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Abro a janela do quarto. Não estou disposta a sair da casa mas a visão da praia me alivia de um jeito estranho. Coloco um vestido e saio, dispensando o café da manhã.

Essa é a minha segunda vez aqui. Mas a primeira em que estou sozinha e me sinto desprotegida como se tivesse acabado de sair do ventre de uma mãe desconhecida.

Ando até onde as ondas alcançam. A água bate em meu pé e volta. Esse é o meu primeiro contato com o mar desde que fui achada. Fico em pé ali, por um bom tempo. Não tenho coragem de me mexer. Toda vez que a água chega perto tudo volta. O desespero, a solidão, o medo.

— Sol?

Me viro. Eu havia reconhecido meu nome como Sol e aquilo me fazia sentir como alguém real. Charles se aproxima, lançando um olhar curioso para os meus pés.

— Eu não consigo entrar mais. Preciso de um tempo.

Ele concorda e continua parado ao meu lado. Eu gosto muito de ter companhia e adoraria que todos os momentos fossem assim, em silêncio. Sem perguntas, sem nada sendo discutido. E me sinto bem em só poder aproveitar um momento e não me obrigar a nada. Talvez essa realmente não seja a hora de entrar na água.

— O que é aquilo?— digo e aponto para uma luz vindo de longe, perto das pedras.

— O que? Não to vendo nada.

Então talvez eu esteja doida. Ou esteja tão confusa nos meus pensamentos que comecei a alucinar. Escuto a voz de Perol nos chamando e me viro, pronta pra entrar. Mas escuto algo, como um sussurro melodioso no meu ouvido. Me volto para o mar e avisto o mesmo brilho novamente.

Isso definitivamente não é algo da minha cabeça.

—Charlie, pode avisar pra Perol que já vou? Quero ficar um pouco sozinha.

Eu, sinceramente, não quero ficar sozinha. E só de pensar fico nervosa. A solidão é algo que me assusta quase mais que o mar. Talvez eu fosse alguém sozinha antes de tudo acontecer?

Espero Charles entrar na casa e ando, guiada pela luz estonteante, até chegar em um caminho de pedregulhos. Paro. O brilho se afasta até onde só existe água mas não posso seguir. Ou posso?

Respiro.

Ele continua até chegar em uma pequena gruta, não muito longe de onde estou, na verdade, e creio que nem mesmo seja tão profundo.

Não consigo sequer imaginar meu corpo debaixo do oceano novamente. Mas algo me atrai. E o brilho aumenta. Logo, começo a escutar mais sussurros e ruídos agradáveis vindos da gruta.

É como se algo estivesse me chamando.

Meu corpo toma a ação contra minha vontade consciente e mergulho.

Não sei bem o que fazer além de tentar não me desesperar e nadar até chegar nesse brilho, mesmo não sabendo exatamente como faço isso.

Sinto que estou me aproximando e volto para a superfície, me encontrando na gruta. Me apoio em algumas pedras e, com muito esforço, consigo me fixar fora da água. Uma única brecha de luz iluminavas gruta e fazia o lago formado ter uma coloração azul fortíssima, o que de certa forma me aliviava.

—Meu nome é Nonahir.

Escuto uma voz calma sussurrar no meu ouvido e logo uma criatura sai da água, sentando em algumas pedras perto de mim.

Ela se vira e me deparo com um ser magnífico e ameaçador.

A observo.

Primeiro, vejo seu rosto. Sua pele é pálida, quase reluzente. Os olhos grandes fixos em meu rosto. Se não fosse pela pupila, poderia achar que são completamente brancos.

Depois, olho para seu corpo. Mesmo que me lembre um dorso humano, tem algo diferente e um pouco assustador. O cabelo comprido e branco caído sobre seus ombros só reforça mais essa imagem bizarra. Suas mãos são esqueléticas, quase animalescas. Ela não para de mexê-las, como quem deseja me hipnotizar. E talvez esteja conseguindo.

Por último, observo a cauda de peixe. Talvez o detalhe mais surreal, que de certo modo me deixa encantada. Pra falar a verdade se assemelha muito mais com um golfinho. Não tem escamas, como seria a de um peixe e carrega uma cor cinza, intercalando entre tons claros e escuros. Ela também a mexe, de uma forma mais lenta.

Fico paralisada diante da imagem dessa criatura, me lembrando de todas as lendas daquela ilha que Charles me contou.

Então isso é uma sereia?

***
nota: gente eu to muito feliz que finalmente postei essa história e se vcs comentarem (se estão gostando) eu vou ficar ultra feliz.
e outra, a gruta que a Sol encontrou a Nonahir foi inspirada na Gruta Azul (fazenda Pratinha-BA). Vale a pena dar uma visita lá pra observar essa magia pessoalmente (além da gruta o lugar todo é mágico). beijinhos

ALONEOnde histórias criam vida. Descubra agora