Eu podia dormir até mais tarde da manhã, mas eu esqueci de fechar as janelas e cortinas antes de dormir, o que fez o sol entrar logo cedo e me acordar. Eu bem que poderia ter ido fechar a persiana, mas a preguiça era maior. Tomei banho cedo, li um pouco e agora estou escrevendo na sala. Estou escrevendo um texto absolutamente monótono, apenas a história de um garoto estudante de medicina que não soube valorizar o seu vizinho que morreu.
Poderia ser um pouco mais fácil escrever, mas é tão difícil... Eu poderia pegar o computador e escrever qualquer letra aleatória e talvez aquilo desse em uma história boa com uma escrita boa. Mas é um pouco mais complicado que isso, eu preciso pensar no que seria melhor para o personagem, preciso visualizar a cena e escrever de uma forma que envolva. Eu bem que podia ter encontrado uma paixão/sonho mais fácil, algo como... Algo como... Esquece. Não há sonho fácil.
- O que está fazendo? - Meu pai pergunta chegando na sala.
- Escrevendo. - Respondo sem tirar os olhos da tela.
- Algum sucesso?
Não. Nenhum sucesso. Mal consegui escrever duas páginas e ja são quase nove horas.
- Mais ou menos.
Ele se senta ao meu lado e pede para que eu deixe o notebook de lado por um instante.
- Enquanto você tomava banho ontem, suas colegas te mandaram umas mensagens sobre um Vitor, o seu ex-namorado? Certo? Elas falaram isso. Imagino que foi aquele menino que foi lá em casa.
- Sim, pai. Mas o que tem isso? - Pergunto realmente curiosa.
- Uma delas comentou que você perdeu a virgindade com ele. Acho que para tentar te lembrar... Como se não fosse recordar.
Respiro fundo.
- Sei... - Ainda não sei o que ele quer.
O olhar de meu pai parecia perdido na sala.
- Você não é mais virgem? - Pergunta um tanto afetado.
Tenho vontade de rir, apesar da pequena vergonha que carrego comigo. Achei que ele ia me perguntar se voltei a namorar o traste e se adquirir herpes.
- Não. Perdi a virgindade com 15 anos.
- Ah... Achei que... Achei que fosse esperar pelo casamento. Sua avó fez isso, sua mãe fez isso... Achei que quisesse esperar. - Ele fala um tanto decepcionado.
Por que ele esperava isso de mim? Eu não sou uma das meninas que saem para beber, pegar e dar todo fim de semana. Mas mas não sou uma santa. Digo, eu estou sem beijar alguém a dois anos, mas isso é escolha minha. Eu acho que eu tomei trauma da minha experiência sexual horrível e evitei qualquer contato com qualquer menino por um bom tempo. Mal me aproximava, mal falava sobre o que gosto ou o que não gosto; não falava sobre quem eu sou. Até o Lucas.
- Bem, eu não acho que seja uma coisa que da para se prever. Na hora eu tive vontade e rolou, ué. Normal.
Ouço uma risadinha acima de nossas cabeças, quando olho para o topo da escada vejo o Lucas prendendo a risada. Eu devo merecer. Meu pai está vermelho, por que? Por falar de um assunto que ele põe em prática todos os dias?!Lhe dou uns tapinhas de leve até o Lucas cair em sua cama.
- Por que estava espiando?
- Não sei. Achei a palavra "virgindade" engraçada e aleatória em uma conversa de pai e filha. - Responde querendo fazer graça.
Não sei o que falar, só consigo pensar na noite passada. Minha mente viaja enquanto relembro o quanto seus olhos brilhavam enquanto olhava as estrelas.
- Ha-ha, muito legal você. - Debocho.
Ele suspende uma sobrancelha e então levanta, começa a se aproximar de mim e novamente sinto que meus ossos são pedras que me fazem ficar presa ao chão. Não movo um músculo, e só noto que estava sem respirar quando ele começa a me fazer cócegas. Não sei como, mas acabo deitada na cama dele.
- Ainda vai debochar de mim? - Pergunta mexendo seus dedos freneticamente em minha barriga.
- Vou. - Provoco.
Ele aumenta as cócegas e acabo dando um grito. Meu pai que passava no corredor entrou no quarto e pela sua expressão achou o fato de eu estar na cama do Lucas e ele em cima de mim um tanto... Esquisito. Meu pai franze a testa chateado.
- Precisa de ajuda, Eliza?
- Não. - Empurro o Lucas, e quando acho finalmente me livrei dele, o surrado me puxa para seu colo. Agora estou encolhida em seu peito enquanto seus braços me envolvem. - Não. - Falo ainda rindo.
- Só estou me divertindo com minha irmãzinha.
"Irmãzinha". Não quero que ele me chame assim, dói algo em meu coração. Sempre me futuca fundo e acaba machucando de uma forma.
Mas... Não é isso que somos? Por que a realidade me dói? Aliás, a realidade sempre dói, a pergunta que realmente quero me fazer é: por que exatamente ESSA realidade me dói tanto?
Quando meu pai sai do quarto eu me reconforto na cama ficando de frente à ele.
- Não me chame assim.
- De irmãzinha?
- Isso. Gosto de ser sua amiga, não acho que temos uma relação de irmãos.
