'Estuprada durante o parto': o inferno das mulheres latinas traficadas em Londre

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"O que eu testemunhei naquele dia foi uma das coisas mais perturbadoras que já vi na vida", diz Yenny Aude, então funcionária de uma ONG que apoia mulheres latino-americanas no Reino Unido.

Ela fala do dia em que descobriu o caso de uma latina traficada para Londres. Eram 11 da manhã quando atendeu o telefonema de um policial.

"Ele disse que haviam achado uma mulher em uma casa que estava envolvida com prostituição e tinha ferimentos muito graves porque havia sido muito maltratada", relembra Yenny, hoje diretora da Latin American Women's Aid (Lawa, na sigla em inglês).
O policial disse que ela estava "muito alterada, está gritando". "Fala um idioma que não entendemos, talvez seja português. Vocês podem vir, por favor?".

Yenny, da Lawa, pediu a uma amiga que fala português para acompanhá-la. No local, percebeu que a vítima de 26 anos era colombiana. "Quando ela foi encontrada, ela estava pendurada e perdendo muito sangue. Estava sofrendo um aborto e sendo estuprada ao mesmo tempo."

Tortura

O caso ocorrido em 2010 ilustra o pesadelo de muitas mulheres que vão parar na Inglaterra desta forma. Como tantas outras, a vítima havia saído da Colômbia rumo à Espanha com a intenção de trabalhar, mas foi enganada.

Quando chegou ao país, tomaram seus documentos e a forçaram a se prostituir "por alguns anos". "Quando falei com ela pela primeira vez, perguntei se sabia onde estava, e ela disse: 'Na Espanha?'. Não lembrava-se de como havia ido parar em Londres", afirma Yenny.

"Uma coisa é forçar alguém a fazer um trabalho sexual e outra é tortura. Ela tinha sido torturada."

A mulher foi levada a um abrigo que a Lawa mantém para latinas vítimas de violência de gênero na Inglaterra - o único do tipo na Europa. Seguiram-se meses de terapia e apoio emocional até que a jovem decidisse contar sua história.
Ela disse ter vivido em muitas casas diferentes, mas não saber onde ficavam, porque era proibida de sair. Seus deslocamentos eram sempre de carro.

Lembrava-se de escutar na última casa gritos de mulheres em outros quartos. Ela não as conhecia, porque não era permitido que se comunicassem. Quando queriam ir ao banheiro, um membro da quadrilha de prostituição as escoltava, para que não pudessem se falar.

Em determinado momento, os sequestradores começaram a tirar as outras jovens da casa, até que a colombiana ficou sozinha. Homens continuavam sendo admitidos para estuprá-la, inclusive enquanto estava grávida

Depois do resgate, Yenny Aude ficou sabendo que os vizinhos avisaram à polícia terem ouvido gritos de uma mulher vindos da casa. Mas, quando os agentes iam até lá, não conseguiam escutar nada, e ninguém abria a porta quando chamavam.

Os berros persistentes e desesperados da mulher ao ser estuprada enquanto perdia um bebê fizeram com que a colombiana fosse decoberta. "Quando a conheci, ela praticamente não tinha dentes, e havia buracos no seu cabelo", relembra Yenny.

A jovem contou que, quando não fazia algo que seus sequestradores queriam, tinha dentes ou fios de cabelo arrancados. Ela recebeu a ajuda necessária para recuperar-se dos ferimentos e passou por uma cirurgia de reconstrução vaginal.

"Ela queria voltar a ser como era quando saiu da Colômbia. Mostrou uma foto e, quando comparei com a pessoa na minha frente, vi que eram duas pessoas totalmente diferentes."

Inicialmente, ela não levantava a cabeça se havia um homem próximo. Quando sentiu-se mais forte, decidiu voltar para a Colômbia e deixou um bilhete ao sair do abrigo que dizia apenas: "Muito obrigada por tudo".

Abuso

À primeira vista, Ana (nome trocado para proteger sua identidade) surpreende pela juventude e vitalidade depois de sobreviver ao cativeiro. Ela saiu da América do Sul para a Inglaterra pela primeira vez em 2000. Tinha 18 anos.

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