8 - A ruivinha

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Ricardo acordou no sofá e foi devagar até a cama. Ainda não estava bem, mas não conseguia mais dormir, apesar dos remédios que havia tomado. Sua cabeça fervilhada de pensamentos desconexos e lembranças. Primeiro, ele caminhava pela própria casa, vazia, sem conseguir encontrar uma saída. Depois, estava na sala de aula, também vazia, onde jamais conseguia terminar a tarefa que a professora havia passado, podia ouvir a mãe dizendo: "Você é sempre uma decepção". Foi aí que começou a se lembrar da garota.

Ricardo acabou de sair da loja de materiais de construção e jardinagem. Aquelas malditas roseiras só serviam para lhe dar trabalho. Estava pensando que deveria comprar um saco de cimento e cobrir tudo, quando a viu do outro lado da avenida. A ruivinha que trabalhava no Starbucks.

Fazia menos de um ano que a cadeia de cafeterias havia chegado na cidade e ele sempre passava por lá quando ia até o centro. Não podia tomar muito café, já que a bebida piorava suas crises, mas desde que viu Solange, não conseguiu mais parar de pensar nela.

Ele lembrava da primeira vez que a viu, quando entrou na loja e pediu um cappuccino. O rapaz do caixa era o André, que havia estudado com ele no colégio e era um dos que mais pegavam no seu pé. Mesmo tendo sido da mesma sala de aula por cerca de onze anos seguidos, o rapaz perguntou seu nome, rindo. "Ricardo", respondeu, baixando a cabeça, enquanto o ex-colega escrevia no copo.

Quando a ruivinha começou a gritar "Tonho da Lua" de trás do balcão, com seu cappuccino na mão, Ricardo teve vontade de ir embora sem pegar a bebida. Todos na cafeteria olhavam em direção à garota e riam, enquanto ele se dirigia até ela. "Meu nome é Ricardo", falou, baixinho, quando pegou o copo de sua mão. A garota ficou alguns segundos olhando para ele, sem entender o que tinha acontecido, até que pareceu se dar conta, ao ver o André se dobrando de rir, no caixa.

Alguns minutos depois, ele tomava o cappuccino de cabeça baixa quando percebeu que alguém estava parado ao seu lado. Olhou para cima e viu a garota ruiva olhando para ele, com ar grave.

- Me desculpe! - disse ela, séria - Eu não sabia que ele tinha feito aquilo para te provocar.

Ricardo ficou em dúvida se a menina estava tirando sarro da sua cara. Ninguém nunca havia pedido desculpas para ele depois de uma zombaria.

- Meu nome é Solange! - continuou ela, estendendo a mão para ele.

- Ricardo. - respondeu, apertando a mão da garota, ainda sem saber qual atitude tomar.

- Que tal tomarmos uma cerveja um dia desses, por minha conta? Para eu poder me redimir. - disse ela sorrindo.

- Claro. - disse ele, desconfiado de que aquilo poderia ser alguma outra pegadinha idiota de André.

- Esse é o meu telefone. - ela estendeu um pedaço de papel para ele, com o número anotado - Mande uma mensagem para a gente combinar.

Ricardo voltou algumas vezes à cafeteria, mas nunca teve coragem de mandar a mensagem. Agora ela estava ali na sua frente. Na sua imaginação, ele sabia que não deveria, em hipótese alguma, ir falar com ela.

Solange acenou para Ricardo, sorridente, e ele atravessou a avenida. Ela usava um vestido curto, de saia rodada, que fazia com que ela parecesse bem mais nova que seus vinte anos recém completados. Tinha cerca de um metro e sessenta de altura, sendo uns dez centímetros mais baixa que ele. Os cabelos vermelhos eram cacheados e caiam um pouco abaixo de seu ombro, que, assim como o rosto, era coberto de pequenas sardas. Os olhos eram verdes e sempre passavam um ar de divertimento.

- Olá, Ricardo! - disse ela - Está indo no Starbucks?

Ele pensou em responder que não havia nenhum motivo para ir até a cafeteria, já que ela não estava lá, mas disse apenas: "Não".

A Busca  (Concluído)Onde histórias criam vida. Descubra agora