Quinta-feira,09 de março

4 0 0
                                    

Meu pai achou graça de eu dizer que estava com inveja de Luisinha sair à
rua, de lenço na cara.
Não desejo ter dor de dente porque vejo todo o mundo chorar tanto, que
penso que há de doer muito. Naninha, quando tem dor de dente, põe a casa toda maluca. Tia Agostinha fica só rezando e fazendo promessa, com medo de Naninha enlouquecer. Ela grita, rola no assoalho, bate com a cabeça na parede,bque a gente pensa que é doida do hospício. Outro dia os gritos foram tantos que a gente da rua entrou para acudir; ela xingou a todos e foi rolar na horta.
Ninguém sabe o que se há de fazer para aliviar dor de dente. Arrancar,
ninguém pensa nisso, depois do que aconteceu à filha de Dona Augusta. Ela gritou muitos dias de dor de dente. O pai, já desanimado, chamou o dentista para arrancá-lo. Ele arrancou e a pobrezinha só teve pouco tempo de alívio, para depois morrer de uma morte horrorosa: ela endureceu toda, os dentes cerraram e a cabeça envergou para trás até ela morrer.
Luisinha teve esta semana uma dor de dente de gritar. Mamãe a fez
bochechar com água com sal, pôs rapé no dente, pôs creosoto e nada serviu; foi Siá Ritinha que a curou de um modo esquisito. Deu-lhe um purgante de óleo e no dia seguinte a cara inchou e ela não chorou mais. Hoje ela queria sair à rua sem lenço na cara e mamãe ficou horrorizada só com a ideia, com medo da cara estuporar. Eu acho que é por isso que Belinha de Seu Cula vive a vida
inteira de lenço amarrado na cara. Hoje eu tive vontade de sair com lenço na cara como vejo os outros fazerem, mas mamãe não deixou.

minha vida de meninaOnde histórias criam vida. Descubra agora