Capítulo 7

9 1 0
                                    

Além das crianças de Bernardo, outras crianças do orfanato também foram para o mesmo passeio. O ônibus dirigiu pela cidade por cerca de meia hora, o que para as crianças era sempre uma eternidade.

-Porque não diz logo para onde a gente está indo?

Um dos objetivos estava cumprido. Bernardo conseguiu criar uma forma de fazer Guilhermo se reaproximar.

-A última pessoa para quem quero contar é você. - Sorriu. - Como eu disse antes de sairmos, isso é um presente para vocês para me desculpar pelo que houve no outro dia, e é principalmente a você que devo desculpas! Só mais dez minutos e vamos chegar!

-Isso não é justo!

-Você vai gostar, eu prometo! Está animado Theo?

Sentado do seu outro lado no ônibus, o garoto estava em silêncio como sempre, ainda confuso sobre como as coisas mudaram de um dia para outro. Quer dizer, ao menos era assim que parecia para ele.

-Acho que sim. - Respondeu, sem levantar os olhos.

Seus pais. Claramente eram os seus pais. Aquela era uma problemática que jamais iria se resolver sozinha. Foi então que Bernardo teve uma ideia que poderia ajudar muito o garoto. Pegou o celular e anotou para não esquecer. Cuidaria disso assim que voltassem para o orfanato.

-Se você está tentando me comprar, eu não vou voltar a falar com você como antes só porque estamos indo em um passeio hoje! - Guilhermo. A princípio, tentando chamar a atenção de Bernardo para ele.

-Não estou tentando te comprar! Essas coisas não podem ser compradas! Não pode usar os sentimentos das pessoas como moeda de troca! E, se eu não soube explicar, isso não é só sobre você, Guilhermo! Isso é sobre todos nós aqui! E por isso, estamos todos juntos!

-Certo.

-Ah, garoto! - Riu-se, lhe fazendo um carinho no cabelo. - Você ainda tem muito a crescer!

-Para! – Reclamou, emburrado, tentando afastar sua mão.

* * *

-Sim? Gabriela, novamente? Ok, certo. Outro casal, certo? Mande-me os documentos da habilitação de adotante deles, e já marcamos para esse final de semana. Sim, vou avisar o Bernardo. Certo, qualquer coisa me mantenha informado.

Era o conselheiro tutelar falando com o sr. Caetano pelo telefone. Um novo casal com habilitação para adotar interessado em uma criança. As características que solicitaram batia com Gabriela. O casal a escolheu entre as possíveis. O próximo passo era que Gabriela passasse um final de semana com eles para ver como seria, se ela ia gostar do tempo com eles, e se se criaria algum tipo de laço entre ela e o casal. O que faria com que novamente o Sr. Caetano se preocupasse com Guilhermo. O garoto já andava de humor instável depois de Bernardo ter brigado feio com ele naquele dia. Estava melhorando. Mas agora, que Gabriela podia ir embora, as coisas podiam ficar muito mais difíceis.

* * *

Então, o ônibus parou em um lugar. Parecia uma loja com letra gigantes em cima da entrada com os dizeres "Diverzione – Festas Infantis". E uma música animada tocando lá dentro os aguardava.

-Obrigado, Jair. - Agradeceu Bernardo, ao motorista, e em seguida, virou-se para as crianças. - Senhores, o Diverzione é um espaço especial para festas de crianças, e vocês vão encontrar todo tipo de brinquedos de festas, desde pula-pula, piscina de bolinhas até máquinas de fliperama para jogar videogame! Nós podemos ficar aqui por três horas até o momento do almoço, então, sintam-se livres para se divertirem! As regras vocês já sabem, e quem quebrar uma regra vai ficar comigo e com os cuidadores e não vai mais brincar até a gente voltar, entenderam?

-Sim, tio! - Uníssono.

-Muito bem! Então vamos entrar em fila como combinamos e em silêncio! Vamos dar bom dia para quem nos receber e vamos sorrir para todos!

Os sorrisos das crianças naquele momento era uma recompensa a parte. Até mesmo Theo, que, mesmo não se lembrando de muitas coisas, por vir de família de classe média, já tinha estado no Diverzione algumas vezes. Até mesmo sua festa de aniversário uma certa vez tinha sido ali.

Agora sim, ao contrário do ônibus, as horas começaram a se passar rápido como o vento. As crianças adoraram aquele lugar. Era como se fosse o paraíso para elas. No final, as crianças estavam felizes e satisfeitas. E aparentemente, Bernardo conseguiu cumprir seu plano de afastar da cabeça deles a imagem que seu surto com Guilhermo tinha deixado.

Agora, tinha outra coisa para fazer. Tinha se ausentado por um tempo do Diverzione enquanto as crianças brincavam para comprar algo para o Theo. Algo que o ajudaria muito a lidar consigo mesmo, e que o entregaria quando chegasse ao orfanato.

* * *

-Bernardo, quero falar com você na minha sala. Agora.

Foi assim que o senhor Caetano o recepcionou quando chegou, junto com as crianças. Seu olhar era bastante sério, o que deixava claro que havia um assunto bastante complicado a se conversar.

-Sim, senhor, estou indo imediatamente.

Minutos depois, Bernardo estava de frente para ele em sua sala, apreensivo.

-É sobre hoje? Eu fiz algo errado, senhor?

-Recebi uma ligação do conselho. O próximo casal na fila de adoção tem interesse em uma garotinha mais velha. Entre as que foram indicadas como disponíveis, estava Gabriela. Eles gostaram dela.

-Deus, agora não!

-Sei que Guilhermo não está nos seus melhores dias e esse é o problema. Vamos ter que preparar ele para se separar dela de novo. Digo, não podemos esperar ter a mesma sorte de antes.

Da última vez que tentaram adotar Gabriela, Bernardo vetou a adoção. Quando a criança tem doze anos ou menos, cabe ao seu pai ou mãe social aprovar ou não perante o juiz a adoção, do contrário, a própria criança pode dizer se a deseja. E, da última vez Bernardo vetou a adoção não somente por causa do Guilhermo, mas porque, quando Gabriela voltou para o orfanato, após passar o final de semana, mesmo dizendo que estava tudo bem, não dava sinais de ter se adaptado bem. E, por melhor que Bernardo as tratasse da melhor forma possível ali, que criança não quer uma família de verdade? Aquele casal eram pessoas simples, pareciam ser bem intencionadas e pelo sim, pelo não, estavam legalmente habilitadas para a adoção, mas isso também dependia de Gabriela estar bem com isso. E se ela não estava feliz quando voltou, não precisava de outros motivos para o veto. Mas agora, a escolha era de Gabriela, e ela poderia ir embora se quisesse. Logo, Guilhermo precisava ser preparado para lidar com uma possível separação.

O fato é que, Guilhermo gostava dela. Gostava de um jeito inesperado. Não somente porque era um garoto de treze anos, quase quatorze, mas de um jeito realmente especial. E ela também gostava dele. Da última vez, disse que voltaria para vê-lo, e por certo era verdade. Certamente diria dessa vez e também seria verdade.

-Eu... Eu vou conversar com eles dois hoje. Obrigado por avisar.

-Se precisar de algo...

-São minhas crianças, senhor Caetano. Meu fardo. Eu vou dar um jeito de lidar com isso. Obrigado.


<< Continua. >>

Mais que MemóriasOnde histórias criam vida. Descubra agora