Capítulo 14

852 68 6
                                    

     
Suspirei fundo ao ficar de frente a casa de Naomi, que agora parecia não ser mais minha, estava tudo muito quieto, todas as janelas fechadas; eu não sabia se minha mãe tinha saído ou se ela tinha mudado depois que eu fui embora. Quando eu ainda morava nessa casa, tudo parecia um pouco mais alegre, claro que nos limites do luto eterno por Edgar, mas era diferente. A casa vivia aberta, as cortinas eram mais alegres, comparando com as de agora, sempre que eu estava em casa colocava música e as vezes até Naomi dançava comigo. Também reparei que as roseiras que eu havia desenhado na entrada, mesmo sendo bem pequenas, estavam mais desbotadas, mais desbotadas que a última vez que eu tinha vindo aqui. Era notável que a casa das Starlook's estava morrendo aos poucos com a ausência de uma delas; realmente queria que as coisas fossem diferentes, mas tudo foi pra esse caminho, bem dizendo, sozinho.
    
Subi os poucos degraus que havia para chegar na entrada, a escada de apenas cinco degraus já estava rachada pelo tempo; toquei a campainha, uma, duas vezes, ninguém atendeu. Me sentei no degrau e encostei a cabeça na porta, ou Naomi havia saído ou estava me evitando, pensei na primeira opção porque não conseguia imaginar Naomi, minha mãe possessiva, me evitando por causa de birra com Tony Stark. Esperei quinze minutos, minhas pernas já estavam adormecendo, mas ninguém me atendia, eu queria esperar mais, mas com certeza iria me atrasar muito com Peter e quem iria acabar levando bolo seria ele; resolvi passar o convite por baixo da porta. Já tinha passado metade por baixo da porta quando ouvi alguém subindo os degraus da pequena escada.
    
Parei de passar o convite e virei a cabeça lentamente para ver quem também estava a procura de Naomi, mas era a própria Naomi que me observava atenta. Ela parecia cansada, tinha algumas olheiras em seus olhos, o cabelo estava um pouco desgrenhado e a mão com algumas sacolas.
    
- Por que não avisou que viria? - ela perguntou me ultrapassando para abrir a porta. Ela colocou as sacolas ao meu lado. - Eu fui no mercado, se eu soubesse que você viria não teria ido.
    
- Quis fazer uma surpresa na verdade. - sussurrei e ela assentiu.
    
Ela abriu a porta, o cheiro de madeira velha, provavelmente do assoalho, invadiu as minhas narinas, o cheiro da minha antiga casa, nada de cheiro de casa de gente rica como era a torre dos Vingadores. Aceitei sua mão para me levantar e a ajudei com as sacolas que estavam um pouco pesadas, e é claro, peguei o convite do chão.
    
Segui até a nossa pequena cozinha e ela não tinha mudado nada, a mesa de madeira velha de quatro cadeiras, continuava no mesmo lugar, o lustre ainda pendia no meio dela, quase caindo - eu morria de medo daquele lustre cair na minha cabeça enquanto eu tomava café. As nossas fotos com Edgar ainda estavam presas na geladeira que continuava soltando um ronco terrível, o armário de madeira ainda continuava com as portas abertas porque a pressão dele havia estragado e por isso as portas abriam sozinhas, o balcão de madeira ainda tinha a ponta lascada que Naomi conseguiu fazer com uma faca ao tentar cortar uma carne muito dura.
    
A luz falhou, acedendo e apagando novamente, lembrei que isso acontece desde que o nosso tão amado eletricistas e também conhecido como meu padrasto, Edgar, se suicidou. Não foi uma mentira quando eu disse ao Stark que vivia em humildade, a nossa casa era humilde desde que eu me entendo por gente e ela poderia ser facilmente comparada ao um barroco se colocasse as várias mansões do Stark ao lado dela; mas a verdade é que eu gostava daquela casa, mesmo ela sendo humilde, eu gostava dela porque me trazia lembranças da minha infância que foi uma época que eu não podia reclamar. A luxúria que Tony me proporcionava era realmente muito boa, mas essa casa me trazia paz.
    
Naomi começou a guardar as compras e eu reparei que tudo continuava no mesmo lugar desde que eu fui com Tony, Naomi tinha parado com suas mudanças repentinas para dar um ar de organização diferente, agora tudo estava no mesmo lugar como se nunca tivessem sido mudados. Cheguei a pensar que, talvez , ela não tivesse mudado com a esperança que se eu voltasse pra casa eu ainda saberia a onde cada coisa ficava, e bom, eu saberia, mas minha volta para casa seria apenas para visitas a ela.
    
