3...2..1 Serendipity!

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A semana passou como um flash, e os sentimentos despertados no primeiro dia de volta a princípio mantiveram-se intactos. A cada lugar da cidade que Meredith Ann revisitava, uma onda de nostalgia intensa lhe atingia.
A Sorveteria do Jerry, onde dera seu primeiro beijo, o Cinema Odin, onde tivera seu primeiro encontro; tudo parecia estar do mesmo jeito. Passara a maior parte do tempo com seus dois melhores amigos, sua prima e seu irmão. Por mais que a cidade tivesse essa aparência de continuidade, Maddy foi aos poucos percebendo que era como se não se encaixasse mais ali. Observava seus amigos conversando e não conseguia evitar sentir-se um pouco deslocada com seus assuntos e experiências que haviam passado sem ela.
— Uma pizza calabresa com catupiry, por favor, Ben! — disse Callie, sorrindo para o senhor, não só atendente, mas também dono da pizzaria preferida do grupo.
— Tem certeza sobre o catupiry? — perguntou Ian com um olhar malicioso, arrancando uma risada de Ethan do outro lado da mesa, que começou a acudir uma Bonnie engasgada com sua bebida ao lado do loiro.
Observando confusa que até mesmo Ben abrira um sorriso disfarçadamente, Maddy lançou um olhar indagador para os amigos em torno dela. Callie começou a ficar vermelha como um pimentão, na mais pura vergonha.
— AQUILO FOI SÓ UMA VEZ! — berrou a garota, tentando parecer indignada, entretanto, falhando em conter um sorriso. — Não vamos falar disso! Sem catupiry, Ben. — Suspirou derrotada.
Mer pegou seu celular na bolsa para desviar da tristeza de sua mais nova constatação. Não. Nada era nem voltaria a ser como antes. Quisera conhecer o mundo, mas, para isso, tivera que abandonar tudo o que lhe era familiar. Buscar seus sonhos viera com um preço inesperado. Se só se passara um semestre, imagina quanto ela perderia nos próximos anos.
— Com licença... — disse ela, levantando-se em direção à entrada do estabelecimento.
Discou o número da única voz que acalentaria seu coração naquele momento.
— Celular do Caleb. Quem fala? — perguntou uma voz feminina grave.
— O Caleb está? — perguntou a loira, meio desconcertada.
— Ocupado... Quem quer saber? — demandou a desconhecida.
Meredith ficou em silêncio, sem reação. Desligou a ligação, com lágrimas começando a acumular-se em seus olhos.
— Tudo bem, mana? — indagou Ian, preocupado, fazendo com que a garota se sobressaltasse e virasse o rosto, limpando discretamente as gotas salgadas que insistiram em escorrer.
— Estou sim, Ian. — Sorriu para seu irmão, abraçando-lhe apertado.
Ficaram nessa posição por alguns segundos, até que a menina lembrasse de uma estória contada por Callie naquele dia mais cedo.
— O que foi aquilo tudo sobre a Jenny?
— O que tem ela? — perguntou seu irmão, corando, sem conseguir esconder nada da mulher que era sangue do seu sangue.
Mer olhou para ele de forma incisiva e cruzou seus braços, esperando com um biquinho impaciente. Só faltava bater o pé no chão para completar a fachada de criança emburrada que sempre funcionava para fazer o irmão desembuchar.
— OK, ok. — disse ele, com as mãos estendidas em rendição. — Tivemos algo no verão, mas não contamos para ninguém, porque não sabemos o que significa e...
— E não querem botar pressão na relação... Eu entendo. Isso é ótimo, vocês fariam um casal muito fofo, eu amo a Jenny. Seria perfeito.
Ian sorriu para ela, assentindo, e voltaram para a Pizzaria do Ben abraçando-se de lado matando a saudade que sentiram por todo o tempo que passaram separados.

