Mal de Parkinson

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Mal de Parkinson

O Mal de Parkinson é uma doença que afeta pessoas com mais de 65 anos ou que tem lesões na cabeça, frequentes ou isoladas, ocorre perda de neurônios numa área do cérebro chamada substância negra. Essa falta de neurônios causa a deficiência de dopamina, trazendo à pessoa a dificuldade de controlar seus movimentos. Quando toda a dopamina se esvai do corpo, ocorre paralisia, os músculos se atrofiam e nem mesmo força para levar uma colher à boca, a pessoa tem. Bem, Lia não sabia disso. Devo ressaltar que essa história se passa no Brasil, onde a saúde pública não é uma das melhores.

Um dia Lia levou sua mãe ao médico, ele pediu para que a mãe da menina fizesse alguns exames e uma tomografia. Sem conhecer esse mundo da doença, Lia ouviu o neurologista falar que a doença não era algo tão grave, mas que também não tinha cura. Talvez aquele neurologista achasse que a vida das duas seria bem fácil. Mas você e eu deduzimos que não foi.

Os anos se passaram. Lia descobriu que tinha sofrido um estupro. Campanhas de conscientização em sua escola lhe disseram isso, no entanto, as pessoas viam aquilo com tanta raiva e tanto desprezo que a adolescente estava achando que se tivesse realmente sofrido aquilo, seria algo muito pior. Os relatos que levaram até a escola foram de jovens que tiveram em seu sexo barras de ferro ou algo semelhante. Com Lia não ocorreu assim, então ela deduziu que não havia sofrido um estupro.

Se ela não foi estuprada, por que quase todos os dias ela tinha pesadelos com algo semelhante? Por que tinha medo de ficar no mesmo ambiente que homens mais velhos? Por que se sentia tão desprezível? No ensino fundamental II Lia se distanciou da perfeição que exigia de si mesma na escola, começou a perceber que poucas pessoas ligavam para a sua existência, e começou a fase que até os dias de hoje ela tenta não se lembrar: a fase depressiva. Não é segredo nenhum que qualquer pessoa que é humilhada e alienada do mundo se sinta triste. Com Lia foi só questão de tempo.

Ela amava cantar na igreja, mas houve um dia que lhe disseram que cantava extremamente mal e lhe obrigaram a parar, houve outro dia também onde um garoto que ela estava afim disse em sua cara que ela era extremamente feia e que ele nunca iria querer nada com ela, sem contar também, aquele outro dia onde sua própria avó lhe dizia palavras que afetavam a sua estima. O que faria Lia depois de tantos comentários ruins e pessimistas?

Dois anos depois seu padrasto voltou para casa. Lia já entendia o que havia acontecido naquela noite em sua infância. Agora não tinha mais respeito por ele, tinha medo. A diferença entre o respeito e o medo que Lia sentia era bem simples: quando ela o respeitava, ela simplesmente aceitava suas ordens, viva tranquila, quando ela sentia medo, ela não dormia antes que todo mundo, não ficava sozinha em casa, passava mais tempo na escola. Lia tentava ao máximo não se aproximar dele.

Um dia, Lia saiu de casa, ia visitar um amigo, mas quando voltou, viu seu padrasto e sua mãe brigando, eles discordavam em deixar Lia sair de casa. A mãe de Lia queria que a menina fizesse amizades, mas seu padrasto não, ele queria que a adolescente ficasse presa dentro de casa o tempo todo. "Eu seria capaz de quebrar as pernas dela, os braços e teria prazer em dar pra ela a comida na boca do que ver ela saindo por aí" palavras dele. A menina não suportou.

Brigou, gritou, xingou. E como todas as pessoas alteradas, ele tentou fazer justiça com as próprias mãos. Partiu para cima da menina, um homem vinte anos mais velho que a garota, tentou, mesmo vendo que estava fazendo algo errado, estrangular a adolescente. Ela simplesmente deixou que ele a matasse ali mesmo. Estava cansada dessa vida de horror. Havia anos que procurava uma solução para vida, um sentido para vida mas não encontrava, procurou em todos os lugares mas não encontrou, se morresse ali não faria diferença, seria uma a menos pagando impostos no país.

