Capítulo 8

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BENJAMIN

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BENJAMIN

Descobertas

Tirei os olhos do livro de física, um pouco fatigado do dia e dos estudos também. Estava focado em entrar na faculdade pública, por isso tinha que ralar muito; toda noite, quando chegava do trabalho, eu dedicava duas ou três horas para tentar realizar aquele sonho. Pagar a graduação estava fora de cogitação e do meu bolso também, principalmente porque eu tinha que ajudar a manter o meu irmão no hospital.

Outro hábito que adotei também foi orar por isso, não para que desse certo, mas para que a vontade de Deus fosse feita. E esperava estar pronto para aceitar, seja ela qual fosse.

Pensando nisso, saí da mesa improvisada, cheia das mais diversas obras de Stephen Hawking e outros autores, para correr pra cama e ler o único livro que nunca me cansava, desde que o conheci.

Quando abri no capítulo onde havia parado, fui interrompido com batidas na minha janela.

Miqueias.

— É pra hoje, mermão! — reclamou, pela minha demora. Fui à contragosto mesmo, pois não me agradava nem um pouco ter meu momento de leitura bíblica pausado.

A janela antiga podia ser aberta com um murro mal dado, mas abri-a e ele pulou.

— Você tem algum trauma com portas?

— Paz seja contigo, varão de guerra! — deu-me uma mãozada bem no meio das minhas costas. Sua linguagem de amor.

— Ai, macho! — me contorci.

— Só pra conferir se seu grito é másculo o suficiente.

Me joguei na cama, antes que ele pensasse nessa possibilidade.

— Adivinha? — meu amigo balançou as sobrancelhas.

— Não sei adivinhar — voltei a abrir a Bíblia, com uma caneta em mãos para anotar todas as dúvidas que tivesse. Depois, as tiraria com o pastor João, que vinha me ajudando muito na caminhada cristã.

— Curti uma foto da Rita — falou, na maior naturalidade, como se aquilo fosse um grande ato de amor. Rita era uma jovem muito dedicada na igreja, talentosa e bem-educada, e todos os rapazes da congregação tinham interesse em ganhar seu coração.

Fiquei esperando ele complementar, mas nada.

— Só?

— Só? — Miqueias deu um peteleco na minha orelha, sentando-se ao meu lado. — O que mais quer que eu faça? O vaqueiro aqui tem uma reputação a zelar. — Meu amigo se orgulhava de seu título, que até virou sua profissão depois que terminamos o ensino médio. Seu pai tinha um sítio que validava toda sua realidade.

Fechei até a Bíblia.

— Então, tu acha que a irmã Rita vai perceber teus sentimentos apenas através de uma curtida?

Ele assentiu.

— "Um pequeno passo para um homem, um salto gigante para a humanidade", já dizia Armstrong.

Dei com a mão na minha própria cara.

— Benjamin, quem é tu pra me criticar? — Miqueias inclinou a cabeça na minha direção, aguardando minha defesa.

Limpei a garganta. Mas aí, percebi que ele tinha razão. Eu nunca havia sequer flertado com uma garota.

— Fica na tua, varão.

— Mas... — sentei-me na cama e olhei ele sério. — Eu sei exatamente como vou fazer quando encontrar uma garota pela qual valha à pena lutar. Vou orar a Deus pedindo direcionamento, se Ele me confirmar, vou diante dela confessar o que sinto e, se ela for recíproca, o próximo passo será pedir sua mão aos seus pais.

— A minha mão?! — Miqueias deu um grito grave, brincalhão. Joguei o travesseiro nele, pois ele podia ter acordado a minha mãe, ou pior, o meu padrasto. — Vai pedir a mão dela no primeiro contato?

— Se ela é a mulher da minha vida, porque eu não faria isso?

Meu amigo se levantou, meio atordoado.

— Depois dessa, fiquei até... — soltou o ar. — Na moral, tô indo pra casa. Vai precisar do computador?

Lembrei do pc dele, que pedi emprestado para estudar durante a semana passada. Peguei-o sobre a mesa de bagunças e entreguei, não achando ruim a ideia de ficar sozinho de novo.

— Deixa eu só pesquisar aqui um negócio rapidinho, porque a internet lá de casa tá uma droga.

— Beleza.

Não demorou muito para que Miqueias começasse a aniquilar a paz daquele quarto. Ele era inimigo do silêncio:

— Cara... — mais um tabefe, daquela vez no meu braço.

— Vou começar a devolver — avisei, vendo minha pele ficar avermelhada.

— Tu tá afim da filha do pastor?

Filha do pastor?

Safira?

Eu devo ter empalidecido. Lembrei-me imediatamente de uns dias atrás, quando a molhei de lama enquanto saía da biblioteca municipal. Fui até lá para usar o computador, mas quando a vi rondando o lugar, tive que sair despercebidamente. Coincidiu que, no momento em que peguei o carro, ela atravessou a pista e... enfim, deu no que deu. Apesar de tudo, aquela tarde não foi tão ruim assim.

— A página do blog dela está aberta aqui — Miqueias deu uma gargalhada alta. Puxei o computador das mãos dele e conferi minha desatenção. Tinha esquecido de fechar a aba na última vez que acessei. — E, não bastasse, tu ainda comenta?

Virei o rosto, enquanto ele se preparava para ler:

"Rosas são vermelhas, violetas são azuis, você é muito fresca e precisa de Jesus."

— Fecha isso. — pedi, impaciente.

— Fã ou hater? — Miqueias me olhou, pronto a rir.

— Hater, sem dúvida. Só quero que ela se toque e pare de ser tão fútil.

— Ih... tá se importando demais...

Soltei todo o ar dos meus pulmões. Ele percebeu e continuou se divertindo.

— Deixa a guria, cara... — falou, como se aquilo não fosse uma grande piada pra ele.

— Vai aprender a se declarar para a Rita, que é melhor — levantei, apontando pra janela.

Meu amigo se levantou, ainda rindo muito, e foi dando lentos passos até o seu local de saída.

— Tá bom, bebê. Dorme bem. — mandou-me um beijo, antes de dar o fora dali e levar toda a minha sanidade para o restante daquele dia.

Até que te espereiOnde histórias criam vida. Descubra agora