Havia uma turma crianças de uma escola. Era uma turma grande então foi fácil de me misturar. Elas estavam ganhando dos funcionários pulseiras de livre acesso aos brinquedos. Eu estava tão feliz que poderia brincar o quanto quisesse.
Por um momento pensei em me juntar as outras crianças e brincar, mas já sabia que algo de ruim aconteceria. Eu poderia ter um de meus "estalos" momentâneos ou mais longos onde não conseguia controlar o que via e sentia.
Sabe leitores, eu os vejo a todo momento, mas já me acostumei com a maioria. Hoje, pouca coisa me assusta.
Voltando ao parque... eu não sabia onde ir primeiro. Eram tantas opções, ainda havia a alegre música tocando, risadas ressoando por todo o lugar, crianças brincando, jovens namorando (os rapazes tentam impressionar ganhando nos jogos, como pavões exibindo sua plumagem), pais ensinando seus filhos a arremessar a argola na garrafa.
Por um momento meu coração apertou, eu estava ali cheia de brinquedos de graça, mas estava sozinha... ou quase.
Me lembrei de Mary, lembrei que ela se divertiria comigo. Retornei a sorrir
Por fim resolvi ir brincar no carrinho bate-bate. Era meio violento, mas muito divertido, Mary disse. Eu corri para a fila e fiquei esperando minha vez, havia muitas pessoas juntas na fila e isso me deixava desconfortável.
Estávamos tão apertados que a pulseira dourada que eu usava que foi presente de natal do meu avô ficou presa em uma fita verde no pulso de alguém. Eu tive que fazer força para me soltar porque estava chegando minha vez. Bufei havia fiapos preso na minha pulseira agora, mas logo esqueci e corri para dentro do primeiro carrinho que consegui.
Quando entrei no carrinho animadamente, notei que não estava sozinha. Primeiramente não vi quem era e fiquei nervosa. Não gostava de ficar perto de pessoas estranhas. Eu começava a suar e tremer, estava saindo do carrinho sem olhar quem estava ali ao meu lado e dizia:
--- Me desculpe, eu vou procurar outro carrinho
Ouvi Mary dizer que eu não precisava me preocupar que era uma velha amiga que não iria me machucar. Eu sorri, fazia tanto tempo que não via Olivia.
Na verdade eu nem lembrava mais quanto tempo havia se passado desde o incidente com o médico e se ela queria me ver. Isso me preocupava, mas eu ainda assim queria vê-la , abraçá-la. Queria que ela me convidasse pra fugir e viver como acrobatas de circo na China ou qualquer lugar da Ásia .
Eu comecei a chorar, só Olivia poderia me salvar do inferno que eu estava vivendo de todos me chamando de assassina. Ela acreditaria na minha inocência. Me virei abraçando-a com os olhos embaçados de lágrimas e a apertei contra meu peito
--- Senti sua falta ....
-- Eu sempre estive com você Aggie
Eu me afastei levemente do abraço. Ela limpou minhas lágrimas com um lenço branco de algodão e então eu pude ver melhor seu rosto. Seu belo rosto agora com uma cicatriz negra na bochecha, exatamente igual a uma rachadura em um rosto de boneca de porcelana. Ela continuava com a expressão doce mas eu estava em choque
--- Mary ?
Eu confesso que estava um pouco decepcionada, mas Mary era minha amiga também e eu estava feliz de não estar sozinha, mas comecei a aprender aos poucos que o destino sabia o que fazia, que talvez eu precisasse de Mary naquele momento ainda que não quisesse admitir. Talvez o que o destino quisesse me dizer é que Mary e eu éramos complementares.
Eu era aquela racional, que sempre agia como acreditava que seria melhor e Mary era impulsiva e corajosa me fazendo viver como gostaria e enfrentando o mundo e juntas éramos imbatíveis
Brincamos o resto da noite. A noite passou rápido, mas eu sentia como se tivesse parado no tempo sob a luz das estrelas e o céu negro que contrastava com as luzes neon do parque. Fazia muito tempo que não me divertia assim! Até ganhei um algodão doce cor de rosa de Mary.
No fim da noite ela resolveu que seria legal ir para a casa de espelhos. Eu estava com um mal pressentimento. Parecia terrivelmente assustador! Eu me recusei a ir, mas como uma boa teimosa. Ela insistiu:
"Medrosa, vai amarelar ?" Mary me provocou.
