Capítulo 01

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LUCENA

O sol estava ardente naquela tarde, a terra seca e arenosa raramente coberta por algum juazeiro ou menos ainda por mandacarus e arbustos que formam aquele agreste, o céu limpo sem nuvens, porém com alguns urubus que contrastam com sua cor a procura de comida, uma pequena poça d’água barrenta aqui, outra mais lá adiante e só. É como pode ser descrita essa paisagem típica da região do sertão central do Ceará, no nordeste brasileiro. Um lugar belo de se ver, mas hostil para quem vive nele, que não raro, castiga o povo com prolongados períodos de seca.

Num lugar tão deserto não se pode deixar de notar um grande coche puxado por dois cavalos comandados por um cocheiro maltrapilho que avança rapidamente em meio ao sertão, a ponto de deixarem para trás uma grande nuvem de poeira em seu rastro. Seguindo intrépido o seu caminho, o coche desenvolve uma velocidade que mostra claramente a sua pressa em chegar ao seu destino. Os cavalos alcançam o horizonte de um serrote e de lá se avista mais adiante um grande e belo casarão rodeado de currais e árvores secas, além de algumas pessoas que parecem trabalhar naquele lugar. O cocheiro invoca os cavalos e o veículo avança serrote abaixo de encontro àquela casa.

No pátio do casarão, um homem de roupas finas e elegantes brinca com um casal de crianças, onde o menino aparenta uns dez anos de idade e a menina não deve passar dos oito. O casalzinho não esconde a alegria de estar brincando com aquele homem, que vez por outra se esquiva das crianças a fim de não sujar seu belo terno.

De dentro da casa surge uma formosa mulher vestida com um longo vestido sem nenhum decote e com glamorosas sobressaias, estilo de moda predominante no início do século, durante o nascimento da República no Brasil.

A mulher avista a chegada do coche em frente à porteira de acesso ao casarão, e chama o homem que ainda se entretém com os prodígios das crianças:

− Carlos, o Sr. Corrêa está chegando!

De súbito, aquelas brincadeiras são interrompidas, o homem de nome Carlos se despede das crianças:

− Continuem brincando e tenham cuidado, eu volto logo.

As crianças reclamam, mas em vão, Carlos se distancia em direção à porteira da casa, ao encontro daquele velho homem que sai de dentro do coche com uma maleta na mão. Carlos olha para a mulher e avisa:

− Olhe as crianças.

Em seguida o elegante homem se aproxima do velho senhor que acabara de chegar, vestido com traje alinhado e um chapéu velho de couro para protegê-lo do sol escaldante.

− Como foi a viagem, Sr. Corrêa?

− Muito calor, Sr. Carlos. Muito calor! – respondeu o velho Corrêa passando um   lenço na testa.

− Vamos, entre e conversaremos mais à vontade – chama o Sr. Carlos pondo a mão no ombro do velho senhor.

Os dois avançam casarão adentro enquanto as crianças agora brincam com a vistosa mulher. Lá dentro, os dois passam pela espaçosa e luxuosa sala de estar, atravessam um corredor e chegam até uma enorme e robusta porta de mogno, onde o Sr. Carlos tira um chaveiro do bolso e com uma das chaves ele destranca a tal porta e a abre, e os dois entram num suntuoso escritório. Carlos senta-se na cadeira do birô central e o velho Corrêa se senta numa das cadeiras em frente. Nesse instante, entra no escritório também uma senhora negra já de idade, e pergunta:

− O Senhor vai querer algo, Sr. Carlos?

− Sim Dinorá, traga água para nós, por favor.

− Sim Senhor – responde a mulher já se retirando do gabinete.

"TERRA SEM LEI" - Romance sertanejoOnde histórias criam vida. Descubra agora