Sua mãe gritou, ele soltou a garota, e virou as costas, tempo exato de Lia pegar uma vassoura que estava ao seu lado e acertar em sua nuca. O homem caiu desmaiado e, correndo para arrumar suas coisas, a menina virou as costas e saiu daquela casa com sua mãe. Não queria nunca mais ver um homem como aquele, não queria nunca mais ver aquele homem, não queria nunca mais sofrer de novo. Se pudesse veria aquele homem morto, mas não era capaz disso, sua boa índole a impedia de o fazer.

Ela e sua mãe fugiram para São Paulo, onde vivia boa parte da família. Lá a menina se esforçou e conseguiu, tentou e superou, se esforçou e venceu.

Lia agora era psicóloga, tentava ao máximo ajudar as pessoas que sofriam violências no lar, tanto física ou mental, dava palestras e atendia em consultório, que a própria comprou com o seu dinheiro. E, para terminar, vou deixar que a própria conte a você, o que contou numa palestra que deu no Rio de Janeiro sobre a sua vida:

"Quando o Mal de Parkinson invadiu o meu lar, bem, eu não sabia o que fazer, ouvi as palavras do médico e achei que era tão simples como uma gripe. Anos depois descobri que era muito sério. Minha mãe começou a falar baixo, ter dificuldades em engolir qualquer coisa que comia, não andava e eu precisava dar a ela a comida na boca porque não tinha força de levantar a mão. Nesse tempo eu estudei. Difícil, mas estudei. Com a aposentadoria dela, não tinha como pagar uma faculdade. E eu sempre almejei a USP, Universidade de São Paulo, uma das melhores do país. Ninguém me faria desistir do meu sonho. Estudei dia após dia. Ia sempre à biblioteca da minha antiga escola para usar a internet e o computador, passava necessidades em casa, mas meu foco não saía de mim. Eu lembro-me de uma época em que eu usava meu óculos pendurado com esparadrapo, porque não tinha dinheiro para outro."

"Seis meses depois eu fiz o ENEM. Consegui entrar na USP. Agora eu só precisava terminar e conseguir meu diploma. Bem, cá estou eu. A proposta dessa palestra e toda a minha historia é pedir que não desista de estudar. A sua vida se transforma com o estudo e com o que você pode fazer com os estudos. Ame estudar como você ama se divertir. Queira ser alguém mesmo no pior lugar do fundo do poço."

E é com essas palavras que eu, Lia Santana, termino meu conto, te dizendo que no pior lugar do fundo do poço, tem uma luz, que no pior lugar do fundo do poço, tem uma esperança. Eu consegui, você também consegue. Nem tudo é tão difícil, sorria na dificuldade, se alegre quando estiver triste, acenda uma luz quando o mundo te colocar num quarto escuro. A pequena Lia não podia imaginar o quão belo o mundo pode ser depois de um sorriso.

A história da menininha que teve a sua vida destruída no auge dos oito anos de idade é essa. Se você está triste agora, olhe para céu, veja quão imenso ele é. A sua vida é assim. Nós não vemos o fim o céu, depois do horizonte ainda existe muito dele, e ainda existe muita vida para se viver. Não queira desistir de um caminho inteiro por que uma pedrinha apareceu no chão. Passe por cima dela, ou chute-a fora dali. Você consegue, eu sei disso, seu potencial vai além daquilo que você imagina. Esperança é a base de uma vida feliz. Esperança que algo melhor você viverá.

Obrigada por ler a minha história, a pequena Lia, agradece, agradece que você, deixou um tempinho para saber sua história.

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E A Garotinha Chorou (Concluído)Onde histórias criam vida. Descubra agora