Uma, duas...quatro taças de champanha e eu já podia sentir as minhas ideias embaraçosas. Optei por ficar algum tempo distanciada de todos, para evitar constrangimento.Mas o fato é que sou tão fraca para isso, que sinto a visão turva, com apenas quatro taças ou uma a mais. Oh, céus! É vergonhoso beber pouco e sentir-se asssim.
Acabei por me escorar, sentindo a moldura firme de um quadro, virei-me rápido, com receio em estragar a obra. Analiso o quadro, tão renascentista, impossível não querer tocar no papel pintado, sentir a textura do mesmo, tão lindo e, como dito, renascentista.
É como se eu pudesse, mesmo em meu estado, sentir a emoção da bela mulher, despida como veio a esse mundo. Suas lágrimas escorrendo sobre a sua face, sua mão tentando tocar ou alcançar algo ou alguém, de joelhos, com suas pernas presas por algo que não reconheço, enquanto seus cabelos voam com a ventania na qual ela estava, aliás, a sua vida me parecia uma ventania.
Incrível como a minha imaginação se torna fértil a partir do momento em que o álcool toma conta.-Gostou?-Me estremeço dos pés a cabeça, a pessoa me assustou ou eu estou sensível de mais.
Constrangida pelo meu estado de embriaguez, viro-me lentamente, não sabendo reconhecer bem, mas logo em um pique, lembro-me dele, sim, dele. Um homem que não honrou cem por cento a sua roupa de esporte fino, vestindo uma jeans escura, junto de uma camisa e um blazer da mesma cor que sua calça.
Ele mantém uma serenidade implacável, mas seu olhar me diz estar tudo bem, ou é apenas um ilusionismo de uma cabeça embaraçosa.-Ah, é...olá. -Digo, Talvez com a língua um pouco enrolada e com o nervososismo mostrando as suas garras. É o artista da exposição.
O reconheci apenas pelo folheto no qual Ariana haveria entregado-me, eu realmente nunca tive paciência para esse tipo de lugar e artistas do ramo, apenas em suas obras. Por mais que a fotografia, minha paixão, seja um meio da arte, não estamos completamente ligados, digo por mim.
-Gostou da obra?-Eu vejo a sua mão na qual segura a taça chegar na altura de seu peito, logo subindo mais e levando a taça até os lábios, dando ali um gole.
-Gostei. Sobre o que ela retrata para você?-Pergunto, imediatamente. Passando por cima da parabenização, por mais forçada que fosse.
Por alguns segundos ele ficou olhando para a tela, com uma imensa plenitude em seu olhar, parecia pensar exatamente no que dizer.
-Uma jovem mulher desiludida amorosamente.-Ele respondeu, apenas. Voltando a olhar-me, arqueio uma sobrancelha.
-Apenas isso?-Respondo de imediato, vendo-o me olhar com dúvida.-Digo,-Corrigi a minha postura, até porque não poderia esquecer que não estou em meu melhor estado para ter um debate sobre uma pintura. -Em minha cabeça, essa jovem está transtornada, há mais do que uma desilusão.
-Pode até ser.-Ele respondeu simples. Céus, como é que pode ser um artista plástico, sendo que demonstra essa passividade toda. Uma obra deve ter seu histórico, não deve?
Ele voltou a olhar a tela, agora com mais profundidade, parecia ainda procurar alguma forma de se pronunciar com mais clareza. Então, prossegue:
-A pintura é uma poesia que se vê e não se sente, e a poesia é uma pintura que se vê e não se sente.-Eu conhecia a citação, se não me deixo por enganar, é de Da Vinci.
Talvez eu estivesse muito sobrecarregada para compreender o que ele dissera, mas eu queria dizer algo, queria defender o que a mulher sente. Ela não possui voz ativa para dizer, mas eu gostaria de dizer por ela.
Ele me olhou, como se fosse através de mim, como se o seu olhar pudesse me responder mil e uma coisas sobre a pintura.
-Nicholas! Aí está você.-Ouço a voz de um homem, olho para ele e o mesmo presta a atenção em mim.-Não estou lhe atrapalhando, não é?- Eu senti a malícia em sua voz, o mesmo cumprimento ele, logo voltando a me olhar. Eu não gostei nada disso, e a vontade de desaparecer da vista desse audacioso tornou-se o meu maior desejo.
-Preciso ir.-Digo, sem querer ouvir um adeus ou até mesmo " até nunca mais". Não por eu querer vê-lo novamente, mas sim por não querer mais conversa e muito menos vê-lo novamente.
Dei as costas, agora mais firme, minha visão não está tão turva quanto antes. Passei a caminhar, ouvindo no fundo da melodia de Beethoven, Für Elise, a voz de Nicholas me chamar. Ignorando o seu primeiro e único chamado, ignorando talvez alguém que não parece se importar com o que o quadro pode retratar. Talvez.A arte vem do amor e não apenas mostrar suas artimanhas com o pincel e então vender por preços absurdamente caros.
Mas antes um homem com uma citação sobre a ponta da língua, do que alguém no qual apenas vende de quadros.
Notas:
Capítulo pequeno por falta de comentário. Comentem, bitchs...Só pra saber se tem gente viva ainda.
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𝐒 𝐔 𝐁 𝐌 𝐈 𝐒 𝐒 𝐀 -Versão Nemi
RomanceAté onde o amor poderia nos levar? Mas seria mesmo o amor? Algumas pessoas possuem a capacidade de ter um corpo de sentimentos passageiro, o qual temos a capacidade de confundir com algo que é capaz de mover montanhas, nos mudar de corpo e alma...