O Conto de Bruxas

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"Todos veem o que você parece ser,

Mas poucos sabem o que você realmente é."

(Maquiavel)

Há momentos que nossa mente escapa do nosso corpo, viaja pelo passado e pelo futuro incerto, mas nunca pelo presente. Sempre me disseram que o presente é uma dádiva, assim como o significado literal da palavra. Se é tão especial, por que não conquista nossos pensamentos assim como os demais tempos? Por que não nos atrai até algo nos puxar de volta para a realidade?

O sinal do fim da aula foi responsável por me tirar desse labirinto mental. Não poderia afirmar nada do que foi dito naquela classe, algo dentro de mim roubava a atenção. Eu não era o tipo de pessoa que se perdia durante uma aula importante como aquela revisão pré-exame, mas uma agonia tomava conta do meu ser indicando um acontecimento que meu instinto insistia em prever.

- Luíza - uma voz disse em cima de mim. Subi o olhar até então perdido em algum lugar da sala.

- Olá, Santiago - respondi começando a arrumar as coisas postas em cima da mesa. Resolvi acelerar o procedimento para evitar que a conversa se alongasse.

- Irá almoçar hoje aqui na faculdade? - perguntou apoiando-se sobre o meu caderno, me impedindo de guarda-lo. Respirei bem fundo, implorando para ser abençoada pelo deus da paciência.

- Vou, mas já combinei com a Lis, então... - tentei fazê-lo entender da maneira mais educada possível, enquanto conseguia puxar o caderno depois da difícil tarefa de livrá-lo das mãos do homem.

- Entendo. O que acha de sairmos hoje à noite para comer alguma coisa? - perguntou novamente enquanto eu levantava da cadeira fugindo do campo visual dele. O garoto era irritantemente insistente.

- Não vai dar. Tenho que estudar para as provas finais, tem a residência... - comecei a citar todos os compromissos relacionados a faculdade que eu tinha que cumprir nos próximos meses. - Mas eu posso te ligar, tudo bem?

- Claro, mas não se esqueça, gata.

- Não irei - garanti sorrindo enquanto deixava a sala em passos largos. Eu não iria ligar.

- Eu vi isso, Senhorita Luly - Lis me puxou pelo braço assim que atravessei a porta da sala.

- O que está fazendo aqui, Lis? - perguntei estranhando a ação. Ela cursava Relações Internacionais do outro lado do campus.

- Vim procurar minha querida amiga e pelo visto com razão. Santiago Garcia já estava no seu pé! Quantas vezes já te disse que quero manter sua pureza, futura doutora? - O tom de bronca se transformando em um de cuidado me fez gargalhar. Conheço Lis - Ou Laís, mas ela odeia ser chamada pelo nome de batismo - desde o colégio e ela sempre foi minha melhor amiga. Nunca se importou com o sobrenome da minha família ou a posição dos meus tios.

- Nem comece a rir, Luíza! Você sabe que eu tenho razão. Você está no final da faculdade de medicina. Medicina! Preciso soletrar? Não vale a pena perder tempo com um homem como Santiago!

- Tudo bem, mamãe. - eu disse no meio das gargalhadas enquanto caminhávamos para fora do prédio. O sol logo incomodou a minha vista, uma manhã inteira trancada em uma sala de aula te provoca uma leve fotofobia.

- Já que eu te ajudei com esses incríveis conselhos amorosos, você poderia me ceder sua inteligência rara para me ajudar a terminar um trabalho para entregar amanhã...

- Amanhã? - perguntei querendo gritar com ela. Lis tinha esse costume de deixar tudo para última hora. Eu sempre tinha que fazer o trabalho todo sozinha na época do colégio. Não era uma desvantagem, pois Lis me salvava de um ataque de timidez tomando para si a responsabilidade de apresentar tudo sozinha.

Por trás de uma Rainha |DEGUSTAÇÃO|Onde histórias criam vida. Descubra agora