Bons sonhos

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  Acordei no dia seguinte com a luz do sol batendo em meus olhos e o som dos passarinhos se agitando entre as árvores. Minha mãe percebeu que eu havia acordado e me puxou para seu colo dando um abraço apertado e alguns beijos de bom dia espalhados pelo rosto.
-Bom dia mamãe, bom dia papai
  Falei com um sorriso no rosto, levantando em seguida para procurar o que comer. Meu pai me deu um beijo carinhoso na bochecha e ajudou minha mãe a se levantar.
  Mamãe não demorou muito e começou a preparar nosso café da manhã com frutas enlatadas que ela havia pego em casa. Após o café da manhã, fui com o pai até um lago próximo e brincamos um pouco na água até que o sol ficasse mais forte. Voltamos para o lugar em que dormimos e minha mãe já havia arrumado a bagunça que fizemos na hora de dormir e no café.
-O caminho é longo, melhor começarmos a andar depressa.

  E o caminho foi mesmo longo, chegamos na nova vila no fim daquela noite, depois de mais uma parada rápida para almoçarmos comida enlatada e algumas horas para que eu descansasse.
  Nossa nova casa tinha quase o dobro do tamanho da anterior, estava empoeirada e os móveis pareciam ser antigos, mesmo assim era uma das casas mais bonitas que eu já havia visto.
-Eu e seu pai morávamos aqui quando você veio morar na minha barriga
  Olhei nos olhos da mulher com um sorriso contagiante ao ouvir tais palavras. Jamais tinha imaginado antes como seria a casa que meus pais haviam passado a infância, ou até mesmo a casa de moravam quando se casaram. Nesse momento caiu a ficha que eu tinha mesmo um pai, ele tinha voltado para mim e não iria embora nunca mais, nem por um único segundo eu me sentiria só, minha família estava completa. 
-Não vamos ter que mudar de novo, né?
  Dessa vez pude ouvir risadas vindo da parte do meu pai. Ele me pegou no colo e começou a subir as escadas.
-Claro que não, boba. Essa casa era da minha mãe, sua avó.
  Ele tentou de forma falha esconder o quão desconfortável era para ele falar sobre isso, então resolveu mudar de assunto.
  O rapaz pegou minha mão e subimos as escadas. Fui guiada pelos corredores até chegarmos em uma portinha branca com passarinhos.
-Veja, esse é o seu quarto, eu preparei ele pra você...
  Abri assim que ele terminou sua fala. O quarto era em um tom azul claro com algumas estrelas presas ao teto. Haviam algumas bonecas, foguetes e muitos outros brinquedos arrumados em uma estante de madeira logo ao lado do guarda roupa. A cama tinha lençóis rosas, e uma cortina amarela cobria as janelas, era como se ele nunca tivesse ido embora.
-Você pode trocar se quiser, se não gostar das cores e decoração, tem mais alguns quartos sobrando
-Não, esse é lindo!
  Corri até ele e o abracei com um sorriso no rosto. Ele retribuiu o gesto e resolveu que me deixaria sozinha para que eu explorasse a casa.
Na mesma noite jantamos pela primeira vez em família, todos juntinhos. Após as conversas e risadas, fui posta na cama pelo meu pai, que contou histórias parecidas com as que minha mãe me contava sempre. Dormi antes que ele pudesse chegar na metade da história.
Durante a noite acordei com um homem parado ao pé da minha cama.
-Pai?
  Não houve resposta, apenas pude ouvir sua respiração alta. O rapaz estava com um casaco preto e um capuz cobrindo seu rosto. Levantei enquanto ele permanecia imóvel e caminhei em sua direção
-Papai, você está me assustando...
  Chego perto o suficiente para ver o brilho vermelho que seus olhos refletiam, mesmo cobertos pela sombra. O homem então se mexeu depressa, como uma cobra atacava suas  presas, tentou me pegar no colo enquanto eu gritava e me debatia em seus braços, mas em uma tentativa desesperada de escapar mordi seu ombro. O rapaz agiu por instinto e me jogou no chão, foi a chance que tive para correr. Sai desesperada pelo corredor e entrei no quarto dos meus pais. Não encontrei ninguém, eu estava sozinha. Me tranquei no armário de um dos quartos e a única coisa que ouvi por minutos foi a minha respiração ofegante e tive a impressão de ouvir meu coração que estava quase pulando do peito. O lugar ficou muito frio e meus pés descalços demoraram algum tempo para perceberem que o chão estava molhado com um líquido pegajoso e quente. Abro a porta do armário para que a luz entrasse e eu pudesse enxergar de onde vinha o líquido, já que com a porta do armário fechada a única luz que entrava era por fendas na porta feitas para decoração. Olho para o lado, dessa vez a luz já tinha tomado o lugar e sinto um arrepio percorrer meu corpo, minha garganta fica seca. Minha mãe estava encostada nas paredes do armário com um corte no pescoço de onde o sangue saia, já estava sem vida. Penso em procurar o meu pai pela casa mas sinto minha respiração começando a vacilar eu estava começando a sufocar sem muita explicação, como se todo o oxigênio apenas tivesse acabado. Minha visão escurece depressa e logo não sinto mais o meu corpo. Acordo atordoada e as primeiras coisas que vejo são as estrelas brilhantes presas ao teto do meu quarto. Eu ainda não conseguia respirar direito e sinto meus olhos enchendo de lágrimas. Talvez aquilo tivesse sido um sonho, o sonho mais real que eu já tive.
-MÃE, MAMÃE!!
  Grito com esperança que ela pudesse ouvir, tinha sido um sonho, eu acreditava firmemente nisso.
  Eu estava certa, a moça entrou no quarto arrumando a alcinha da sua camisola que insistia em descer por seu ombro.
-O que aconteceu?
  Meus olhos estavam cobertos por lágrimas e eram questões de segundos até que elas começassem a transbordar e molhar minha bochechas. Ela logo entende o que aconteceu e me pega no colo. Encosta minha cabeça na sua e ouço sua respiração calma em minha orelha. Seu corpo ainda estava quente por conta do sono.
-Foi um pesadelo, está vendo? Tudo está bem agora, não deixarei nada ferir você
  Minhas lágrimas já haviam molhado seu ombro quando sinto sua mão em meus cabelos. Vejo então meu pai surgir na porta, entendendo a situação sem que ninguém dissesse uma só palavra.
-Querida, ela pode dormir conosco essa noite, o que acha?
  Ele se aproxima mais de nós duas e me pega no colo.
-É a melhor ideia que já ouvi!
  Sua resposta é dita de forma doce e gentil, e logo sou atacada com beijos no rosto e algumas cócegas. Meus pais me levam para o quarto deles e me deito entre os dois. Minha mãe é a primeira a adormecer, ela estava realmente cansada. Meu pai permaneceu mais tempo acordado acariciando meus cabelos escuros e escorridos, não lembro o exato momento que ele dormiu, mas foi ali com a mão em meus cabelos. Sou a última a adormecer, todas as vezes que fechava os olhos, aqueles olhos vermelhos vinham a minha mente. Finalmente deixei que meu sono vencesse.

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