O dia da viagem
O avião decola com Natalia aconchegada nos cobertores, seus olhos já estão fechados novamente. Martinha observa a cidade ficando para trás. Nunca tinha viajado de avião, alias, nunca tinha deixado a cidade de modo algum. Era assustador e ao mesmo tempo excitante.
Tinha tido esperança que os pais de Natalia a impedissem de embarcar quando vissem o estado em que ela se encontrava, curiosamente, o frio deu uma trégua e Natalia parecia mais saudável que todos eles, estava até com as bochechas rosadas! Assim que as duas embarcaram, porém, o frio retornou.
A aeromoça lhes forneceu as cobertas e Natalia voltou a dormir. Olhando-a agora, ela parecia serena. Não estava tremendo.
Natalia abre os olhos e se depara com Martinha lhe encarando, dando-lhe um sorriso pede desculpas — Não estou sendo a melhor das companheiras de viagem, desculpe.
Martinha retribui o sorriso — Não se desculpe, seria pior se você fosse uma daquelas companheiras chatas que não calam a boca um segundo. Meus ouvidos não agüentariam. Sabe que a única voz que suporto por muito tempo é a minha.
Uma risada atravessa os lábios de Natalia — Boba!
Ajeitando o cobertor melhor ao redor de Natalia, Martinha a aconselha a descansar. Antes mesmo que ela termine de falar os olhos de Natalia já estavam fechados novamente.
Natalia era sua amiga desde que tinham dez anos, Martinha a adorava. Sempre saia em defesa de Natalia, apesar de saber que ela era capaz de se defender sozinha. Sabia também que ela a deixava tomar a frente quando algum valentão mexia com elas na escola porque sentia sua necessidade de ter uma função marrenta na amizade que mantinham. Elas se conheceram em um grupo de capoeira. Natalia era a novata no grupo. Uma das veteranas a quem Martinha não suportava a tirou para jogar. A veterana não tinha espírito esportivo, era conhecida por humilhar os adversários sem se preocupar se eles tinham o mesmo treinamento que ela, Martinha já a vinha marcando a um bom tempo por causa disso. Natalia parecia um ratinho assustado tentando se defender sem muito sucesso. Martinha não se agüentou e acabou comprando o jogo e dando uma lição na veterana.
Quando procurou a novata ela já tinha juntado suas coisas e estava saindo da academia, Martinha a alcançou, mas não se apresentou de imediato. Apenas sentou no banco do lado de fora da academia ao lado de Natalia.
Ela iniciou a conversa com um simples... — Obrigada. — E desde então as duas não se separaram mais. Natalia tinha algo de diferente, mas para Martinha isso nunca foi problema.
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Mesclados
General FictionO fogo queima igual a paixão. Conexões mesclam o mundo , conexões mentais mesclam almas. Ainda criança Natália não entendeu o que lhe aconteceu. Mais velha, ainda não entendia, mas as vozes de seus sonhos entendiam e iriam usa-la para novamente es...