Capítulo 4

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Na manhã seguinte, cheguei ao trabalho e Lúcia não estava em sua mesa. Eu sabia que minha mesa ficava dentro da sala de Christopher, então bati duas vezes na porta e a abri, ouvi apenas o final da conversa entre ela e Christopher. Ela estava com a mão em seu peito, tocando a pele exposta pela camisa um pouco aberta dele e ele segurava a mão dela, não sei se a tirando ou a mantendo ali. E dizia olhando para o lado, enquanto o rosto dela estava fixo no dele, e próximo demais do dele:

— Aja como a profissional que diz ser, Lúcia. Na minha gestão, não aceito intrigas, e menos ainda essa troca de favores que você supõe. Não preciso dos seus favores sexuais e com certeza, não quero ouvir sobre qualquer insinuação sua e de mais ninguém aqui, sobre esse tipo de coisa. As pessoas aqui dentro não são obrigadas a se gostarem, mas elas se respeitam. Se falar daquele jeito de novo com a senhorita Dummont, ou qualquer outra funcionária, será demitida. Eu fui claro?

Ela afastou-se dele como se tivesse recebido um tapa e eu não sabia o que fazer. Tentei sair de fininho, mas sem olhar para a porta, ele ordenou:

— Entre, Ellen, assuma sua mesa e comece o seu trabalho.

Lúcia virou-se para mim com ódio nos olhos e deixou a sala, dando um bom dia seco. E Christopher sentou-se em sua cadeira e não me dirigiu mais a palavra até a hora do almoço.


Algumas semanas depois, eu já estava completamente habituada à rotina na empresa, havia aprendido minhas funções e realmente gostava do trabalho. Era bom me sentir útil. Christopher falava comigo apenas no trabalho, e me perguntei diversas vezes se seu afastamento se devia ao fato de eu ter dito que não éramos amigos. Ele era gentil e paciente, ajudou-me algumas vezes com coisas que eu ainda não havia aprendido, sempre me cumprimentava de manhã com educação e perguntava-me ao final de cada expediente se eu estava bem. Apenas isso. Quando eu perguntava por ele, recebia respostas vagas e programadas.

Aceitei bem este comportamento no começo, porque era o que eu queria, quebrar aquele laço que estávamos criando, que era confuso e facilmente mal interpretado. Ele era um homem lindo e poderoso, atencioso e gentil, que me olhava com malícia e sabia ser bondoso e sedutor ao mesmo tempo, uma mistura extremamente perigosa. Minha mente já começava a me pregar peças ao reparar bem mais em como estava vestido, as direções opostas de seu cabelo e preocupar-me demais com o que comia, com seu humor e seu estado de espírito. O afastamento que ele proporcionou fez minha mente voltar a seu devido lugar, e me fazia vê-lo apenas como o meu chefe.

Porém nesta semana estava sendo particularmente difícil aceitar seu afastamento. Ele parecia aéreo e perdido em pensamentos. Por várias vezes, deixava as pessoas falando sozinhas, perdido em seu próprio mundo, estava se alimentando mal e dormindo pouco. E aquele toque de tristeza que outrora fora um charme em seu rosto bonito, parecia pesar sobre seus ombros, eu havia contado exatos três dias em que ele não dava sequer um de seus sorrisos, nem mesmo aqueles mais contidos, ou educados. E me peguei desejando ser amiga dele de novo, apenas para ter a intimidade de perguntar o que estava havendo.


Numa manhã, ele chegou atrasado, não deu qualquer satisfação, ele era o chefe, e parecia de péssimo humor. Gritou com Lúcia, e mais um funcionário. E foi cruel com um aspirante a cantor com quem tinha uma reunião. Nem parecia o mesmo Christopher educado e calmo de sempre. Neste dia, encolhi-me em meu canto e não dirigi a palavra a ele até o momento em que foi realmente necessário. Aproximei-me amedrontada de sua mesa e falei com a voz mais baixa possível, e sua expressão se transformou bem diante de mim. Ele mostrou um sorriso calmo, pegou os papéis da minha mão e os assinou, perguntou como eu estava e fez uma piada sobre a roupa coberta demais que eu usava.

SACRIFÍCIO - DEGUSTAÇÃOOnde histórias criam vida. Descubra agora