***

Tão rápido quanto o amanhecer, logo chegou o dia do natal, com as decorações verdes, vermelhas e brancas por toda a cidade. Maddy e Ethan voltaram a sair juntos desde o dia da pizzaria, mas mantendo o limite de amizade e, até o momento, tudo estava sendo dolorosamente fácil. Era como se o loiro fosse parte dela, e mesmo que amasse Caleb com todo o coração, sabia que esse sentimento familiar, como se o antigo namorado fosse seu lar, nunca poderia ser apagado, o que a assustava. Além disso, até aquele dia, não tivera coragem de contar a ninguém, exceto seus pais e Bonnie, sobre seu novo namorado.
Ethan, que realmente deveria saber do relacionamento, ainda estava ignorantemente cego quanto a isso e possivelmente esperançoso, o que mais tarde poderia provar ser um enorme problema. Ao contar sobre sua nova relação, sua família e sua melhor amiga haviam tido a mesma reação. Encheram-na de perguntas. Porém, enquanto BonBon queria saber coisas como sentimentos e aparência física; seus pais estavam preocupados com o futuro, suas profissões, e que Caleb, sendo da grande e "assustadora" NY, levasse sua menina para mais longe de casa ainda.
"Mas e o Ethan?! Aquele é um bom garoto! ", e "Por que tão cedo?". Tivera de enfrentar calada todos os sermões e indagações como essas. Conseguira aguentar firme nas explicações, conseguindo convencê-los de que tudo estava bem. Não podia deixar de notar, contudo, a dúvida que ainda pairava no olhar de seus pais quando a menina mencionava o garoto, até mesmo na véspera de natal. Nesta mesma noite, como planejado, foram ao baile de natal no celeiro dos Wickham. Como sempre, a decoração, com milhares de pisca-pisca pendurados por todos os lados, deixou a menina sem fôlego.
— Não tem coisas assim na Califórnia, tem, filha? — perguntou Jedediah, com um olhar pomposo.
— Com certeza que não, papai.
— Estamos no Texas, Baby — disse, com seu sotaque sulista na mais plena força. Maddy gargalhou do bobo do seu pai, abraçando-lhe com ternura.
— Concede essa dança a seu velho, minha pequena? — indagou ele, já a puxando pela mão para a pista improvisada, com vários rodopios e passos engraçados.
— Como poderia recusar? — brincou ela, rindo e juntando-se a ele na valsa.
— Quando você cresceu tanto, filhinha?
— Acho que foi o peso dos últimos vinte anos.
— Mer, minha querida, assim eu vou me sentir um velho.
Após o término da música, Jed sorriu para sua filha e a rodopiou uma última vez, entregando-lhe para ninguém mais, ninguém menos que Ethan. Ele estava impecavelmente bem vestido em um terno preto e seus cabelos descontrolados eram como um único sinal de rebeldia.
— Ethan... — Suspirou.
— Annie... — respondeu ele, com um sorriso divertido. — Podemos?
— Por que não... — respondeu-lhe sorrindo, algo que se arrependeria mais tarde.
Descansou sua cabeça no ombro do garoto, suspirando como uma boba pelas tentativas fracassadas dele de elaborar uma boa piada. Balançavam-se desajeitadamente, enquanto ela pisava no pé dele — que já estava acostumado com os dois pés esquerdos da menina após tantos anos juntos. Foi no momento que levantou sua cabeça, gargalhando com uma brincadeira do menino, que avistou Caleb de pé na porta do celeiro, a encarando.
Assustou-se com o aparecimento repentino, sentindo uma mistura de emoções passarem por seu peito. Estava feliz, com raiva e sentindo-se culpada ao mesmo tempo. Por que será que o namorado chegara a Dallas antes do combinado?
Ele deveria chegar para visitá-la e conhecer o seu lar somente no dia seguinte ao natal. Todavia, após chegar à Nova York e matar a saudade de sua família, o rapaz só podia pensar na sua amada namorada e em como queria passar cada segundo com ela. Ao chegar ao tal Celeiro Wickham, onde fora informado que toda a cidade ia para celebrar as festividades, levou um choque. Viu sua garota dançando com um menino loiro engomadinho. Pior, ambos pareciam nutrir de uma ligação profunda, sorrindo um ao outro de forma calorosa.
