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São Paulo, abril de 2015, sexta-feira, 7:15h

De alguma forma, senti que aquele dia amanheceu mais bonito, ou talvez, só mais feliz. Mesmo não tendo dormido desde as duas da manhã – quando acordara daquele sonho – parecia que nunca havia me sentido melhor. Eu não consigo mensurar o que cada um dos minutos daqueles vídeos fizeram comigo, foi como se, em meio à escuridão de uma noite fria, surgisse uma luz, como se a vida finalmente tivesse se enchido de cor. Não foi difícil nem mesmo sair do quarto naquele dia, Camila com certeza reparou que eu estava diferente dos outros dias, mais animada, posso dizer, pois, assim que me viu na sala, logo disse:

— Nos últimos dias você mal saía de dentro do quarto, e hoje já sai com esse sorriso?! O que aconteceu?

— O que aconteceu nos últimos dias, ou o que me fez sorrir hoje?

— As duas coisas. Tenho andado sem tempo, eu sei, e sinto muito, muito mesmo por isso. Mas acho que ainda posso saber, não?

— Passei por um momento ruim, mais um na verdade – ela ouvia, aparentando estar realmente curiosa – Então, eu conheci pessoas. Quero dizer, tecnicamente não as conheci de verdade, mal sei seus nomes e...

— Acho que entendi, elas te fizeram se sentir melhor. – assenti e ela continuou – Fico feliz por isso e me desculpa por não estar dispondo tanto de tempo.

— Não é culpa sua, sei que não é, mas obrigada por se preocupar, significa muito. – a abracei agradecendo, era verdade, mesmo depois que tudo havia passado, significava muito que ela, de alguma forma, se importasse.

— Saudades da nossa infância, quanto tínhamos tempo para tudo. A vida adulta só nos dá tempo para reclamar dela mesma. Mas, espera, quem são essas pessoas e porque você "tecnicamente não as conheceu"? – falou, fazendo aspas com os dedos.

— Foi pela internet, isso vai parecer bobo, mas ontem eu estava realmente mal e, resolvi sair à tarde antes que eu ficasse pior do que estava, e então acabei descobrindo um canal no YouTube que realmente mudou completamente como eu estava me sentindo.

— Espera, deixa eu entender: você saiu para caminhar ontem, e depois disso conheceu esse canal? – confirmei – O que exatamente uma coisa tem a ver com a outra?

— Eu descobri um Teatro, não muito longe daqui. Por favor, não me pergunte como nem porque fui parar lá. – ela riu baixo e então continuei – Eu não estava me sentindo muito bem, e um rapaz que estava lá perto achou que eu estava lá para assistir a um dos espetáculos, quando neguei, ele me recomendou que eu assistisse a esse canal e, bem, cá estou eu, pela primeira vez fazendo algo certo ao seguir o conselho de um estranho.

— Então, resumindo: você conheceu o Tuca e agora está se sentindo melhor por ter conhecido os Barbixas? É isso mesmo?

— Espera, você os conhece?

— Os assisti uma vez, já faz um tempo, fui em companhia de uma colega da faculdade que na época era fã deles. Sinceramente, na época não gostei muito, acho que não é o tipo de coisa que me atrai, mas fico feliz que eles tenham te mudado de alguma forma.

— Sabe o que é mais estranho? Eles são os homens daquela foto que achei no aeroporto assim que cheguei aqui, tecnicamente, já os conheço há um bom tempo.

— Sabia que eles me eram familiares quando os vi! Se soubesse que eram eles, teria dado um jeito de dizer que em algum lugar não muito longe tinha alguém querendo lhes devolver algo.

— Quem sabe não está chegando a hora? Nunca senti tanta vontade de fazer algo como estou sentindo de vê-los, eu tenho de agradecer, por terem me tirado de um momento péssimo.

— Bom, se ainda mantiverem-se como estavam na época que os vi, toda quinta-feira tem espetáculo naquele mesmo Teatro. Escolhe uma semana e se permite ser ainda mais feliz.

— Farei isso, obrigada. – ela sorriu e eu me despedi, mesmo ainda estando alguns minutos adiantada do meu horário de saída para o trabalho – Não vai querer ir comigo? Digo, para assistí-los, dá uma chance, vai que agora você gosta.

— Esse mês não dá, de alguma maneira conseguiram me deixar mais atarefada que nos três últimos meses. Mas numa próxima, talvez eu vá. Agora, eu no seu lugar já procuraria um ingresso, se na época eles já lotavam um Teatro, não acho que esteja muito diferente agora.

Concordei e saí, naquele dia, no trabalho, mal me concentrei, meus pensamentos foram tomados pelas imagens daquelas três pessoas e não pude deixar de sorrir ao perceber que, em tão pouco tempo, eles haviam me transformado, ou melhor, me completado tanto.

São Paulo, abril de 2015, segunda-feira, 15:12h

Uma pane elétrica havia me dado folga àquela tarde e, meia hora depois de chegar em casa, quando a energia já havia sido estabelecida, resolvi sair, mas não como na quinta-feira anterior, daquela vez eu estava me sentindo bem. Havia passado o fim de semana conhecendo mais sobre aquele canal e aquelas pessoas que haviam me alegrado tanto; já sabia os nomes deles e de praticamente todos os jogos do Improvável, já havia assistido aos esquetes e honestamente não sabia dizer qual parte daquilo tudo havia me encantado mais, então, resolvi tomar o caminho da quinta-feira anterior que, mesmo inesperadamente, mudara a minha vida. Na bilheteria do Teatro, me informaram que o espetáculo daquela semana já estava lotado, mas que, para a semana seguinte haviam recém iniciado-se as vendas, então garanti o meu ingresso. Eu merecia aquilo, mesmo em tão pouco tempo, eles haviam me ajudado, eu tinha muito o que agradecer.

Ainda faltavam dez dias para aquele momento, mas, para quem já havia vivido por vinte e dois anos em meio ao preto e branco, dez dias não seriam nada...

Não precisa ser o fimOnde histórias criam vida. Descubra agora