Uma surpresa de aniversário (parte 2)

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Sr. Bailey sempre sabia quando o filho precisava se abrir com ele. Não tinha nada a ver com observação ou com intuição, mas com localização. Por vezes, ele chegava do trabalho e encontrava Conner sentado no topo da árvore do jardim com o olhar pensativo.

– Conner? – o pai chamava. – Tudo bem com você, amigão?

– Ahã... – grunhia Conner.

– Tem certeza? – insistia o Sr. Bailey.

– Tenho – confirmava Conner, de modo nada convincente. Ao contrário da irmã, ele não gostava muito de falar de seus problemas, mas seu rosto sempre denunciava quando algo o estava incomodando. O pai então escalava a árvore e sentava-se junto ao filho, persuadindo-o com cuidado a compartilhar suas preocupações.

– Tem certeza de que não quer falar? – insistia o Sr. Bailey. – Aconteceu alguma coisa na escola hoje?

Conner assentia com a cabeça.

– Tirei uma nota ruim na prova – ele admitiu certa vez.

– Mas você estudou? – perguntou o pai.

– Estudei – disse. – Juro que estudei, pai. Mas não adianta. Nunca vou ser inteligente como a Alex – lamentou, ruborizado de constrangimento.

– Conner, vou te contar uma coisa que demorei um tempão para aprender – disse o Sr. Bailey. – As mulheres sempre parecerão mais espertas; é simplesmente assim que as coisas são. Estou casado com a sua mãe há treze anos e ainda tenho de me esforçar para acompanhá-la. Você não pode se comparar com os outros.

– Mas eu sou burro, pai – falou Conner, com os olhos já marejados.

– Eu não acho – contestou o Sr. Bailey. – É preciso inteligência para ser engraçado e saber contar piadas, e você é a criança mais divertida que conheço!

– É, mas o senso de humor não me ajuda com história nem com matemática – retrucou Conner. – Por mais que eu me esforce, serei sempre o burro da classe...

O rosto de Conner perdeu a expressão. Ficou ali olhando para o nada, morrendo de vergonha. Por sorte, o Sr. Bailey sempre tinha uma história encorajadora para cada situação.

– Conner, já te contei a lenda do Peixe Ambulante? – perguntou o Sr. Bailey.

Conner olhou para o pai:

– Peixe Ambulante? Pai, não fique chateado, mas não acho que vou me sentir melhor com uma das suas histórias.

– Tudo bem, você é quem sabe – disse o Sr. Bailey.

Um instante se passou, e Conner não conteve a curiosidade.

– Ok, pode me contar sobre o Peixe Ambulante.

Sr. Bailey então ergueu os olhos como sempre fazia antes de começar uma história. E Conner percebeu que essa seria das boas.

– Era uma vez um peixe enorme que vivia sozinho num lago – começou o pai. – Todos os dias, ele assistia calmamente a um garoto do vilarejo brincar com os cavalos, os cachorros e os esquilos que havia naquela terra...

– Vai morrer algum cachorro nessa história, pai? – interrompeu Conner. – Você sabe que eu odeio histórias em que o cachorro morre...

– Me deixa continuar – disse o pai. – Um dia, apareceu no lago uma fada e concedeu ao peixe um desejo...

– Isso é arbitrário demais – protestou Conner. – Por que as fadas sempre aparecem e fazem coisas legais para pessoas que nem conhecem?

– Ossos do ofício? – sugeriu o Sr. Bailey, dando de ombros. – Mas, para fins de argumentação, digamos que a fada havia derrubado a varinha no lago e o peixe a encontrou e devolveu, de modo que ela lhe concedeu o desejo como retribuição. Assim você fica mais feliz?

– Assim está melhor – disse Conner. – Pode continuar.

– Como era de se esperar, o peixe desejou pernas para poder brincar com o garoto do vilarejo – disse o Sr. Bailey. – E então a fada transformou suas nadadeiras em pernas, e ele se tornou o Peixe Ambulante.

– Essa foi estranha – disse Conner. – Vou adivinhar, o peixe ficou tão medonho que o garoto jamais quis se aproximar dele?

– Nada disso, eles se tornaram bons amigos e brincaram com os outros animais terrestres – falou o Sr. Bailey. – Só que, um dia, o garoto caiu no lago, e ele não sabia nadar. O Peixe Ambulante tentou salvá-lo, mas não conseguiu, porque não tinha mais nadadeiras. Infelizmente, o garoto morreu.

Conner ficou estupefato.

– Está vendo? Se o peixe tivesse ficado no lago em vez de querer ser o que não era, poderia ter salvado o amigo – concluiu o Sr. Bailey.

– Pai, que história horrível! E como pode um garoto morar à beira do lago e não saber nadar? Até os cachorros sabem nadar! Por que nenhum dos cachorros foi salvá-lo? Onde estava a tal da fada quando o menino se afogava?

– Acho que você não captou a essência da história. Às vezes nos esquecemos das nossas qualidades porque nos concentramos demais naquilo que não possuímos. Só porque você precisa se esforçar um pouco mais do que outras pessoas em algumas coisas não significa que você não tenha seus próprios talentos.

Conner pensou naquilo por um momento.

– Acho que entendi, papai – disse por fim.

Sr. Bailey sorriu para o filho.

– Agora, que tal descermos desta árvore, e eu ajudo você a estudar para a próxima prova?

– Já falei, pai, estudar não resolve – falou Conner. – Já tentei um milhão de vezes, e nunca funciona.

– Então vamos inventar um jeito novo de estudar, um jeito só nosso – propôs o Sr. Bailey. – Vamos dar uma olhada nas figuras do livro de história e fazer piadas sobre aquelas pessoas, assim você vai se lembrar do nome delas. E podemos desenhar estruturas engraçadas para as fórmulas de matemática.

Conner anuiu com um gesto lento.

– Está bem – disse ele, esboçando um sorriso. – Mas, só para você saber, gostei bem mais da história da Árvore Torta.

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