Erva - mate

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Há muitos e muitos anos, no tempo dos Tapes, uma grande tribo de fala guarani estava de partida. Precisavam encontrar um outro lugar para morar onde a caça fosse farta e a terra fértil. Lentamente os índios foram deixando a aldeia onde haviam vivido tantos anos.

Quando não havia mais ninguém, pelo menos era o que parecia, de repente, pássaros voam assustados. O couro que cobria a entrada de uma cabana foi afastado e surge um velho índio, curvado pelo peso dos anos e com os cabelos completamente brancos. Atrás dele caminha uma linda jovem índia. Ele é um velho guerreiro sem forças para acompanhar a tribo em busca de novas terras. Ela chamava-se Yari e era sua filha mais nova, que não teve coragem de abandonar seu velho pai, certa que sozinho ele não iria sobreviver.

Numa triste tarde de inverno, o velho entretido colhendo algumas frutas, assustou-se quando viu mexer-se uma folhagem próxima. Pensou que fosse uma onça, mas surgia ali um homem branco muito forte, de olhos cor do céu e vestido com roupas coloridas.
Aproximou-se e disse-lhe:
- Venho de muito longe e há dias ando sem parar. Estou cansado e queria repousar um pouco. Poderia arranjar-me uma rede e algo para comer?

- Sim, respondeu o velho índio, mesmo sabendo que sua comida era muito escassa.

Quando chegaram à sua cabana, ele apresentou ao visitante a sua filha.
Yari acendeu o fogo e preparou algo para o moço comer. O estranho comeu com muito apetite. O velho e a filha cederam-lhe a cabana e foram dormir em uma das outras abandonadas.

Ao amanhecer o velho índio encontrou o homem branco e fez tudo para que ele parasse. O outro, porém, respondeu-lhe que tinha percebido a necessidade dos dois e se propunha a ajudar. Embrenhou-se em direção à floresta. Depois de algum tempo retornou com várias caças.

- Vocês merecem muito mais. Explicou o homem. Ninguém já me acolheu com tanta hospitalidade, me dando tudo o que possuíam.

Falou também que tinha sido enviado por Tupã, que encontrava-se muito preocupado com a sorte dos dois.

- Pela acolhida que recebi, lhes reservo o direito de atender a um pedido. Diga o que deseja!

O pobre velho queria um amigo que lhe fizesse companhia até o findar de seus dias, para que pudesse deixar de ser um fardo para sua doce e jovem filha.
O estranho levou-lhe então até uma erva mais estranha ainda dizendo:

- Esta é a erva-mate. Plante-a e deixa que ela cresça e faça-a multiplicar-se. Deve arrancar-lhe as folhas, fervê-las e tomar como chá. Suas forças se renovarão e poderá voltar a caçar e fazer o que quiser. Sua filha poderá então retornar a sua tribo.

Yari resolveu que de qualquer jeito jamais ficaria para fazer companhia ao pai. Pela sua dedicação e zelo, o enviado do tupã sorriu emocionado e disse:
- Por ser tão boa filha, a partir deste momento passará a ser conhecida como Caá-Yari, a deusa protetora dos ervais. Cuidará para que o mate jamais deixe de existir e fará com que os outros o conheçam e bebam a fim de serem fortes e felizes.

Logo depois o estranho partiu, mas deixou na cabeça de Yari uma grande dúvida: como poderia ela, vivendo afastada das demais tribos divulgar o uso da tal erva? E o tempo foi passando...

Em uma tribo não muito distante dali, os índios estavam contentes com a fartura das caçadas. Organizaram uma grande festa para comemorar, não faltava comida e muita bebida. Mas a bebida demais levou dois jovens índios a começaram a discutir. Tratava-se de Piraúna e Jaguaretê. Da discussão ao enfrentamento foi um passo.
No furor da briga Jaguaretê empunha um tacape e dá violento golpe na cabeça de Piraúna, matando-o. Jaguaretê foi então detido e amarrado ao poste das torturas. Pelas leis da tribo, os parentes do morto deveriam executar o assassino. Trouxeram imediatamente o pai de Piraúna para que ordenasse a execução. Muito consciente que a tragédia só aconteceu por estarem os jovens sob o efeito da bebida, liberou o Jaguaretê, que foi então expulso da tribo e foi buscar sua sorte no seio da floresta e quem sabe nos braços de Anhangá, espírito mau da mata.

Glossário Da Mitologia Brasileira - V.L.II Onde histórias criam vida. Descubra agora