-São horas de chegar? - pergunta-me ele.
- Acordei cedo, decidi fazer uma caminhada. – Não olho para ele, não quero que perceba que claramente estou a mentir.
-Hum, a sério? – olha severamente para mim com os olhos semicerrado - Engraçado que eu fui ao teu quarto hoje às cinco da manhã e a cama nem estava desfeita sequer.
-Foste ao meu quarto às cinco da manhã? Fazer o quê?
-Não desvies o assunto.
-Mas se é o meu quarto eu tenho o direito de saber porque é que as pessoas entram nele e para fazer o quê!
-E se seguirmos a tua lógica esta é a minha casa e eu tenho o direito de saber porque é que as pessoas não dormem nela, e, sabendo que sou eu o responsável por ti, descobrir o que andaste a fazer a noite inteira fora de casa!
-Ramírez, fica descansado primo, não andei a fazer nada de mal – disse num tom divertido para tentar amenizar o clima.
-Primo? – Ri-se, surpreso, com aquele bigode farfalhudo e pomposo a saltitar e a mão na barriga rechonchuda - essa é nova. Acabaste de tentar com que eu não ficasse a ralhar mais contigo?
-Depende, consegui? – faço um meio sorriso e a minha barriga ronca, com fome. – Diz-me que os pãezinhos quentes já chegaram por favooooor
-Já, mas antes de os ires abocanhar tens de perceber que eu sou responsável por ti, se alguma coisa te acontece nem sei o que faça! E sei que gostas da tua liberdade, mas tens de distinguir as coisas e não é para abusar.
Depois dessa nossa conversa, encho o estômago de pãezinhos quentes e vou para o quarto dormir, afinal, não dormi toda a noite e amanhã é o primeiro dia de escola depois das férias de verão, logo preciso de me distrair o máximo que puder antes que decida não ir amanhã.--07:00 da manhã do dia seguinte--
-Bom dia querida, dormiste bem? - disse a Lea depois de abrir as persianas do quarto gentilmente. - Ontem não te vi o dia inteiro, falei com o Rá e ele disse que passaste o dia a trabalhar, logo ficaste cansada e decidiste vir dormir cedo, está tudo bem minha querida? - Após este discurso senta-se na minha cama e começa-me a fazer festinhas no cabelo, então decido parar de ronha e finalmente abrir os olhos para lhe responder.
-Tudo bem, sim, não te preocupes, só fiquei cansada de trabalhar - esboço um sorriso de compaixão, porque, afinal, é o mínimo que posso fazer, pois esta senhora não tem sido nada mas carinhosa comigo desde o minuto que meti os pés nesta casa, só de pensar que no início, quando não confiava nela, lhe mordia para impor algum tipo de respeito, dá-me vontade de lhe pedir mil desculpas todos os dias por causa disso.
-Então vá, levanta-te que o Rá já serviu o pequeno almoço e o Zac e a Lua já se estão a despachar!
Dito isto, levanto-me da cama, visto as minhas calças pretas meio rasgadas de tão gastas e uma sweat cinzenta com o logo da Ramwheels, calço os meus ténis rapidamente e desço para tomar o pequeno-almoço. Encontro o Zac e a Lua já sentados e dou um encontrão a cada um como forma de cumprimento, pergunto se vamos todos juntos e depois lembro-me:
-Oh meu Deus!! – quase deixo cair um dos pães que agarrei para comer no caminho.
-O que foi? – perguntam Lua e Zac ao mesmo tempo
-Esqueci-me completamente de ver em que turma é que estava, vocês viram?
-Nós ficámos os três na mesma turma como era de esperar, a Tessa, o Blake e o Dan também, de resto não me dei ao trabalho de ver sequer – responde-me Lua.
Vamos os três para a escola, como é o primeiro dia não levo nada na mochila a não ser o meu caderno para escrever e uma caneta, visto que não posso estar com o computador nas aulas.
Quando chegamos à escola subo logo as escadas do bloco A, onde vou ter a primeira aula. Ciências. Sempre gostei de Ciências, é a matéria onde me dou melhor, não que me dê ao trabalho de ser exemplar, muito menos na escola, mas uma rapariga safa-se.
