IX

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Enfiei a cabeça nos travesseiros, tentando bloquear o barulho de minhas alucinações a todo custo, ouvindo elas gritarem cada vez mais alto.

"OLHE PARA MIM!" a voz de minha mãe gritou, me fazendo me encolher ainda mais

"PARE DE SE ESCONDER DE MIM!" a voz do meu pai doía como se eu tivesse pedras sendo jogadas em meu corpo

"Olivia?" percebi uma voz distante em meio aos gritos de meus pais

"Você não pode se esconder para sempre." a voz da minha mãe parecia uma ameaça agora, mas eu ainda não a olhava

"Vá embora!" 

"Olivia!" a voz distante pareceu ficar um pouco mais clara, mas eu não a dei atenção

"Olhe para mim! OLHE PARA MIM!

"ME DEIXE EM PAZ!" 

Bati com meu punho na moldura da cama, sentindo minha mão ficar presa na madeira, em meio ao buraco que eu havia feito, as pontas da madeira entrando em minha pele. Quando alguém me tocou, me movi com rapidez, achando que minhas alucinações tivessem chegado a um nível extremo, mas logo vi Ezekiel ao meu lado, parecendo assustado.

Seus olhos olhavam para meu rosto e minha mão presa na madeira, e eu podia ver a confusão e a preocupação dentro deles, mesmo no escuro da madrugada.

"Olivia, o que-" ele se interrompeu, tentando tirar minha mão da madeira, recebendo uma reclamação de dor minha e parando imediatamente "Você estava gritando! Estava tendo um pesadelo?"

Não o respondi, umedecendo os lábios antes de puxar a mão com toda força, fazendo cortes fundos na pele de minha mão. Trinquei os dentes, contendo um grito de dor, e segurei minha mão perto de meu corpo. Ezekiel parecia desolado ao me ver daquela maneira, e tentei me recuperar do surto, na esperança que ele se acalmasse.

"Foi só um pesadelo. Não se preocupe."

"Você é horrível em mentiras, Olivia." ele balançou a cabeça "O que estava acontecendo?"

O olhei, agora com medo, vendo-o franzir o cenho com minha reação. Ele iria achar que eu estava louca se eu contasse, mas, se eu não contasse a ele, a quem mais contaria? Fechei os olhos por um momento, sentindo minha mão começar a se regenerar, e sentei na cama, olhando para qualquer lugar que não fossem os olhos de Ezekiel.

Não enrolei, não tentei fingir que estava tudo bem, apenas expliquei tudo, desde a noite em que li a carta de Azriel, até aquele momento. Ezekiel me olhava com atenção, ouvindo cada palavra que eu dizia com atenção. Era difícil dizer o que ele pensava naquele momento.

Assim que terminei, Ezekiel pareceu tomar uma expressão de raiva, e eu recuei um pouco, me perguntando se tinha falado algo de errado.

"Cinco dias." ele falou num tom monótono "Cinco dias você vem sofrendo com isso e não abriu a boca para pedir ajuda?"

"O que você queria? Que eu saísse por aí dizendo que estava tendo alucinações com Azriel e que na verdade ele era eu, era minha culpa e medo, como se isso fosse alguma metáfora filosófica?"

"Não queria que saísse por aí, queria que me dissesse!" ele passou a mão no rosto, sua expressão suavizando levemente "Você tem que aprender a pedir ajuda, criança."

"Bem, eu estou pedindo agora." deixei que o cansaço tomasse conta, afundando a cabeça em meus travesseiros "Eu não consigo encarar a mim mesma e a toda essa culpa. Eu aprendi a conviver com elas, aprendi a aceitar que a culpa era minha. Como eu poderia mudar isso de uma hora para a outra?"

Races - Livro 3: Ghouls (Concluído)Onde histórias criam vida. Descubra agora