes. Você me diz para ir com calma e Thomas me manda não perder tempo. Ei, você já esteve em St. Thomas?
— St. Thomas? Mas...
— É uma ilha no Caribe. Tão luminosa! Parece as jóias da coroa à noite. — Ela tomou um gole de vodca e fez uma careta. — Ah, a noite é uma beleza lá. Não seria nada fácil ir com calma.
— Mariah, do que você está falando, afinal?
— Da morte, claro. Do que achou que estávamos fa¬lando?Antes que Duke pudesse responder, ela levantou do banco e dirigiu-se à máquina de música. O rapaz sacudiu a cabeça. Mariah estava de volta. í E encontrava-se em ótima forma. Com seu comportamento excitantemente imprevisível e meio aloucado, atraía a atenção de todos, em especial dos homens. "Venha, vamos dançar", ela diria a um, depois riria e o deixaria no meio da pista para jogar fliperama com outro. En¬tão, de repente, largaria o jogo para cantar desafinada a música que estivesse tocando. Tinha uma maneira charmosa de res¬ponder com perguntas. "De onde você é?" "Por que tenho que ser de algum lugar?" E parecia nunca saber onde as coisas estavam, da sua bolsa ou casaco até o último parceiro de dança. Seu sorriso fascinava; os olhos verdes e brilhantes eram en-cantadores. O brilho do olhar, porém, foi diminuindo conforme ela ia bebendo os drinques que todos insistiam em lhe pagar. Em troca, ela também pagava bebidas para todos. — Vamos, caubói — disse a um rapaz com um chapéu em estilo do oeste. — Tome mais um uísque. Ei, outro Duke, uísque. — Ela riu. — Outro uísque, Duke.
— Mariah... — Duke começou. Onde está meu drinque? Perdi meu drinque. Alguém o viu... Duke serviu a vodca que alguém acabara de pagar para ela.
— Escute, não acha que devia ir com mais calma?
— Está tudo bem, Duke. — Ela deu uma palmadinha no rosto do amigo. — Sério. Estou indo com muita calma. — Desceu do banquinho e suas pernas tiveram que fazer mágicas para suportar o peso do corpo. Duke a ouviu iniciar um dueto desafinado com a cantora que soava no bar e, então, pegou o telefone debaixo do balcão. Hesitou por um instante, imaginando se deveria mesmo fazer aquilo. Quando, com uma risada, Mariah desequilibrou-se e por pouco não foi ao chão, ele discou o número de Éden Calloway.
Éden correu para o telefone e atendeu na metade do segundo toque, com a esperança de que fosse Mariah. Ainda havia pessoas conversando em voz baixa na sala. — Alô? Oi, Duke. — A decepção inicial foi substituída por uma crescente apreensão. Cada palavra do rapaz, Éden ficava mais pálida. — Mariah? Bêbada? Mas Mariah não bebe. — Enquanto escutava, ela passava os dedos pelos cabelo loiro avermelhados. — Entendo. Sim, claro. Irei agora mesmo. Obrigada, Duke.
Éden desligou o antigo telefone preto que seu pai sempre se recusara a trocar por um aparelho mais moderno e massageou a testa com uma das mãos.
— Algo errado? — perguntou uma voz masculina a seu lado. Ela ergueu a cabeça e deparou com Ford Dunning.
— Era... Era Duke Boyd. Mariah está no Midnight Hour. Bêbada. Oh, meu Deus, Jo vai comê-la viva! Por que Mariah resolveu fazer isso agora? Preciso ir buscá-la
— murmurou, pegando a bolsa à procura das chaves do carro.
— Deixe que eu vou — Ford ofereceu-se, segurando-a pelos ombros.
— Você faria isso?
— Claro. — Talvez seja melhor... se ela precisar ser carregada ou coisa assim.
— Fique aqui com as visitas. Voltarei logo.
— Está bem. Oh, Ford? Éden chamou, detendo-o já na porta da rua. — Ela é loira, de olhos verdes...
— Eu a encontrarei — ele interrompeu. Já ouvira tantos comentários sobre a irmã mais nova naqueles dois anos desde que conhecera a família Calloway que se julgava capaz de identificá-la em meio a uma multidão.
— Claro. É só procurar a garota bêbada; — Éden sorriu, melancólico.
— Ei, Éden! Beber demais não é crime, sabia?
— Eu sei. Mas vá dizer isso a Jo.
Mariah o viu entrar no Midnight Hour através do copo em¬baçado de uísque que rolava de um lado para o outro pela testa, na tentativa de aliviar o calor do salão e a tontura. Não saberia dizer ao certo por que o homem lhe chamou a atenção. Talvez pelo modo como sua presença parecia impor-se ao am¬biente. Ou pela surpresa nos rostos pois, mesmo em seu estado de embriaguez, Mariah percebeu o espanto, ou melhor, o constrangimento que se espalhava pelo salão conforme ele falava com um dos freqüentadores, depois com outro. Sem dúvida estava procurando alguém. Nesse instante, o olhar do homem dirigiu-se para ela. Vendo-o de frente, Mariah concluiu que talvez ele tivesse atraído sua atenção pelo sim¬ples fato de ser muito bonito, com aqueles olhos arrasadores cor de uísque. Olhos cor de uísque? Tinha de ser uma ilusão, pensou consigo mesma, criada pelo líquido âmbar através do qual o observava. Ninguém po¬deria ter olhos daquela cor. Ela baixou o copo. Os olhos dele continuavam com a mesma tonalidade meio dourada, que con¬trastava de forma esplêndida com a pele bronzeada e os cabelos escuros, quase negros. Algum nível da consciência registrou que ele vinha direto em sua direção, mas todos os sentidos de Mariah encontra¬vam-se atentos nos ombros largos que preenchiam o suéter bege que ele usava sob o paletó esporte. Jeans justos e des¬botados moldavam-lhe as pernas longas de uma maneira que só poderia ser descrita como memorável. Devia estar perto dos quarenta anos, talvez um pouco velho para ela, mas sem dúvida a deixara boquiaberta. O homem encontrava-se de pé a sua frente. A visão meio turva de Mariah foi subindo pela cintura, peito, pelo pescoço bronzeado até seus olhares se encontrarem.
Ele nem piscou. Não parecia nem um pouco constrangido por ser encarado daquela forma por outra pessoa. Foi Mariah quem rompeu o silêncio. E o fez com sua sin¬ceridade arrasadora de sempre, talvez um pouco incentivada pelo álcool em excesso na circulação. Sua voz soou quente e lânguida:
— Você é muito sexy.❇⏪❇⏩❇
Espero que gostem.. 😉
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MARIAH - Quatro Destinos 1
Romance⚠⚠ ATENÇÃO⚠⚠ Livro não é de minha autoria. Gostei da série e resolvi publicá-la. Essa série são de 4 autores que se juntaram e cada uma ficou com um livro. Espero que gostem. Mariah não queria raízes. Apaixonada pela liberdade, viajava de um ponto a...