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São Paulo, quinta-feira, abril de 2015, 6:10h

O despertador me acordou naquela manhã como em todas as outras. Levantei pensando ser apenas mais um dia comum; ao olhar para a prateleira e ver aquele ingresso porém, lembrei-me de que ali, naquela quinta-feira, finalmente chegaria o meu momento; o dia, ou melhor, a noite de conhecer as três pessoas que, da maneira mais simples do mundo, foram capazes de fazer sumir uma das piores – senão a pior das – sensações que já havia passado. Ao parar na frente do espelho, analisei o meu reflexo; as olheiras acumuladas em algumas noites mal dormidas ainda estavam ali, mas havia algo a mais; um sorriso estava começando a se formar misturado a uma sensação de euforia.

— Como pude esquecer desta noite?? – questionei ao reflexo, como se ele pudesse realmente me responder.

Foram míseros segundos, é verdade, mas nos dias que antecederam aquele, a ansiedade por aquele momento jamais me abandonou. Talvez a culpa do rápido "esquecimento" nem fosse minha, ou ao menos não totalmente. Acostumei-me aos dias monótonos, podia contar nos dedos os poucos em que deixava de me sentir fora de mim e do mundo em que vivo; mas aquele dia não seria como os outros, não podia ser!

O trabalho não me foi interessante naquele dia, a todo momento, eu me pegava olhando o relógio e desejando que a hora esperada chegasse mais rápido, mas era como se o relógio funcionasse em sentido anti-horário.

Cheguei de volta em casa por volta das 18:30h, então fui direto para o chuveiro e depois me arrumar. Quando finalmente me senti satisfeita comigo mesma, saí de casa, não sem antes guardar na bolsa o ingresso e a foto, havia chegado o dia, depois de cinco anos, a minha primeira lembrança de São Paulo voltaria ao seu verdadeiro dono.

Depois de descoberto por acaso, aquele caminho passou a ser parte dos meus pensamentos por vários dias. Depois de andar por aquelas ruas que agora já conhecia, à minha frente estava ele, o Teatro Tuca. Lá dentro, o palco que era fonte das minhas alegrias, mesmo nunca o tendo visto pessoalmente até então.

Antes de entrar, foi como se o fantasma da minha insegurança tivesse surgido fazendo com que eu me questionasse se deveria mesmo estar ali, ele me fez sentir como uma menina perdida, que não sabe onde está ou para onde ir, então eu parei e me questionei: Será que tudo não passava de mais um sonho? Era bom demais para ser realidade.

Naquele momento, lembrei de tudo que já havia passado, de todas as noites de crise em que chorei até adormecer, enquanto lutava para encontrar um ponto de esperança que me permitisse viver, eles haviam sido esse ponto de esperança e refúgio. Uma lágrima escorreu enquanto as recordações pairavam sobre minha mente, senti então como se alguém esbarrasse em mim, levantei o rosto com cuidado, tinha de me desculpar por ocupar o caminho, foi então que meu olhar se encontrou com o dele, com aqueles olhos castanhos que diziam mais sobre ele do que ele pensava. Antes que pudesse assimilar tudo e me desculpar, ele disse:

— Desculpe, estava desatento. Você está bem?

As palavras me fugiram àquela hora e, sem conseguir dizer nada, apenas assenti, ele então sorriu e seguiu apressado – estava atrasado, presumi – rumo ao interior do Teatro. Adentrei aquele lugar também, ainda surpresa com o que acabara de acontecer; não é todo dia que Daniel Nascimento esbarra em você enquanto você pensa em todo o bem que eles lhe fizeram.

Havia falhado em não planejar grandes coisas para sugerir em forma de cenas e frases, escrevi coisas simples, as primeiras que pude pensar, pouco me importava que saíssem ou não, só o que queria era que eles pudessem, de alguma forma, tornar aquela noite a melhor da minha vida, e pelo que já conhecia deles, sabia que não seria difícil.

Quando cheguei ao meu lugar, na primeira fileira, olhei ao redor, para todas as pessoas daquela platéia, todos que estavam ali pareciam não só felizes mas também ansiosos por aquele momento. Ouvi, sem querer, alguém na segunda fileira comentar com a pessoa ao seu lado que estava muito feliz por estar ali, acompanhava-os à distância há seis anos e até então, não os tinha podido ver pessoalmente, sorri ao ouvir aquilo; ela sonhara com aquele momento por anos, eu também sonhara mas por poucos dias e, ambas estávamos ali, pois os melhores sonhos não acontecem quando queremos e sim quando precisamos que aconteçam, no lugar certo e na hora certa.

Uma. Duas. Três campainhas me tiraram dos meus pensamentos. Estava começando. O mestre de cerimônias da noite – Edu Nunes – subiu ao palco arrancando gritos e aplausos de toda a platéia, depois de uma rápida "introdução" em que explicou o funcionamento do espetáculo e conversou com algumas pessoas aleatórias da platéia, anunciou os "jogadores anfitriões" – Anderson Bizzocchi, Daniel Nascimento e Elidio Sanna –, um de cada vez, a jogadora convidada – Bella Marcatti – e também o músico – Daniel Tauszig –, eu me sentia feliz como uma criança ao ganhar um brinquedo novo, se alguém registrasse o meu olhar naquele momento, tenho certeza de que veria um brilho diferente, a pureza de um olhar que transparecia toda a euforia que eu sentia. Os três primeiros jogos passaram bem rápido, lembro-me vagamente de algumas piadas e temas de cenas, só o que consigo lembrar com clareza é de sentir como se o resto do mundo estivesse em pausa, existindo apenas nós, e de me sentir feliz como nunca antes havia sentido. Do quarto jogo – Quadrado Improvável – tenho meus motivos para lembrar; depois de anunciar o jogo e explicar seu funcionamento, Edu apontou para a minha direção e falou:

— Você, de cabelo curto na primeira fileira. – demorei alguns segundos para perceber que se referia a mim – Tudo bem? Qual seu nome?

Senti meu rosto ficar vermelho ao perceber que todos os olhares daquele recinto estavam focados em mim.

— Marina. – respondi, sentindo as mãos tremerem.

— Vocês, da minha direita, digam palavras que se iniciem com M de Marina.

Dentre as várias sugestões, ele escolheu "museu" e o jogo seguiu divertido como eu esperava, em vários momentos me peguei encarando os jogadores mais do que prestando atenção nas piadas, sorri para Andy em um momento em que ele olhava para a platéia na minha direção e, como se tivesse realmente percebido, sorriu de volta. Os três jogos seguintes passaram tão rápido quanto os primeiros e, antes que eu percebesse, as luzes já haviam se apagado ao fim do Musical, o espetáculo havia finalizado. Elidio finalizou a sessão com um boa noite e um agradecimento a todos os que ali estiveram, e ao fim de tudo, uma fotografia deles à frente da platéia foi registrada.

Aquela noite havia sido memorável desde o começo, mas os bons momentos ainda não estavam tão próximos assim de acabar...

Não precisa ser o fimOnde histórias criam vida. Descubra agora