Ele sorri e volta a me abraçar. Meu Deus, esse perfume... Acho que nunca vou esquecer. De repente, esse parece ser o melhor aroma que senti em minha vida. Consigo sentir o cheiro de seu shampoo, seu cabelo cheira a praia. Seus músculos estão me envolvendo de uma forma que eu sinto meu coração bater tão forte ao ponto de rezar para que ele não sinta meus batimentos cardíacos pirando. E então eu começo a me acalmar, meu coração vai se acalmando como se tivesse encontrado paz. Fecho os olhos e relaxo... Ja não estou pirando... Estou relaxando.
Nunca recebi um abraço de ninguém. Nem em meu aniversário, nem quando tirei 10 em Simulados. Abraços apenas para cumprimento, mas abraço de carinho... Nunca recebi. Será que foi por isso que meu coração entrou em pânico?
Ele se afasta de mim e arregala os olhos. Acho que estou branca.
- O que foi? - Só quando ele passa a mão em meu rosto eu percebo que eu estou... Chorando. - Eliza? O que foi?
Procuro forças para falar "nunca ganhei um abraço." Abro e fecho a boca algumas vezes até que enfim consigo dizer:
- Eu nunca fui abraçada antes, Lucas. Não assim.
- Não precisa chorar. Pode apenas sorrir. Okay? Nada de choro.
Sorrio e dessa vez eu que o abraço; parando para pensar eu nunca fui abraçada, mas eu também nunca abracei ninguém. Por que eu sempre espero que as pessoas venham até mim? Por que eu não vou até as pessoas?
Talvez eu já tenha feito de mais pelas pessoas, e esteja na hora delas virem até mim.
É. É isso mesmo. Eu estou certa, os outros estão errados. Estar perto do Lucas me faz pensar essas coisas. Estar perto dele sempre me faz pensar, refletir e sentir alguma coisa.
Sentir coisas é como se fosse um efeito colateral de se estar com ele. E como já disse... Não sei se gosto de sentir essas coisas.
- Ei... Mas e o seu ex-namorado? - Lucas pergunta me olhando. - Nunca te abraçou?
- Não. Apenas me beijava.
- Por sinal... Você nunca me contou sobre ele. O que aconteceu para vocês terminarem?
Pensei um pouco. Nunca mais havia parado para pensar no Vitor, nunca mais parei para pensar sobre o que pode ter acontecido com ele. Alias... Por que as meninas me mandaram mensagens falando sobre ele? Isso eu vejo depois, agora eu preciso focar em responder pergunta do Lucas:
- Sexo. Isso aconteceu.
- Foi horrível ao ponto de terminar um relacionamento?
Assinto. Ficamos 1 minuto em silêncio.
- Ele ficou magoado? - Pergunta.
- Não sei. Não sei se ele me amava de verdade. No início era incrível, ele era um verdadeiro príncipe... Aí os meses foram passando e parece que ele foi cansando de mim. Eu tentei de tudo para tentar salvar o namoro, eu realmente gostava dele. Eu ignorei todas as coisas ruins que ele estava fazendo pelas coisas boas que já tinha feito. E isso não tava mais dando para mim. Achei que se eu transasse com ele fosse mudar alguma coisa. Mas na verdade não mudou, ele continuou o mesmo frio de antes. E eu até teria continuado com ele se o sexo não tivesse sido tão ruim; foi bom para ele. Eu arrasei ta. - Arranco uma gargalhada boa dele. - Mas um ato de amor desse não foi o suficiente para salvar nada.
Ele para de rir e me olha com serenidade.
- Você já namorou? - Pergunto querendo sair do assunto do meu ex.
- Sim. Já, já namorei. Helena. Faz um tempinho.
- Quanto tempo? - Pergunto realmente interessada.
- Eu tinha tipo... 12 anos.
Eu rio.
- O que aconteceu com a Helena? - Pergunto enquanto deito em sua cama.
- Descobri que ela comia meleca e terminei o namoro.
Aquilo nos faz gargalhar.
- Afinal, o que suas amigas queriam com o Vitor? - Me pergunta.
- Você ouviu mesmo a conversa com meu pai... Não sei. Por que a curiosidade?
O Lucas levanta uma das sobrancelhas e por um instante parece não ter resposta alguma, mas então me responde:
- Talvez ele tenha perguntado de você... Mas não acho que ele mereça falar contigo.
Sorrio.
- Você realmente se importa comigo, não é?
Ele se deita ao meu lado, e me abraça com um de seus braços antes de responder:
- Sim.O resto da semana foi normal, e com isso eu digo... Nada de Disney. Apenas passeios do dia a dia como se morássemos aqui em Miami. Até a sexta-feira, nosso último dia de castigo.
Eu estava dormindo até que sinto o colchão da minha cama pular. Acordo com o susto. Não enxergo ninguém pela minha visão embasada, sento na cama e esfrego meus olhos.
- Lucas! O que voce está fazendo aqui? São... - Olho o horário no meu celular. - quase uma da manhã.
- Eu não quero mais esperar, Eliza.
- Esperar o que?
- Para perder a virgindade. Cansei de esperar a pessoa certa. Eu não quero mais esperar.
E então meu coração começa a bater tão rápido que parece que eu vou vomitar. Ele quer fazer agora?? Aqui?? Comigo??
E então uma felicidade que não consigo explicar invade meu peito preenchendo tudo que era vazio.
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A (mar)-lo
RomanceEliza é uma adolescente comum, daquela que talvez você não goste na primeira impressão, fria, sarcástica, acanhada, e quieta. Tudo isso vai mudando quando ela descobre que está se apaixonando pelo seu "meio" meio-irmão; cansada de decepções, cansada...