Averiguo a professora, não é a mesma do ano passado, graças a Deus, e não aparenta ter mais de quarenta anos ou menos de trinsta. Averiguo também as caras desconhecidas que não estavam na minha turma o ano passado e vejo uma rapariga de estatura média, cabelo liso e médio com algumas madeixas; e logo atrás da mesma está uma rapariga franzina que parece um daqueles cães pequeninos que estão sempre a tremer e têm um ladrar bastante agudo, dá-me a impressão de que não quer ser notada, ou que se habituou a estar na sombra da Miss Madeixas, de qualquer das formas, gosto muito mais do cabelo da Miss Sombra.
E sim, dou nomes às pessoas conforme as características que mais se destacam nelas à primeira vista, pelo menos no meu ponto de vista.
No canto da sala está a Lua, com os seus fones a berrarem uma música qualquer, e, como sempre, agarrada ao seu bloco de desenho pois segundo ela, tem de melhorar o seu portefólio se quiser ser uma tatuadora a sério um dia. Um pouco mais à frente dela está o Zac e os gémeos, ou como eu gosto de chamar, Sinistro 1 e Sinistro 2, porque Jesus Cristo, as franjas deles vão até ao queixo, devem gastar mais dinheiro em maquilhagem preta numa semana do que eu gasto em comida, e nem me atrevo a falar daquelas correntes, enfim. No canto oposto da sala estou eu, gosto de lugares à ponta e atrás para observar as pessoas. Não sou stalker ou alguma coisa do género, é mais um hobbie para passar o tempo e desde pequena que sempre me deu jeito saber o que as pessoas são ou pretendem fazer antes delas mesmas sequer saberem.
Quando decido observar mais a Miss Madeixas e a Miss Sombra reparo que elas não estão no meu campo de visão como estavam há alguns minutos atrás, isto claro antes de girar a cadeira uns quatro centímetros para a esquerda e perceber que estão ambas a olhar para mim fixamente. Rezo internamente para que não venham falar comigo, mas vêm, logo, como a Miss Madeixas se aproxima com um grande sorriso, e a mexer na ponta do cabelo com a ponta dos dedos, imito-a, só para lhe dar a chance de perceber a figura ridícula que está a fazer antes de eu ser obrigada a dizer-lho diretamente. Que doce de pessoa, eu.
-Olá! – diz com voz esganiçada – Eu sou a June, é o meu primeiro ano cá, fui transferida e adorava fazer amigos novos! – posto isto estende-me a mão e faz o sorriso mais falso que alguma vez vi, seguido de demasiados pestanejos para o meu gosto.
-Sou a Harper. – em vez de lhe corresponder com um passou-bem, deslizo a minha mão na dela e de seguida fecho-a para batermos com os punhos, sei que ficará perplexa e sentir-se-á ligeiramente fora de sítio, mas e depois? Ninguém me designou como o comité de boas-vindas, quero lá saber de quem ela é.
Como eu esperava, engole em seco, manda o cabelo para trás com as costas da mão e puxa a camisola de lã para baixo, ajeitando-a.
-E quem é a tua minion? – Espicaço.
-A minha quem? – Ela fica confusa e eu gargalho subtilmente e fixo os olhos na Miss Sombra.
-Como te chamas?
-Chloe – responde-me June.
-Ah, e a Chloe não sabe falar?
-Não faz mal, já estou habituada – diz Chloe quase aos sussurros e com a voz a tremer, como se tivesse receio de algo.
-Bem, nós vamos andando para a nossa carteira que a professora deve estar a chegar, vejo-te depois – diz por fim June na sua voz esganiçada.
-Foi bom falar contigo, Chloe. – June fica sem graça e eu dou um sorriso trocista e vejo o brilho nos olhos de Chloe e percebo que tem vontade de rir também, mas controla-se pois deve ter medo da reação da sua mestre.
Logo depois da professora entrar e se apresentar, alguém bate à porta e entra após o sinal afirmativo da professora.
-Desculpem o atraso, mas estou perdida, alguém me sabe dizer onde é a sala A1.02?
Não creio. É ela. Troco olhares com a Lua e reparo que estamos ambas boquiabertas. Não acredito que ela voltou.
VOCÊ ESTÁ LENDO
All Ways
Teen FictionVárias raparigas, cada uma com uma história conhecida por todos, incompreendida pela maioria. Segredos, omissões e muita adrenalina compõem esta história deixando-a inesquecível. Vem conhecer a história destas adolescentes que se escondem atrás de u...