O calor do corpo de Mark e o cheiro sutil de álcool que ainda paira no ar me despertam de um sono profundo. Abro os olhos com lentidão e vejo seu rosto tão próximo do meu que posso sentir a leveza de sua respiração.
— O que diabos... — começo a murmurar, mas minha voz morre ao vê-lo se mexer.
O pensamento atravessa minha mente: Mark estava fora para beber quando me encontrou? Aquilo parecia incongruente com a imagem que eu tinha dele, o homem que parecia sempre estar no controle, gentil e prestativo.
A sensação de estar tão próxima dele é desconcertante. Tento me recompor e examinar a situação.
O que ele estava fazendo aqui, tão perto de mim, em um momento tão vulnerável?
— Você cheira tão bem... — Mark murmura, sua voz rouca e suave, mas com um tom de sinceridade que me desconcerta ainda mais. Suas palavras soam quase como um sussurro, e o calor da sua respiração faz meu coração acelerar um pouco.
Ele parece estar mais relaxado agora, talvez inconsciente do impacto de suas palavras e ações quando suas mãos agarram minha cintura e ele se aproxima um pouco mais.
— Mark... — começo, a voz saindo hesitante. — Você está bem? Quanto você bebeu?
Assim que ouve minha voz, ele se afasta, seus olhos surpresos.
Há um momento de silêncio, e ele parece estar tentando juntar seus pensamentos.
— Desculpe — ele diz, finalmente. — Não era minha intenção te assustar ou fazer você se sentir desconfortável. Eu só... merda. Eu só fui um idiota agora, Anna, me perdoa. Não consegui dormir e, quando te vi aqui, acabei me aproximando sem pensar direito.
Sinto um peso no ar, a tensão entre nós é palpável. Mark parece estar lutando para se ajustar à situação e se afastar um pouco, tentando respeitar meu espaço.
Eu me movo lentamente para me afastar, tentando processar o que ele acabou de dizer.
A ideia de Mark estar lutando contra o sono e talvez também lidando com seus próprios problemas pessoais é um pouco surpreendente, e ao mesmo tempo, faz sentido. Todos nós temos nossos momentos difíceis.
— Você... você está bem? — pergunto novamente, tentando esconder a confusão na minha voz. — Não parecia que estava dormindo bem.
Mark se senta na beirada da cama, passando a mão pelo rosto com um gesto de frustração ou cansaço.
— Não realmente — confessa, olhando para baixo. — Acho que não sou um exemplo muito bom de cara, aparentemente. Não consegui dormi e bebi demais. Quando entrei nesse quarto, acabou que eu achei... — ele interrompe a frase, balançando a cabeça. — Que você era outra pessoa. Desculpe.
Ele achou que eu era ela, penso. A sua esposa morta.
E estar ciente disso faz meu coração doer um pouco.
Sei que devo tornar isso leve, mas fugir do assunto seria equivalente a mentir para o meu interior, e não quero fugir disso. Os meus sentimentos. Também não quero vê-lo se afastar dos seus.
Por isso, me sento ao lado de Mark na beirada da cama.
— Deve ser difícil — falo, procurando as palavras certas para expressar o que estou sentindo e oferecer algum tipo de consolo. — Perder alguém que você ama deve ser uma dor imensa. E é compreensível que você esteja lutando com isso.
Mark ergue os olhos para mim, e vejo uma mistura de surpresa e um leve alívio em seu olhar.
— Não esperava que você entendesse — começa, a voz carregada de uma tristeza que parece estar apenas começando a se abrir.
— Não entendo completamente — admito, — mas perdi alguém importante para mim quando era mais nova. Não o amor da minha vida, mas ainda assim alguém que era muito especial para mim.
Mark me olha com mais intensidade, como se estivesse tentando encontrar mais detalhes no meu rosto.
— Eu... sinto muito por isso. — ele responde, sua voz carregada de sinceridade.
— É uma dor que nunca desaparece completamente — digo, tentando manter a conversa em um tom compreensivo. — Mas com o tempo, aprendemos a lidar com ela. E mesmo que não substitua a pessoa que perdemos, acabamos encontrando maneiras de seguir em frente.
Mark acena, absorvendo minhas palavras, a tensão em seus ombros diminuindo um pouco.
— Ela não me quis no início — a voz dele retorna. — Quando comecei a me aproximar, Somi sempre disse que eu não tinha a menor chance com ela.
— Mas você não desistiu.
Ele sorri.
— Não seria amor sem esforço.
Concordo, sentindo uma conexão crescente com ele.
— No fim, o esforço é o que faz o amor ser real e significativo. Mesmo que o resultado não seja o que esperávamos, a jornada e a dedicação têm um valor próprio.
O ambiente ao nosso redor parece se acalmar, e a tensão que antes pairava no ar agora dá lugar a uma sensação mais suave de compreensão mútua.
— Isso é raro — ele diz, de repente.
Evito franzir o rosto em confusão.
— O quê?
— Essa sensação... como se você realmente compreende tudo o que estou passando.
Eu o olho, sentindo a profundidade do momento. Não é apenas uma conexão de palavras, mas algo mais profundo, uma compreensão mútua que parece transcender o que foi dito. Ele continua a me observar, e há uma sinceridade em seus olhos que não consigo ignorar.
— Acho que você ainda está bêbado — brinco, tentando aliviar a tensão com um pouco de leveza. — Às vezes, o álcool faz a gente se abrir mais do que o normal.
Mark dá uma leve risada, um som que é ao mesmo tempo amargo e reconfortante. Ele parece estar começando a se soltar, a tensão em seus ombros diminuindo gradualmente.
— Pode ser —admite. Mas, se isso faz com que eu seja mais honesto sobre o que estou sentindo, então talvez tenha um lado bom.
— Mark...
— Tenho estado afastado de todos esses últimos dias — ele continua. — Mas... nesse exato momento, foi fácil falar com você. Obrigada, Anna. E desculpe pelo que fiz.
O loiro respira fundo, como se estivesse tentando absorver o alívio que vem com a compreensão e o apoio. Ele se levanta lentamente, ainda um pouco abalado, mas com uma expressão mais serena.
— Eu vou tentar me recompor — diz ele, passando a mão pelo cabelo. — E, se você precisar de algo, por favor, me avise.
— Certo — respondo, levantando-me também. — Dessa vez, sou eu quem digo: se precisar conversar mais, estarei por aqui.
Mark dá um pequeno sorriso, um gesto que é ao mesmo tempo triste e esperançoso.
— Vou me lembrar disso. Obrigado, Anna.
Enquanto Mark se afasta, sinto uma mistura de emoções. A proximidade de nossa conversa e a sinceridade que surgiu entre nós me fazem refletir. E isso me estressa.
— Espero que você fique bem — murmuro, e me joga na cama outra vez.