- Mãe. - chamei e ela se virou para mim, se encostando no balcão. - Tony vai me dar uma festa e eu quero muito que a senhora vá... Quero muito que vocês deixem essa birra de lado e se divirtam na festa porque sua presença é tão importante quanto a de Tony. Então, aceite, por favor, e me dê isso como presente de aniversário. - estendi o convite na direção dela e ela pegou, analisando o envelope.
     
- É claro que eu vou. - ela sussurrou suspirando. - Por mais que eu não vá mais com a cara do Stark, você também é a minha filha... E eu te amo, você sabe.
    
Meu coração se apertou, e meus pensamentos me traíram quando tudo pareceu que havia abandonado Naomi por um monte de dinheiro e isso não era verdade, mas parecia.
    
- Naomi, eu sinto muito. - falei não conseguindo controlar as lágrimas. - Eu não queria fazer isso com você, não queria mesmo, mas eu fiz sem perceber, me desculpa. - eu disse chorando e afundando o rosto entre meus braços que estavam apoiados encima da mesa.
    
A cadeira ao meu lado rangeu quando Naomi se sentou e me abraçou deitando sobre mim, o seu cabelo caindo sobre meu rosto; ele ainda cheirava a baunilha.
    
- Sabine, você não fez nada. - ela disse apertando minhas mãos. - Não tem pelo o que se desculpar.
     
- Eu fiz sim! - gritei comigo mesma, ainda em lágrimas. - Eu estava tão feliz em ter um pai de volta, ainda mais sendo o Tony, que acabei te abandonando. Me desculpa, eu só queria conhecer ele, reviver a sensação de ter um pai, mas eu me perdi e nem percebi. Me desculpa por ter te abandonado, mãe.
    
Ficamos em alguns segundos de silêncio até perceber que Naomi também chorava encima de mim, fungando nas minhas costas, só então percebi que eu tinha falado "mãe" ao invés de Naomi, o que deu mais a entender que era um momento sentimental entre a gente. Suspirei fundo ao ouvir os soluços de Naomi, ela sentia tanto minha falta, mas eu burra não percebia isso e usava meu tempo inteiro para ficar encubada naquela torre, várias vezes dormindo. Fiz muitas coisas erradas, mas as primeiras foram eu ter abandonado Naomi por uma briga idiota entre ela e o meu pai, e a outra foi eu ter ido pra aquela torre apenas para dormir, porque se for pra pensar bem, eu definitivamente não havia passado quase nada de tempo "pai e filha" com Tony; o que era um dos meus desejos a cumprir quando quis me mudar pra lá.
    
- Filha as coisas podem ser diferentes agora. - ela disse limpando as lágrimas e sorrindo pra mim. - Vamos fazer diferente.
    
Assenti porque naquele momento a única coisa que vinha na minha cabeça era cumprir tudo que eu deixei de lado. Passar um tempo pai e filha com Tony e ser melhor com Naomi, fazer mais visitas, mais ligações, tudo que eu deixei de fazer pra ela. Tony podia ter dinheiro para encher quantas piscinas quisesse com o mesmo, mas isso não mudava o fato que quem tinha dado a luz a mim foi Naomi e mais ninguém.
    
- Prometo ser uma filha melhor a partir de agora. - falei segurando suas mãos.
    
- E eu, Naomi Starlook, prometo ser uma mãe melhor a partir de agora; deixando as birras que tenho com o Stark de lado para que você seja feliz.
    
Sorri e a abracei mais forte do que eu conseguia, ela retribuiu quase quebrando meus ossos. Depois de alguns minutos calada e abraçada a ela, minha mãe se separou e se levantou estendendo a mão pra mim, aceitei e segui ela. Fomos até o pequeno cômodo, ainda meio retrô, que consideravamos como sala; Naomi se sentou no sofá de veludo falso e eu me sentei também, mas deitando a cabeça em seu colo. Comecei a contar tudo que havia acontecido comigo na torre, menos os surtos de Caitlin pra não se preocupar comigo ou até mesmo xingar o biruta, enquanto ela acariciava meus cabelos sem se importar se eles estavam virando uma maçaroca.

Between The Wars. - Dark Paradise. Onde histórias criam vida. Descubra agora