Eu respirei fundo e decidi que não faria papel de boba em frente a única pessoa que me sobrara no mundo. Meu orgulho não permitia.
Entramos e seguimos pelos labirintos de espelhos. Os primeiros espelhos foram bem divertidos devo confessar .
Ao entrar, era uma espécie de casa escura , com fraca iluminação de luzes de led sobre apenas alguns espelhos altos . Alguns bem comuns como os de qualquer parque , como aqueles que espichava o corpo o deixando bem comprido . excessivamente magro e uma enorme cabeçona como uma caricatura de Olivia Palito ,.
Fui caminhando e parei diante do próximo que era o oposto do primeiro. Eu fiquei pequenininha e gordinha como uma bolinha e foi até engraçado porque me imaginei saindo rolando por aí como se fosse meu super-poder bobo e se eu tivesse apenas um olho pareceria o Mike Wasalsky .
No terceiro espelho as coisas começaram a ficar mais surpreendentes, pois ao parar diante dele, metade de mim era visível e metade de mim era invisível. Não importava como eu me mexia metade de mim não ficava refletida no espelho. Eu até rodopiei diante dele e apesar de ter ficado uma imagem interessante e curiosa, jamais aquilo mudou. Era sempre metade Agatha, metade nada .
No quarto comecei a ficar assustada, pois ele era surreal. Eu estava rosada e derretendo como sorvete de morango e meu cabelo era calda de chocolate. Eu estava fazendo uma poça doce e grudenta de mim mesma no chão. Era uma visão digna de Salvador Dali.
Era uma sensação agonizante me ver assim , me auto-desfazendo tão facilmente , eu então corri e corri pelos corredores da grande casa de espelho até que parei ofegante diante do quinto espelho
Eu estava com medo de olhar para ele e eu pude ouvir a risada de Mary ao longe , uma risada infantil e irritante. Eu ergui o olhar pra procurar por ela pois desde que entramos eu a perdi de vista e quando olhei para frente. Eu gritei! Diante de mim estava uma garota... eu aparentemente. Meus órgãos estavam expostos, meu corpo estava do avesso, eu podia ver meus músculos se mexendo , meu coração batendo forte ,o sangue correndo pelas minhas veias eu podia sentir como era mole e gosmento meus intestinos ao passar a mão pela minha barriga , as minhas mãos tremiam de terror , até meu cérebro estava completamente exposto e coberto de sangue. Eu senti enjoo e vomitei ali mesmo , aquilo era demais para mim .
Infelizmente o meu pesadelo não terminava ali . eu ainda precisava dar um jeito de sair dali e eu corri , corri e encontrei mary que corria na minha direção tão feliz em me ver quanto eu em vê-la então eu parei na frente do que parecia ser um espelho quebrado e foi então que notei duas coisas , a primeira , Mary estava me imitando , tudo oque eu fazia ela repetia e segundo , ela estava diferente .
Mary estava diante de mim, seus olhos estavam completamente rubros tanto quanto o sangue , seus dentes estavam afiados em um doce sorriso , suas unhas pareciam enormes garras em longos braços. Escorriam lágrimas negras dos olhos de Mary ...eu dei um passo para trás assustada, ela fez o mesmo, o que foi bem estranho , além do normal. A expressão de Mary era de medo como a minha, engoli em seco e me aproximei ela se aproximou ao mesmo tempo, em um ato de coragem e curiosidade ergui meu braço para tocar o que parecia ser um vidro entre eu e Mary. Ela então agarrou meu pulso e me puxou para dentro do espelho.
Quando acordei ainda estava no hospital psiquiátrico. O maldito manicômio! Ainda estava presa como um pássaro em uma gaiola, ainda era uma louca perigosa sem família, sem ninguém e agora tinha mais uma dúvida na minha cabeça:
Quem realmente era Mary ? Uma amiga ? Uma parasita ? Ou eu era Mary ?
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Reflexo no Espelho
HorrorHoje você já parou para pensar nos males do mundo ?Desde o início dos tempos temos presenciado como seres humanos a mais diversas tragédias e buscando as mais variadas soluções para eles , doenças , catástrofes ambientais , demônios , pecados , mort...