De repente, os olhos dele encontraram o de Maddy, o que claramente deixou-a tensa. Isso foi dolorosamente perceptível ao recém-chegado, mesmo passando em um flash segundos, antes desta lhe oferecer um sorriso de felicidade genuína superada a surpresa. O engomadinho finalmente desvencilhou-se da namorada de Caleb e começaram a andar em sua direção. O tal menino audaciosamente seguiu Meredith, parecendo curioso quanto ao moreno à porta.
— Kay! Estou tão feliz pela surpresa. Não acredito que poderemos passar o natal juntos. Mas como... Por quê?
— Hazel, eu não conseguiria ficar tantos dias longe de você — declarou, engolindo-a em um abraço apertado. — Além disso, tinha que retificar a pequena confusão da irmã chata do meu melhor amigo atendendo meu celular enquanto eu havia saído com ele! — Repousou seu queixo no topo da cabeça de Mer, que agora corava envergonhada por seu ciúme injustificado. Caleb não deixou escapar o olhar horrorizado do outro rapaz, atento a conversa do casal.
— Annie?! — chamou Ethan, com um tom confuso de quebrar o coração. Ele observava a cena sentindo-se, pela primeira vez, deslocado perto da antiga namorada. — Quem é seu ... amigo?!
Meredith congelou em pânico, saindo do abraço de seu atual namorado para voltar-se a seu antigo amor, medindo suas próximas palavras cautelosamente para não criar nenhuma confusão. Percebendo um olhar curioso dos passantes, puxou ambos para uma área mais reservada fora do recinto, sob o céu da noite estrelada. Enquanto passavam, focou seus pensamentos em descobrir o que exatamente faria para sair dessa bagunça que ela mesma criara. Pararam assim que estavam longe o suficiente da festividade. A garota arrepiou-se ao sentir o ar frio noturno percorrer seus braços e colo descobertos devido ao decote e as pequenas alças do vestido que usava. Ambos os garotos ofereceram seus paletós, porém ela recusou enquanto suspirava, perdida demais em seus pensamentos para incomodar-se com algo tão banal como o clima.
— Ethan...
O menino levantou o olhar para ela, aguardando uma explicação plausível.
— Esse é Caleb... Meu namorado. — Apresentou, vacilando com um tom de voz baixo. — Começamos não faz muito tempo, porém estamos muito próximos e ele veio passar o natal comigo.
— Por que você não me avisou Annie?!
— Quem é Annie? — perguntou um Caleb confuso, sendo ignorado pelos ex-amantes.
— Eu ia te contar, só que por alguma razão de força maior, acabei não contando... — E, virando-se para Caleb, continuou seu discurso. — Caleb, esse é Ethan, meu antigo namorado. Mesmo que eu tenha mencionado ele, nunca te contei que namoramos durante toda minha adolescência e que somos, antes de qualquer coisa, melhores amigos.
— O-ok... — Gaguejou Kay, com um olhar pensativo.
— Desculpem-me por ter criado essa confusão, mas é que ambos são muito importantes para mim e eu não conseguiria suportar que se odiassem...
Criando coragem, a menina finalmente se permitiu parar de encarar a grama, para enfrentar a expressão dos dois homens de sua vida. Para sua surpresa, ambos a olhavam como se a compreendessem em certa medida. O namorado até tomou a iniciativa de estender a mão para o loiro, contudo, este observou o "adversário" duramente, simplesmente lançando um olhar de desculpas a ela e saindo andando. Para o alívio de Maddy, BonBon apareceu nesse exato momento.
— Deixa que eu falo com ele, Blondie! — Meredith sorriu diante de seu velho apelido. — E você deve ser o famoso Caleb... Mer falou muito bem de você.
Com um humor um pouco mais leve e tentando acalmar a namorada, Kay deu uma risada presunçosa e agarrou-a, dizendo:
— Ah é mesmo, Hazel?! Eu sei que sou irresistível — murmurou, piscando para ela que já estava vermelha como beterraba de vergonha. Virando-se para a morena, continuou. —Muito prazer, Bonnie. Eu até sinto que já te conheço de tanto que essa aqui fala sobre você.
A amiga sorriu, já aprovando de cara o simpático e belo garoto que fazia sua amiga ficar sorrindo que nem uma idiota e corando a cada cinco minutos, até mais do que quando estava com Ethan. Lembrando-se do problemático menino em questão, decidiu se apressar.
— Vou lá falar com o enfezadinho, então... — avisou, estremecendo em preocupação. — E Meredith, eu já ia esquecendo, seus pais estão te chamando...
Após dar três passos se afastando, Bonnie voltou-se novamente para eles sorrindo e berrando:
— Ah, traga o bonitão aí para nossa social amanhã.
BonBon nem esperou uma resposta e continuou correndo atrás de Ethan. Percebendo para onde ele havia ido, passou a caminhar mais calmamente. Aproximou-se de sua figura sentada em um dos balanços do parquinho do terreno dos Wickham e acomodou-se a seu lado.
— Olá, bobinho, o que faz sozinho aqui?
— Vai embora, pequena... Você sabia o tempo todo sobre isso e nunca se dignou a me contar...
— Você sabe muito bem que essa não é minha função. Não é justo me culpar pela bagunça que vocês mesmos criaram... Você também sabe, ou deveria saber que a culpa é, em grande parte, sua. Vocês deixaram tudo indefinido quando a Mer foi embora, só esperando que tudo se resolvesse magicamente. Mas as coisas não funcionam assim. Nada se resolveria sem o esforço de uma conversa, acabou que não ficaram na mesma página sobre o que a separação significava.
— Eu sei... Desculpe, é só que eu esperava que ela voltasse da faculdade realizada. Não esperava que se envolvesse com alguém, pelo menos nada sério... Sei que é idiota ter sonhado isso, entretanto, pensei que talvez depois de passar alguns meses separados ou ao fim da faculdade, ela pensasse em aceitar ficar comigo aqui, permanentemente. — explicou, somente agora percebendo o quão fora cego. — Mas parece que nada satisfaz o espírito livre da nossa Annie.
— Sinto muito, Ethan, porém ela agora é somente sua amiga. — Começou Bonnie, com cautela. — Caleb parece ser um cara muito legal. Está na hora de encarar a realidade.
— E qual é essa? — perguntou ele, cansado, com a face repousando nas mãos.
— É possível que ela nunca se acomode. Você tem que começar a pensar mais em si e no seu futuro... Deixá-la decidir pelo dela. Ainda tem a mim e a seus outros amigos e família. Além disso, ela sempre será sua amiga, isso nunca iria mudar.
— Será que não? — indagou esperançoso.
— Tenho certeza — afirmou, com um ar definitivo.
— Obrigada pelo apoio, BonBon... Eu sei que você tem razão, contudo, temos tanta história que não sei se conseguirei desapegar...
— Não se preocupe bobão, estarei aqui para isso sempre que precisar. — disse ela, sem graça.
— Eu também tenho que me desculpar por...
— Não. Não se atreva a fazer isso agora. — Ela levantou do balanço, tentando se recuperar da emoção que começara a se formar em seu peito.
— Bonnie, eu...
— Vamos só voltar para a festa... — pediu, cortando completamente o assunto. — Você tem que corrigir a atitude de bebêzão que teve com o pobre menino. Vai apertar a mão dele como deve, não vai dar um pio na festa amanhã quando ele for e também nunca mais vai puxar o assunto que tanto quer puxar, está me entendendo?!
— Tudo bem... Mais alguma coisa? — ironizou, teimosamente.
A menina bufou, praguejando.
— Até parece que foi você que chegou para fazer uma surpresa para sua namorada e a viu dançando com o ex dela. Não quero que vocês dois continuem se estranhando como estão. E, quando falo vocês dois, quero dizer você, seu cabeça dura. — Ethan sorriu para a linda menina negra, com a pele brilhante da cor do café a sua frente. Não conseguia evitar notar como ela ficava radiante sob a luz da lua, ainda mais toda irritada daquele jeito.
— Logo me juntarei a vocês no celeiro. — avisou ele, balançando a cabeça para clarear seus pensamentos. Satisfeita, Bonnie resolveu retirar-se e ver que outra crise poderia ter sua amiga se metido enquanto estava longe.

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